Por que os pecuaristas dos EUA estão enfurecidos com o plano de Donald Trump de importar mais carne bovina da Argentina
02 novembro 2025 às 20h00

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Na tentativa de conter os preços recordes da carne bovina nos Estados Unidos, a administração Trump anunciou que está negociando com a Argentina para ampliar a cota tarifária de importação de carne bovina argentina de cerca de 20 mil para 80 mil toneladas. A ideia é simples: permitir mais carne importada a tarifas mais baixas para que haja maior oferta no mercado interno americano e, com isso, pressão para queda dos preços ao consumidor.
A reação dos pecuaristas americanos
Apesar da justificativa governamental, a reação do setor americano foi de indignação e sentida traição. Algumas das principais entidades do setor, como a National Cattlemen’s Beef Association (NCBA) e a R-CALF USA, declararam-se contrárias ao plano — argumento central: a medida mina a competitividade dos pecuaristas domésticos, justamente num momento em que muitos produtores viviam uma rara fase de lucratividade após anos difíceis.
Para ilustrar: logo após o anúncio, o preço dos bezerros (calves) caiu entre US$ 40 a US$ 45 por “cem libras” (aproximadamente 45 kg) em algumas regiões, conforme relatos de criadores em Washington. Outros reclamam que a política contradiz o slogan “América Primeiro” (“America First”) que Trump promoveu, pois foca em importar em vez de proteger ou incentivar a produção doméstica.
Realidades de mercado e críticas econômicas
Economistas ouvidos apontam que o impacto real da importação argentina sobre os preços nos EUA será muito limitado. A Argentina representa apenas cerca de 2,1% das importações americanas de carne bovina até agora. Além disso, o que os EUA importam da Argentina costuma ser carne mais magra ou “trim” (que vai para hambúrguer), e não cortes premium, de modo que o efeito sobre os preços de steak não seria significativo. Por outro lado, o setor enfrenta forte queda no número de cabeças de gado — está no menor nível em 70 anos ou mais — em função de secas prolongadas, altos custos de ração e outros desafios estruturais.
A contradição política e o efeito sobre os criadores
No entanto, acrescenta, o país que realmente tem um superávit de carne bovina para exportar é o Brasil, e se Trump reduzisse as tarifas de 50% sobre as importações brasileiras, “isso seria uma história completamente diferente”.
Para muitos, isso gera insegurança sobre os rumos da política agrícola e comercial: se as importações podem aumentar, o investimento em ampliação de rebanho ou recuperação de pastagens torna-se mais arriscado. “Quanto mais incerta é a política, menos disposto estou a colocar dinheiro no campo”, resumiu o economista Glynn Tonsor.
E agora?
O governo afirma que a importação de carne argentina será “modesta” e que, ao mesmo tempo, adotará medidas de apoio aos pecuaristas americanos — como incentivo à abertura de terreno para pastagens, abertura de novas plantas de processamento de carne e estímulo à expansão do rebanho. Do ponto de vista legislativo, vários parlamentares republicanos de estados pecuaristas já manifestaram apreensão ou oposição ao plano, pedindo ao governo mais clareza sobre os impactos e garantias para os criadores locais.
