O glorioso São Sebastião… e o bêbado
29 novembro 2025 às 21h00

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Fernando Cupertino
No dia 20 de janeiro, no calendário litúrgico católico, celebra-se a festa de São Sebastião. Embora haja controvérsias sobre a data exata de sua morte, afirma-se que era natural de Narbonne e que morreu em Milão, em 20 de janeiro de 288 d. C., durante as perseguições do imperador Diocleciano. Soldado romano, cristão na clandestinidade, gozava da confiança do imperador que, ao descobrir sua fé em Jesus Cristo, condenou-o à morte como traidor. Foi então amarrado a um poste e alvejado por flechas e teve seu corpo atirado a um rio. Ainda vivo, foi salvo por Santa Irene. Apresentou-se novamente a Diocleciano, que mandou espancá-lo até a morte.
O culto a São Sebastião surgiu no século IV e propagou-se pelas igrejas Católica e Ortodoxa, especialmente nos séculos XIV e XV. É representado como um homem amarrado a uma estaca e perfurado por setas.
No Brasil é santo de devoção muito popular. A cidade do Rio de Janeiro, e muitas outras, o têm como patrono. Contam que numa delas, pelo interior do Brasil, fazia-se uma grande festa, precedida por animada novena com missas, quermesses, levantamento de mastro e a procissão luminosa para o encerramento das festividades.
Um bêbedo — e sempre há pelo menos um, em meio a essas coisas, estava encostado à porta do botequim, na praça onde se encontrava situada a igreja. Dali admirava o cenário: a piedade dos fiéis portando velas acesas, que iluminavam o ambiente, num tempo em que ainda não havia eletricidade; a beleza das mocinhas que, devidamente acompanhadas pelos pais, exibiam os vestidos novos feitos especialmente para a festa do padroeiro; o andor de São Sebastião, pobremente ornamentado com flores de pano fabricadas pelas beatas do lugar…
A procissão deteve-se à entrada da igreja, que, pequenina, não comportava toda aquela gente. O padre mandou que se virasse o santo para o povo e trepou num estrado de madeira para fazer o sermão de encerramento da festa em honra ao santo patrono do lugar. O bêbedo, movido pela curiosidade, havia se aproximado de todo aquele movimento e postara-se bem próximo ao sacerdote. Este não gostara nada daquilo e já lhe dirigira um olhar de reprovação ao perceber o estado de embriaguez que sua postura e atitudes denunciavam claramente.
O povo acomodou-se em silêncio, fazendo um semicírculo ao redor do andor, com todos os sentidos postos no padre que iria iniciar sua prédica:
— Meus irmãos, aqui estamos nesta noite para louvar e agradecer a Deus, por intercessão de nosso padroeiro, o glorioso São Sebastião. Contemplemos sua imagem. São Sebastião era um jovem soldado romano, que morreu defendendo a fé cristã, com o corpo crivado de flechas.
Para emprestar um tom mais solene ao que dizia, e acrescentar maior dramaticidade ao que dissera, o padre fez uma pausa prolongada após essas palavras de introdução. Foi aí que o bêbedo, aproveitando-se do silêncio respeitoso e recolhido da multidão, entrou em cena:
— Bem feito! Quem mandou brincar com os índios???
Fernando Cupertino, escritor, médico e compositor, é colaborador do Jornal Opção.
