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Mariza Santana

Especial para o Jornal Opção

A influência da cidade grega de Atenas na formação da civilização ocidental é inegável. Afinal, foi naquela cidade da Ática que nasceu a filosofia e a democracia, só para citar esses dois pilares que sustentam o mundo em que vivemos. Por isso, é tão gostoso mergulhar na atmosfera ateniense, no período da Guerra do Peloponeso (431 a 404 antes de Cristo), que colocou em campos de batalha opostos as duas cidades-Estado predominantes no período — Atenas e Esparta.

É exatamente esse cenário que o leitor encontra no livro “Callíope a escrava de Atenas”, o primeiro romance da escritora paulista Cindy Stockler. A autora realizou uma detalhada pesquisa histórica para garantir maior autenticidade ao relato do drama da jovem Callíope, filha de um cidadão ateniense, pequeno dono de terras nos arredores da cidade que, por um golpe do destino, acaba perdendo a cidadania e se tornando escrava. No enredo, a autora vai inserindo personagens históricos importantes, como o estadista Péricles, os historiadores Xenofonte e Heródoto, os filósofos Plutarco e Platão, o poeta Aristófanes, o pai da Medicina Hipócrates, além do general Alcibíades, personagem de destaque da Guerra do Peloponeso.

A Atenas descrita pela escritora é ornamentada por belas estátuas e templos, movimentada comercial e culturalmente, importante polo político e econômico da Ática, apresentada como de fato era (ou como imaginamos) naquele período da história helênica. Cindy Stockler descreve as reuniões (symposium), as assembleias dos cidadãos para decidir pelo voto os destinos da cidade, as normas e regras que regiam a vida das pessoas que moravam naquele local cosmopolita e vibrante. Mostra que a democracia grega não era completa, pois não se permitia a escravos, estrangeiros e mulheres participarem das decisões de Atenas.

Cindy Stockler, escritora | Foto: Divulgação

Callíope, ainda jovem, se casa por imposição do pai, fica viúva e por não ter filhos com o marido, perde o direito da propriedade das terras dele, de acordo com as normas vigentes na época. Retornando à casa paterna, enfrenta um duro destino: se tornar escrava em pagamento de uma dívida contraída por seu pai, Ganimedes, para financiar uma safra de trigo que acaba confiscada para o esforço de guerra. Nesse momento, ela se muda para Atenas, já na condição de escrava, e somos envolvidos pela atmosfera da cidade, seus costumes, comemorações, tradições religiosas.

Poucas vezes em minhas leituras havia interrompido a leitura da história para consultar o apêndice. Mas no caso desse livro, as informações históricas adicionais colocadas pela escritora ajudam a entender o contexto do romance e a identificar as personagens históricas gregas que estão inseridas no enredo. Então, as pequenas interrupções são necessárias para esclarecer fatos, personagens ou costumes da Grécia Antiga.

Cindy Stockler nasceu na capital paulista, formou-se na Faculdade de Direito do Largo do São Francisco e exerceu a advocacia por vários anos, antes de se dedicar a escrever romances. Sua formação acadêmica contribuiu para a escritora construir fatos e personagens com enfoque ligado às questões jurídicas. E essa característica está presente em “Callíope a escrava de Atenas”, onde são detalhadas as regras que regiam os atenienses da época antiga, assim como assembleias de cidadãos que deliberaram decisões importantes para o destino dos personagens principais no desfecho do romance.

Graças ao impacto do livro “Callíope a escrava de Atenas”, Cindy Stocker foi nomeada membro honorário da Associação Nacional dos Autores Gregos, que teve sua versão em língua grega lançada naquele país europeu. Na Feira Internacional do Livro, em Frankfurt, de 2017, a obrao chamou a atenção de uma editora grega. Lançado naquele país, o livro teve grande receptividade por parte de críticos literários e jornalistas na Grécia.

No Brasil, a primeira edição do romance histórico foi publicada em 2004 e uma segunda lançada em 2017, ambas pela editora Letras do Pensamento, uma das empresas integrantes do Brazilian Publishers — projeto de internacionalização de conteúdo editorial brasileiro, realizado por meio de uma parceria entre a Câmara Brasileira do Livro (CBL) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).

Mariza Santana é jornalista e crítica literária. E-mail: marizassantana.gmail.com