Usina em Goiás mantinha 53 trabalhadores em condição análoga a escravidão

26 outubro 2023 às 12h54

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O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou 53 trabalhadores em condições análogas a escravidão na usina Centroálcool, em Inhumas, Goiás. As vítimas foram contratadas por “gatos” no Maranhão, Piauí e Bahia que ganhavam R$ 43,00 mensalmente por cada trabalhador aliciado. A operação foi realizada nesta nesta quarta-feira, 25.
Os trabalhadores laboravam no corte de cana-de-açúcar para uma usina sucroenergética da região e haviam sido irregularmente arregimentados por “gatos” (aliciadores de mão de obra) nos estados do Maranhão, Piauí e Bahia. Os trabalhadores resgatados estavam alojados em condições “subumanas” em diversos barracos nas cidades de Inhumas, Araçu e Itaberaí.
Apesar de terem sido aliciados em outras regiões do país, esses trabalhadores migrantes não recebiam alojamentos e eram obrigados a alugar alguma moradia nas cidades para apresentar o comprovante de endereço à empregadora para que, assim, tal empresa os tratassem como se fossem moradores da região, se esquivando da obrigação de fornecer alojamento e alimentação.
Os barracos onde dormiam referidos cortadores de cana eram bastante velhos e sem ventilação. Nenhum deles havia camas e alguns sequer possuíam colchões, tendo o rurícolas que dormir diretamente no piso cimento, forrado apenas por um lençol ou cobertor; também não havia fornecimento de roupas de cama e nem armários individuais, bem como locais adequados para preparo e tomadas de refeições.
As condições de trabalho no campo também estavam irregulares, pois nas frentes de trabalho de corte de cana-de-açúcar não havia instalações sanitárias, tendo os trabalhadores que fazer suas necessidades fisiológicas no meio dos canaviais; não dispunham de pausas e de intervalo mínimo para refeição e muitos estavam com os equipamentos de proteção individual danificados.
Procurada pelo Jornal Opção, a usina Centroálcool não atendeu as ligações.

A operação conjunta foi realizada por Auditores-Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, com a participação do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Não pagamento das verbas rescisórias
Dada as condições desumanas de trabalho, os representantes da empregadora foram notificados pelos Auditores-Fiscais do Trabalho para providências no sentido rescindir os contratos de trabalho de todos os trabalhadores do local, bem como realizar os pagamentos de suas verbas rescisórias, no total de 950.000,00 (novecentos e cinquenta mil reais).
Todavia, a empresa se recusou a pagar tais verbas, sendo que tais valores, acrescidos de dano moral individual e coletivo, será cobrado na Justiça do Trabalho por meio de processo a ser movido pelo Ministério Público do Trabalho.
Como não tinham dinheiro para retornar aos estados de origem, os Auditores do Ministério do Trabalho adquiriram, com recursos da União, as passagens de ônibus para todos eles. Todos já retornaram às suas cidades.
Seguro-desemprego de trabalhador resgatado
Todos os 53 trabalhadores resgatados da condição análoga à de escravo foram cadastrados no sistema de “seguro-desemprego de trabalhador resgatado” e receberam 03 parcelas do referido benefício, correspondente a 01 salário mínimo cada, nos termos da legislação que regula a matéria (art. 2 – C da Lei 7.998/90, com redação dada pela Lei 10.608/02).

Trabalho escravo contemporâneo
Cabe aqui ressaltar que o trabalho escravo contemporâneo não guarda muita similaridade com a antiga concepção de trabalho escravo, onde o trabalhador era mantido acorrentado e trabalhava sob ameaças de açoitamento. Ao contrário, o trabalho escravo contemporâneo se caracteriza mais pela ofensa à dignidade do trabalhador do que pela liberdade de locomoção propriamente dita, podendo ser praticado por diversas condutas, tais como: “trabalho forçado”, “servidão por dívida”, “jornadas exaustivas” ou “condições degradantes de trabalho”, sendo essa última modalidade a mais comum.
Punições
A empresa responsável será autuada por todas as infrações constatadas pela equipe de fiscalização e podem ter o nome inserido na Lista de Empregadores que submetem seus empregados a condições análogas às de escravo, conhecida como “Lista Suja”. Além disso, os responsáveis poderão responder criminalmente pelo ilícito de “Redução a condição análoga à de escravo”, previsto no art. 149 do Código Penal Brasileiro, cuja pena pode chegar a até 08 anos de prisão e multa.
Por fim, terão que pagar dano moral individual e coletivo, a ser negociado com o representante do Ministério Público do Trabalho.
Outras fiscalizações
Durante a citada operação, denominada de “Operação Cana Queimada”, também foram fiscalizados outros empregadores, inclusive no corte de cana, nos municípios de Itapuranga, onde se verificou várias irregularidades trabalhistas, mas não ao ponto de configurar análogo ao de trabalho escravo.