De presidente a detento: Sarkozy inicia pena em cela solitária na prisão La Santé
21 outubro 2025 às 13h12

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O ex-presidente da França Nicolas Sarkozy, de 70 anos, começou nesta terça-feira, 21, a cumprir sua pena de cinco anos de prisão na penitenciária La Santé, em Paris. Condenado por associação criminosa no escândalo de financiamento de sua campanha eleitoral de 2007 com recursos do regime líbio de Muammar Kadafi, Sarkozy torna-se o primeiro ex-chefe de Estado francês e ex-líder da União Europeia a ser preso.
A decisão, proferida em 25 de setembro, determinou que o político conservador cumprisse a pena em regime fechado. O tribunal concluiu que Sarkozy e aliados receberam até 5 milhões de euros em espécie do empresário franco-libanês Ziad Takieddine, intermediário do ditador líbio, em troca de apoio político e reabilitação da imagem de Kadafi no exterior.
Prisão histórica e de alta segurança
A penitenciária La Santé, onde o ex-presidente ficará detido, é uma das mais antigas e seguras da França. Localizada no centro de Paris, passou por uma ampla reforma recente, mas ainda enfrenta o mesmo problema que afeta o sistema prisional francês: a superlotação. Projetada para 657 presos, a unidade abriga atualmente mais de 1,200 detentos.
Sarkozy ficará em uma ala de isolamento — conhecida como “cela solitária” —, com cerca de nove metros quadrados, um pátio e uma sala de atividades. O espaço é reservado a presos considerados vulneráveis, como ex-membros do governo, magistrados ou pessoas envolvidas em casos de grande repercussão pública.
Segundo o diretor da administração prisional francesa, Sebastien Cauwel, o ex-presidente cumprirá pena sozinho, por razões de segurança. “As condições são idênticas às demais alas, mas garantem isolamento total para evitar riscos e tensões”, afirmou à rádio RTL.
Condições na cela
Apesar do isolamento, a cela do ex-presidente segue os padrões atuais da prisão. Após a reforma, todas as unidades receberam chuveiro individual, telefone fixo e acesso pago à televisão — um serviço que custa 14 euros por mês. Detentos também podem comprar alimentos e preparar suas próprias refeições.
A penitenciária La Santé ficou conhecida por abrigar nomes célebres, como o militante venezuelano Carlos, o Chacal, e o ex-ditador panamenho Manuel Noriega. O ex-assessor de Sarkozy, Claude Gueant, também condenado no mesmo processo, ficará em uma ala especial para “pessoas vulneráveis”, já apelidada pela imprensa francesa de “ala VIP”.
O impacto político e pessoal
Sarkozy, que ainda mantém forte influência sobre setores da direita francesa, afirma ser vítima de perseguição política e diz não temer a prisão. “Manterei minha cabeça erguida, inclusive diante das portas de La Santé. Lutarei até o fim”, declarou ao jornal La Tribune Dimanche.
O ex-presidente contou que pretende usar o tempo na prisão para escrever um livro. Ele levou dez fotos da família e três volumes permitidos — entre eles, O Conde de Monte Cristo, clássico de Alexandre Dumas sobre um homem injustamente encarcerado que busca vingança após escapar da prisão.
A esposa, Carla Bruni-Sarkozy, também é investigada por supostamente tentar pressionar testemunhas a silenciar sobre o caso.
Superlotação e tensão nas prisões francesas
O caso de Sarkozy reacende o debate sobre as condições do sistema prisional francês, frequentemente criticado por organizações de direitos humanos. A França é o terceiro país mais superlotado da Europa, atrás apenas de Eslovênia e Chipre, segundo relatório do Conselho Europeu.
Nos últimos meses, o país enfrentou uma série de ataques e protestos dentro e fora das prisões, liderados por um grupo que reivindica melhores condições carcerárias. O ministro da Justiça, Gérald Darmanin — aliado político de Sarkozy —, tem prometido endurecer o controle sobre o tráfico e o uso de celulares por detentos, apontados como instrumentos de comunicação para crimes e ordens de assassinatos.
Um fim simbólico para uma era política
A prisão de Nicolas Sarkozy marca um ponto de inflexão na história política recente da França. O homem que já prometeu “limpar a escória dos subúrbios com mangueiras de alta pressão”, em referência a jovens envolvidos em distúrbios urbanos, agora vive sob as regras de um sistema penitenciário que ele próprio defendeu tornar mais rigoroso.
De presidente da República a detento em cela solitária, Sarkozy encerra um ciclo de poder e controvérsia que expõe, mais uma vez, a delicada relação entre política e justiça na França contemporânea.
Leia também: Justiça francesa condena Nicolas Sarkozy a cinco anos de prisão por financiamento ilegal de campanha de 2007
