Fernando Cupertino

É com imensa tristeza que comunico o falecimento da tigela. Sim, esse utensílio doméstico de grande utilidade, que acompanha os humanos há muitos milênios, simplesmente deixou de existir.

Nos meios de comunicação, especialmente nas matérias sobre culinária, sejam escritas ou em vídeos, o vocábulo “tigela” foi substituído, pelo menos no Brasil, pelo anglicismo “bowl”. Alguns, mais atentos, dirão que também poderia ser um galicismo (bol), porém estou seguro de que não. O emprego da língua inglesa como uma espécie de fetiche, de demonstração de modernidade ou de erudição, é o que se impõe.

Todavia, as deformações não param por aí. E para não ser maçante, vou me ater a uma só. Já repararam que o verbo “continuar” também caiu em desuso? Os meios de comunicação, sejam jornais, rádios ou a televisão, passaram a utilizar o verbo “seguir”. Senão, vejamos: “As vítimas seguem hospitalizadas”; “o governo segue calado sobre o assunto”; “a situação segue inalterada” — e por aí vai.

Dirão outros, possivelmente, que a língua é viva, é dinâmica, e incorpora as situações vividas. É bem verdade e os termos “deletar” e “resetar”, por exemplo, são decorrentes da incorporação de novas tecnologias no nosso quotidiano. E, por isso mesmo, outras expressões desaparecem. É o caso do amanuense, aquele funcionário de ótima caligrafia, encarregado de escrever os documentos oficiais, antes do advento da máquina de escrever, que, a seu turno, produziu o vocábulo “datilógrafo” e outros, correlatos.

Entretanto, deixar de lado expressões de significado preciso para nós, falantes da língua portuguesa, e substituí-las por estrangeirismos pernósticos, é incompreensível para mim.

Como se essas bizarrices não bastassem, o descuido dos nossos principais jornais para com a correção das matérias que publicam, do ponto de vista do bom uso da língua, é algo de arrepiar! Parece que a figura do revisor simplesmente desapareceu. Nas rádios, não é muito diferente. Frequentemente, ouço pérolas que fariam corar de vergonha os alunos do curso primário dos meus tempos de estudante!

Fernando Cupertino, escritor, médico e compositor, é colaborador do Jornal Opção.