Para o lugar das raposas políticas, pode surgir um “Batman” nas próximas eleições

21 abril 2017 às 11h24

COMPARTILHAR
Enquanto políticos do PT, do PSDB e do PMDB buscam recolher seus cacos depois da delação da Odebrecht, os que se salvaram ganham força. Quanto menos cara de político, melhor

Foram décadas de espoliação dos cofres públicos. Um tipo de empreendedorismo cujo sucesso se explica pelo conluio eficaz, pela alta articulação nos grandes círculos de poder e pelo organograma tão adequado aos propósitos que incluía até um Departamento de Propina que tinha um nome tão conveniente quanto pomposo: “Setor de Operações Estruturadas”.
Quando dezenas de executivos – incluindo o presidente – da maior empreiteira do País revelam o “modus operandi” de todo o esquema de malversação do dinheiro público em benefício da empresa, de partidos e de centenas de políticos, existe uma boa chance de implosão de muito mais do que se prevê com o que agora se alcança.
A chamada “delação do fim do mundo” pode ser também o começo de um novo tempo. Mas o caminho não será limpo nem reto. Como vem sendo alardeado nos últimos meses, a resistência do modelo convencional de fazer política será forte e articulada. O listão da Odebrecht não tem cor partidária, ainda que alguns ideólogos e uma boa parte da mídia insistam em botar foco. Prova disso são os boatos, cada vez mais intensos, de reuniões entre líderes do PT, do PMDB e do PSDB. Um acordão de quem vê a implosão do sistema não como “chance”, mas como “risco”.
Assim, no contexto das eleições presidenciais do próximo ano e diante dos efeitos da Operação Lava Jato, candidaturas de grande alcance nas intenções de voto se veem como um castelo de cartas sobre a mesa de um quarto no qual alguém vai aumentando gradativamente a velocidade das hastes do ventilador.
Lula foi, é e sempre será a bola da vez de toda a investigação. Ainda que haja dezenas, talvez centenas de políticos envolvidos, seu nome aparecerá sempre com maior frequência no noticiário e na mídia em geral, até mesmo pelo potencial eleitoral que o ex-presidente tem e o qual muitos temem – afinal, foi o próprio petista que disse que “a jararaca está viva”.
Em uma disputa convencional, seu maior opositor hoje seria o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Mas o nome do tucano também está envolvido pelas delações. Aliás, todos os nomes dos candidatos do PSDB em eleições presidenciais, de uma forma ou de outra, foram verbalizados pelos executivos-delatores. Ninguém com o destaque e a constância do senador Aécio Neves (MG), diga-se.
A outra metade deste texto está destinada a quem não foi reservada a menção negativa da boca dos homens da Odebrecht. Foi essa, aliás, a maior comemoração dos seguidores de Jair Bolsonaro. Ao passar ileso, o deputado federal do PSC, considerado “mito” nas redes sociais por causa de sua “autenticidade” e radicalismo ideológico – o que na verdade se traduz por grosseria e ataques às minorias em geral –, viu reforçado o argumento de que “podem falar o que quiser, mas ele não é corrupto”. É o caso de se pensar: basta não ser corrupto para ganhar voto para presidente?

Poderíamos dizer que o espelho perfeito de Bolsonaro seria Ciro Gomes (PDT). Assim como o parlamentar, o ex-governador do Ceará não está na leva de delatados e corre longe atrás de uma polêmica. Foi considerado “o novo Collor” em sua única tentativa de chegar ao Palácio do Planalto, em 2002, mas, depois de ascender nas pesquisas, acabou punido pela repercussão das palavras que saíram de sua própria boca. Ciro talvez seja a única opção mais à esquerda politicamente viável e tradicional, caso Lula seja condenado em segunda instância e vá parar na prisão em vez de fazer campanha.
Uma alternativa política tradicional, embora não se reconheça como convencional é a sempre citada – não nos autos do Ministério Público Federal, mas nas pesquisas – Marina Silva (Rede), que parece ter realmente se convencido de que época de crise política e econômica é hora de ficar quieta em seu canto. A ex-senadora joga com o silêncio, mas o que aparenta em geral, à opinião pública, é que está sem discurso e sem posicionamento.
No ninho tucano, porém, surge uma revelação eleitoral: João Doria é o político mais exaltado do momento, pela imagem de gestor dinâmico que tem vendido para os paulistanos como prefeito. Ter o empresário e ex-apresentador de TV como candidato parece ser menos um desejo do que uma necessidade do PSDB para ter chance de vitória, ainda que ele tenha de abandonar um cargo o qual terá assumido apenas 15 meses antes. Ainda há muita água (suja, inclusive) para passar pelo Tietê, mas o partido não vai deixar de pensar pragmaticamente nessa possibilidade.
Com a mesma estratégia discreta de Marina, um nome corre totalmente ao largo do falatório e das especulações mais insistentes: Joaquim Barbosa, o relator do mensalão. Desde que deixou o Supremo Tribunal Federal (STF), no fim de julho de 2014, ele tem aparecido muito pouco, mas de forma incisiva. Sua presença nas redes sociais é esporádica. No Twitter, sua postagem mais recente é de 19 de janeiro, dia da morte de Teori Zavascki, quando exaltou as qualidades de seu ex-colega de corte e prestou condolências à família. Antes disso, em 1º de setembro do ano passado, havia criticado o impeachment “tabajara” de Dilma Rousseff (PT) — acrescentando que “a Presidência da República está nas mãos de um homem conservador, ultrapassado, desconectado do País, como aliás sua antecessora”. Três meses depois, usou o microblog contra o jornalista Reinaldo Azevedo, um “pau mandato” e “idiota que não tem consciência da própria irrelevância”, nas palavras do ex-juiz.
Em novembro do ano passado, Joaquim disse ao “Estadão” que é um “homem livre”, quando questionado sobre uma eventual candidatura à Presidência. Se tiver o “timing” correto e se encaixar no sentimento da população, pode, sim, cair no gosto dela. Grande parte das pessoas não quer saber da guerra entre esquerda e direita: está mesmo é com sede de justiça – ou de justiceiro. Portando-se com habilidade e canalizando a energia “antipolíticos” das ruas – o que pode ser feito por meio de um bom trabalho de marketing eleitoral –, ele pode chegar lá. Se antes consideravam Sérgio Moro como “o novo Joaquim Barbosa”, o ex-presidente do STF pode se mostrar como “o Moro possível”. Querendo seus algozes ou não, o homem mais famoso de Curitiba é a referência no momento em que as velhas raposas estão acuadas e os jovens políticos podem pecar pela falta de tato ou de experiência. Joaquim Barbosa pode vestir novamente a capa de Batman e se dar bem. l