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Ney Matogrosso, um dos cantores mais importantes do país — com uma voz que sincroniza à perfeição tons tanto femininos quanto masculinos, com uma identidade única —, ganhou, este ano, um belo filme, “Homem com H”, que pode ser visto na Netflix e na Prime Vídeo.

Há, porém, uma história de Ney Matogrosso pouco conhecida. Quando morava em Brasília, onde trabalhava no Hospital de Base, dividiu apartamento com o amigo Tonho Cabral, funcionário da Câmara dos Deputados e seu colega de coral.

Tonho Cabral apresentou-lhe o paulista Eugênio, um homem alto e culto. Ney Matogrosso era 22 anos mais novo, mas encantou-se com aquele indivíduo charmoso e vivido (havia morado em Paris). A história é contada no livro “Ney Matogrosso — A Biografia” (Companhia das Letras, 512 páginas), de Julio Maria, um dos mais importantes críticos de música do país.

Apaixonado, Ney Matogrosso sequer transava com outros homens, à espera de seu príncipe encantado, Eugênio.

Ney Matogrosso capa de livro 1

Ao término da primeira relação sexual, Eugênio, demonstrando ciúme e paranoia, perguntou, de maneira enfática: “Você já transou com muitos homens?” Ney Matogrosso irritou-se com a falta de confiança.

Com o passar do tempo, tendo o relacionamento se tornado abusivo, Ney Matogrosso, mesmo apaixonado, foi ficando assustado. Se vestia uma roupa apertada, o companheiro brigava. Se o artista olhasse para outra pessoa, mesmo sem interesse, Eugênio estrilava.

Depois que Eugênio tentou se matar duas vezes — chegou a tentar pular do quinto andar do apartamento, sendo contido com muito custo —, Ney Matogrosso decidiu pela separação. Eugênio foi compelido a se mudar do imóvel.

Mesmo assim, Eugênio voltou ao apartamento, deixando um passaporte. Ney Matogrosso avaliou que o ex-companheiro estava se despedindo, de vez.

Logo depois, Eugênio tentou se matar. Ney Matogrosso e Tonho o encontraram no banheiro, onde havia sangue, medicamentos e vidros quebrados. Socorrido no Hospital de Base, sobreviveu.

Eugênio queria levar Ney Matogrosso para morar com ele em São Paulo. O artista não quis, temeroso.

O ciúme de Eugênio chegou a tal ponto que, ao ver um jovem (vizinho) usando uma camiseta de Ney Matogrosso, ficou possesso.

Mais tarde, enquanto tentava enforcar Ney Matogrosso, dizia: “Você está transando bem porque está transando com outros”.

Corajoso, Ney Matogrosso reagiu: “Você quer me matar faz tempo, não é? Então, mate agora”.

Ante a reação de um homem forte, dotado de grande energia — ainda que seja magro —, Eugênio acabou por soltar o pescoço de Ney Matogrosso.

Assim como a poeta americana Sylvia Plath, Eugênio se matou, tempos depois, inalando gás de cozinha (o relato de Julio Maria: “Abriu o gás da cozinha e colocou a cabeça no forno para morrer lentamente”). Ney Matogrosso seguiu sua trajetória tão vitoriosa quanto longeva. É, sem dúvida, um dos mais cantores brasileiros. (E.F.B.)