Novo presidente do PSDB goiano, deputado federal prepara o partido para as eleições do próximo ano, referenda conquistas do governo Marconi, mas diz que é preciso avançar mais

Foto: Fernando Leite/Jornal Opção

Um dos nomes mais proeminentes do Tempo Novo está agora na presidência do PSDB em Goiás. Ex-secretário de Marconi Perillo em todas as gestões anteriores do governador , Giuseppe Vecci agora está na Câmara dos Deputados, mas assume a missão de fortalecer o partido visando o cenário eleitoral de 2018, que deverá ser afetado — ou pelo menos bastante influenciado — pela sequência da Operação Lava Jato. Em busca de fazer o partido crescer na próxima disputa, o parlamentar já começa a percorrer todo o Estado.

Nesta entrevista ao Jornal Opção, além de discorrer sobre o cenário político nacional e local, Vecci, que é um respeitado economista, fala também sobre as perspectivas de superação da crise brasileira. Ele acredita que o fator Donald Trump pode ser favorável, se o País souber trabalhar as brechas deixadas pelas quebras de acordos e tratados econômicos que implementa o novo presidente dos Estados Unidos. Mas deixa um senão: “Com Trump, há certamente boas perspectivas para o Brasil, mas ele é uma incógnita e também pode fazer retomar a recessão em nível mundial”, alerta.

Euler de França Belém — O economista Pérsio Arida diz que o PIB do Brasil precisaria crescer 1,5% para gerar emprego. Por outro lado, outros economistas alertam que as empresas começam a quebrar agora, em 2017, porque já vinham se arrastando para pagar as contas. Em Goiânia, temos, por exemplo, os restaurantes Kabanas e Piquiras em recuperação judicial. O presidente Mi­chel Temer (PMDB) e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, es­tão atuando para recuperar essa economia. Dizem que as ações são corretas, mas os resultados não são imediatos. É assim que o sr. avalia também?
Demoramos anos e anos para ter es­tabilidade da economia no governo Fernando Henrique Cardoso [1995-2002], que criou as bases para alterar positivamente o desenvolvimento brasileiro. Vivemos um “boom” no primeiro governo de Lula [período de 2003 a 2006]. Depois, o governo do PT foi um total fracasso em termos de gestão — em especial no go­verno Dilma Rousseff, um desastre que arrasou nossa economia em to­dos os indicadores e perspectivas, pra­ticando uma política populista, de­ficitária e com um viés atrasado do ponto de vista econômico do capitalismo.

Com o governo Temer, temos agora sinais de recuperação da credibilidade e de expectativas sobre a economia. A própria queda da inflação leva a uma consequente queda da taxa de juros, que, por sua vez, aumenta em tese a possibilidade de crédito, o que, também por sua vez, faz subir a perspectiva de investimento. Por fim, isso faz retomar o crescimento, ainda que pequeno, pela geração de emprego e renda. Vejo que há sinais positivos, ancorados pela queda da inflação e de juros e na boa produção agrícola que tivemos este ano, bem como na continuidade das reformas que estamos levando à frente no Congresso, criando boas expectativas. Mas, de fato, a economia não se recupera de um dia para o outro. Precisamos perseverar em tudo isso, nas questões que realmente interessam.

Vou dar um exemplo: fui vice-presidente da Comissão Mista de Orçamento. Dos 100% do que temos de orçamento federal, 42% vão para amortizar o serviço da dívida e 22% financiam a Previdência. Ou seja, somente com esses dois itens já temos 64% do orçamento comprometidos. Então, você pode me questionar, quanto gastamos com saúde? E eu respondo: 3,9%. E com educação? 3,8%. E com juros? 42%. Por quê? Porque foi se criando e se financiando um déficit com cada vez mais dívida, pela emissão de papéis por não conseguir pagar o serviço da dívida. E a coisa chegou a tal ponto que isso corresponde a quase 70% do PIB brasileiro.

Augusto Diniz — E qual seria a saída para isso?
Há diversas opiniões. Os mais conservadores dizem que devemos reduzir a taxa básica dos juros, a Selic, reduzir a inflação e fazer as reformas para gradativamente diminuir a taxa de juros; já os partidos de esquerda, como o PSOL, acham que é necessário fazer uma auditoria da dívida; outros querem o calote na dívida. Eu, de minha parte, acho que o Brasil precisa ter coragem para repactuar a dívida. Não é nem dar calote nem fazer auditoria, é renegociar o estoque da dívida. Basta ver como estão fazendo as empresas que têm dívidas ou estão em recuperação judicial. Elas vão ao banco e renegociando o estoque de dívidas delas, tanto o quantitativo como melhores condições de pagamento.

O Brasil precisa fazer o mesmo diante de seus credores. Não dá para pagar 42% de dívida — quer seja amortização, quer seja serviço da dívida —, porque o País não aguenta. Não há poupança para investir, não há poupança para fazer infraestrutura. Temos de juntar os partidos para brigar, no Congresso, para conseguir essa pactuação com os credores brasileiros. Repito: tem de ser pactuado, não é calote ou coisa assim. Só dessa forma vamos conseguir reduzir esse estoque de dívida para ter o mínimo de poupança para investir.
Euler de França Belém — O sr. acha que o Brasil crescerá ao menos 0,4% ao ano?

Eu creio que sim. Temos perspectivas, basta ver que temos quase 216 milhões de toneladas de grãos, que são uma commodity importante para o País. Temos a possibilidade de termos ganhos no comércio internacional, depois de perder o bonde da história com o Mercosul, já que não fizemos acordos com grandes países, nem da Europa nem outros. Nem na OMC [Orga­ni­zação Mundial do Comércio], nas rodadas de Doha conseguimos ter uma inserção mais qualitativa no comércio. Isso fez os países do Pacífico montarem esses tratados, que agora, com o presidente Donald Trump, estão sendo desfeitos.

Euler de França Belém — Com essas medidas de Trump, o cenário melhora para o Brasil?
Creio que agora possamos recuperar o tempo perdido, fa­zendo acordos que nos deem con­dições de uma retomada de negociações em nível internacional.

Marcos Nunes Carreiro — Mas que portas foram abertas para o Brasil com a chegada de Trump ao poder?
Essas portas se abriram por meio da quebra de todos os acordos dos quais o Brasil tinha ficado de fora, como os fechados com os países do Pacífico. Exis­tiriam negociações entre esses países com grandes níveis de facilidade, mas das quais o Brasil estava excluído. A partir de agora, que se rompeu este acordo [o Tratado do Transpacífico] por parte dos Estados Unidos, cria-se uma nova perspectiva para o Brasil, de podermos — dentro de uma nova visão, mais agressiva, de comércio internacional — realizar acordos com outros países dessas localidades.

Augusto Diniz — Mas há uma tentativa de Trump de fazer um pacto com a Inglaterra a partir da saída da Grã-Bretanha da Comunidade Europeia. Isso não isolaria o resto do mundo?
Não, porque não será feito apenas um acordo por eles. O Brasil perdeu o bonde porque ficou aqui tentando fazer acordos com países e regiões mundiais — Europa, Ásia, a própria A­mérica do Norte — apenas por meio do Mercosul — juntamente com a Argentina, em es­pecial. Agora, não, o ministro Jo­sé Serra está discutindo a questão para dar dinâmica ao Mer­co­sul, não abrindo mão de negoci­a­ções do ponto de vista individual.

Para isso, porém, o Brasil vai ter de fazer uma abertura maior. Somos um país fechado, protecionista do capital nacional, protegemos as indústrias brasileiras em determinados segmentos. Vamos ter de ter coragem de abrir o mercado brasileiro para ser chocado pela inovação lá de fora. Isso vai trazer consequências para muitas empresas brasileiras, mas, ao mesmo tempo, com certeza, aprimorar nosso potencial, nossa tecnologia, e a gente vai poder, em alguns setores, concorrer em pé de igualdade — como hoje já ocorre no caso da carne, das commodities minerais, da agricultura.

Marcos Nunes Carreiro — O Brasil vai ter de fazer, então, o caminho reverso em relação ao que Trump está fazendo nos Estados Unidos…
Com certeza.

Elder Dias — Trump não seria, ao mesmo tempo, também um fator de desequilíbrio, do imponderável, no jogo político? Digo isso porque a gente não sabe o que está na cabeça dele. Por suas primeiras ações, é como se o mundo caminhasse para um lado e Trump para o outro. Ele fecha fronteiras, quebra acordos. Em suma, está desconstruindo. Então, neste cenário, por causa do fator Trump, não se torna imprevisível o crescimento de uma economia tão dependente do que ocorrer lá fora, como é a do Brasil?
Com certeza. Se a economia americana desaquecer, isso afetará o mundo inteiro. É a maior economia do mundo.

Elder Dias — Trump não é um perigo, por causa disso?
Ele hoje é essa instabilidade, como você colocou. A gente não sabe o que vai ocorrer. Veja que ele está se chocando com seus parceiros tradicionais — Europa, In­gla­terra, México, Canadá — e está di­zen­do agora que vai rever o Nafta [tra­tado econômico dos países da A­mérica do Norte]. Tudo isso certamente pode criar boas perspectivas para o Brasil, como também pode fazer retomar a recessão em nível mundial. Os Es­tados Unidos saíram do processo recessivo de 2008 para uma economia que cresce hoje e faz também uma propulsão no mundo inteiro, assim como a economia chinesa fez, bem como outras economias maiores em nível mundial. Claro, isso traz incerteza para todos nós.

Elder Dias — Se estava crescendo, para que mudar?
Euler de França Belém — Mas é preciso interpretar o processo de outra forma. Ian Kershaw [historiador e professor na Universidade de Sheffield, uma das principais referências acadêmicas sobre Adolf Hitler] diz que um dos primeiros erros dos historiadores europeus foi tratarem Hitler como doido. Ao examiná-lo de perto, viu-se que Hitler era um exímio estrategista militar. Seu erro principal foi a invasão da União Soviética, além de permitir o ataque a Pearl Harbor [ação contra base militar dos Es­ta­dos Unidos que fez o país entrar na Segunda Guerra Mundial]. Mas, até 1943, ele ganhava a guerra. Invadiu a Polônia, em 1939, e venceu a França em 1940. A nova historiografia, inclusive a alemã — que tendia a demonizar Hitler para poder proteger os alemães —, mudou de perspectiva não vê mais dessa forma. Com Trump, há a tendência de entendê-lo apenas pelo ilógico, mas sempre há racionalidade por trás do que é aparentemente ilógico. Qual é essa racionalidade?
Quando Trump diz que vai investir em infraestrutura, que vai reformar toda a infraestrutura dos Estados Unidos — que já é uma das melhores do mundo —, com certeza traz um efeito multiplicador positivo para a economia. Mas, quando ele impõe esse viés populista, um regime de substituição de importação, de produzir tudo nos Estados Unidos… Isso se choca com todo o espírito da globalização criado pelo próprio americano, que é muito maior do que seu governo. Então, realmente é um momento de incerteza em relação ao que possa vir a ocorrer.

Euler de França Belém — Esse é um pensamento que existe nos Estados Unidos, não é apenas o Trump em si. Mas qual é a racionalidade disso? Reagan [Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos de 1981 a 1988], por exemplo, foi tratado como maluco…
Vejo que há uma certa tendência, embora não seja exatamente isso, de buscar um liberalismo clássico, entendendo que o mercado por si só possa resolver todas as questões. Quando ele quebra as políticas mais sociais, como o Obamacare [ampla reforma no sistema de saúde norte-americano que se tornou lei federal em 2010, no governo de Barack Obama], que tinham o Estado mais regulador, mais presente, ele retoma o espírito do republicano, mais liberal clássico, que pensa que a intervenção do Estado tem de ser cada vez menor. Ao mesmo tempo, isso é um paradoxo, porque, ao fazer isso, ele usa o Estado para intervir e mudar todo o “status quo” da economia americana.

Elder Dias — Trump é uma contradição em si. Ora, se a economia está crescendo, o papel de quem está entrando deveria ser o de rever algumas coisas, detalhes, mas fazendo um ajuste fino. Vamos pensar na vitoriosa seleção brasileira de vôlei: com a saída de Bernardinho, o técnico que entrou em seu lugar [Renan dal Zotto] vai mudar tudo? Parece-me que não. Com o país saindo de uma recessão, a tendência seria rever algumas coisas, mas manter a linha. O que ele diz é: “Está tudo errado e vamos fechar o mercado!”…
Basta ver a questão do muro na fronteira com o México. Serão US$ 20 bilhões. 20 bilhões de dólares! (enfático) É algo altamente controverso do ponto de vista econômico, do ponto de vista da segurança e da imigração, do ponto de vista de todas as políticas que ele colocou.

Elder Dias — A única lógica possível seria que esse muro servisse a uma frente de trabalho, para gerar emprego e renda nos Estados Unidos. Poderia ser isso?
A lógica da economia é agregar valor e produzir algo que seja útil para as pessoas. Senão, é carregar pedra de manhã de um canto para o outro canto, e do outro para o um à tarde, para gerar renda e emprego. Mas não pode ser assim.

Augusto Diniz — A forma com que se obterão os recursos para a construção desse muro, segundo apresentou a Secretaria de Comércio Exterior, parece ilógica, já que objetiva taxar mais os produtos mexicanos que os Estados Unidos importam.
É, mas assim Trump vai quebrar o Nafta, um conjunto de questões… Eu realmente não sei. Tudo isso é muito confuso e, politicamente, Trump está muito confuso também, como se pode ver com o decreto proibindo a entrada de pessoas de sete nacionalidades.

Euler de França Belém — O sr. morou no Canadá e sabe que países considerados “monstros imperialistas” se vistos de fora são, na verdade, altamente democráticos, o que só se alcança com instituições muito fortes. Prova é que, em menos de duas semanas, Trump começou a enfrentar problemas com o Congresso e com a justiça.
As instituições sempre são um contraponto a quem quer exacerbar. A qualquer político ou qualquer pessoa que queira fazer isso.

Euler de França Belém — Teddy Roosevelt [Theodore Roosevelt Jr., presidente dos Estados Unidos de 1901 a 1909] foi enfrentado pelo Con­gresso norte-americano. Por­que, ao contrário de Franklin Ro­osevelt [presidente dos EUA de 1933 a 1945], Teddy tinha a política do “Big Stick” [o “Gran­de Porrete”, em inglês, resumo do lema para sua política externa — “Fale com suavidade e tenha na mão um grande porrete”].
É o que nós estamos vendo no Brasil hoje: as instituições funcionam. Estamos passando por toda dificuldade no País — econômica, social, ética —, mas as instituições funcionam. E hoje nós estamos vivenciando outra questão, que é a quebra de direitos e privilégios que foram conquistados ao longo do tempo por determinados segmentos da sociedade.

Nós vemos hoje um Estado totalmente falido. O Estado brasileiro quebrou. E então me lembro do que Max Weber [sociólogo e economista alemão] falou, muito tempo atrás: porque todo mundo quer viver à custa do governo o governo acaba vivendo à custa de todo mundo. É isso que está ocorrendo no Brasil. Há uma carga tributária grandiosa, o Estado vive à custa de todo mundo sem necessariamente atender, em velocidade e qualidade, a demanda da população. Por isso hoje há uma população raivosa com a gestão pública, que consome uma quantidade de dinheiro grandiosíssima da carga tributária sem retorná-la em forma de bens e serviços de acordo com o que a população paga.

Euler de França Belém — Como o sr. se posiciona a respeito da reforma da Previdência?
No Brasil de hoje a classe política precisa ter coragem de ter desgaste. Não que nós gostemos, mas é preciso se posicionar. Não se pode mais contemporizar. Não dá para agradar a todo mundo. A fórmula do sucesso não existe, mas a do fracasso certamente é tentar agradar a todos. O teto dos gastos, por exemplo, foi uma medida necessária, apesar de ninguém gostar de cortar gastos, para poder estancar o déficit monstruoso que nós estávamos vivendo.
No caso da Previdência, estamos colocando 22% dos gastos do Brasil com a Previdência e cada vez mais gente vivendo até os 75 ou 80 anos, mas se aposentando aos 50 — alguns com direitos adquiridos que confrontam com a grande maioria do povo brasileiro. Um determinado segmento, que conquistou direitos ao longo dos anos, consome uma parcela grandiosa do orçamento em detrimento da grande maioria da população. O trabalhador hoje tem razão de reclamar, até porque vai ter de se aposentar mais tarde e, quando isso ocorrer, terá de ter contribuído e ganhado bem a vida inteira para ter um benefício de R$ 5 mil. E isso não ocorre em outros setores da economia, ou com determinadas classes de servidores públicos.

“Não há reforma da Previdência sem quebra de direitos”

Fotos: Fernando Leite / Jornal Opção

Euler de França Belém — Como está a discussão da reforma da Previdência?
Acredito que haverá um embate grande no Congresso, porque é a quebra de alguns direitos adquiridos. E não tem como não quebrar, não tem como realizar uma reforma se não houver uma mudança. O que a gente precisa é que haja um equilíbrio e que se faça uma transição em relação ao que vivenciávamos anteriormente. Não tem cabimento parlamentar se aposentar diferentemente do trabalhador brasileiro, que é quem paga o salário do parlamentar. Não tem como o trabalhador brasileiro pagar aposentadorias especiais para Judiciário, Ministério Público, servidores públicos ou quem quer que seja.

É preciso, gradativamente, ter uma posição mais equânime do ponto de vista da Previdência. E isso vai quebrar direitos. Ao quebrar direitos, choca-se com uma parcela grande da população. Vai ser assim também com a reforma trabalhista.

Euler de França Belém — E o sr. acredita que a reforma da Previdência sai em 2017?
Acho que sim. Acredito que vai ter muito debate, terá de conciliar atritos, ser mais flexível.

Elder Dias — E como o sr. vê a reforma trabalhista?
A falta da reforma trabalhista hoje atrapalha a geração de empregos, em meu entender. Mas ainda há um viés atrasado que acredita que é preciso ter os mesmos direitos da década de 1940, da época de Getúlio Vargas, da CLT [Consolidações das Leis do Trabalho], que hoje embute uma quantidade grande de encargos. Temos 14 milhões de brasileiros que estão à margem do processo de desenvolvimento.

Euler de França Belém — E a reforma trabalhista?
Ela já começou. É outra reforma que, juntamente com a tributária — de cuja comissão eu faço parte —, não só podem simplificar a questão trabalhista, mas também dar condições para que a gente possa melhorar a competitividade.

Euler de França Belém — As relações entre trabalhador e empresa mudaram independentemente das leis.
Sem a menor dúvida. Hoje é uma relação direta, é um jogo de interesses. Não é mais um choque entre o capital e o trabalho. É lógico que isso ainda existe, mas a cada dia que passa de forma mais reduzida. Porque o que interessa para nós é a geração de emprego e renda. O que ocorre se uma empresa quebra? O maior papel social de uma empresa é sobreviver. Se quebrar, quebra não só o empresário, mas também os empregos dos trabalhadores.
É por isso que cada vez mais acordos que passam à margem da CLT e acabam encontrando respaldo no próprio diálogo entre o empresário e os trabalhadores, entre o capital e o trabalho.

Marcos Nunes Carreiro — Há uma perspectiva de volta de crescimento da economia do Brasil e, consequentemente, da volta dos empregos? Hoje há mais de 11 milhões de desempregados, o que causa um problema não só econômico, mas também social no País. Para quando seria essa perspectiva?
Essa perspectiva só será retomada quando tiver investimento. O País não tem poupança. A primeira coisa que nós temos de quebrar é esse viés político atrasado de que a iniciativa privada é maléfica para o País, claro que não (enfático). Eu sou do PSDB e durante toda a vida fomos capitalistas. En­tendemos que é preciso reformar o capitalismo, o Estado tem de ter um papel regulador, mas como é que nós vamos fazer poupança? Como é que nós vamos fazer investimento? O Estado está quebrado. Quando eu falo “Estado”, eu me refiro aos governos federal, estaduais e municipais. Só temos condição de fazer investimento se for pela iniciativa privada, por meio de concessões, parcerias e alianças. E, para isso acontecer, o governo federal precisa refazer as bases para a retomada do crescimento com taxa de juros, queda da inflação, com a perspectiva da diminuição do endividamento do Estado brasileiro.

Ao mesmo tempo, é preciso criar as condições para que os grandes investimentos em infraestrutura possam ser feitos pela iniciativa privada. Não só a iniciativa privada nacional, mas a iniciativa privada internacional. A Operação Lava Jato não foi nada mais do que a descoberta de um cartel de empresas de engenharia nacional. O Brasil não tem abertura para empresas de engenharia internacional. E por que não temos empresas de engenharia de outros países atuando no Brasil? Não vejo defeito nenhum em ter lucro. O governo Dilma queria taxar o lucro ao fazer concessão. Isso é uma besteira, tem de criar os parâmetros e a iniciativa privada, com inovação, competitividade, produtividade, criar as condições de se desenvolver.

Por isso que em Goiás nós estamos até hoje sem grandes avanços. Vamos tomar alguns exemplos. A ferrovia Norte-Sul, que ainda não foi para frente, apesar de ter sido feita; a ferrovia Brasília-Goiânia; as hidrovias do Rio Paranaíba; e outros grandes investimentos. Investimentos maiores que poderiam trazer um efeito grande têm de ser feitos pela iniciativa privada.

No final da década de 70 e início da de 80 tinha um programa do governo federal chamado Prodiati [Projeto de Desenvolvimento e Integração do Araguaia e Tocantins]. Naquela época, Oton Nascimento [ex-secretário de estado do governo Ary Valadão (1979-1982)], já discutia a região do Vão do Paranã, em busca de fazer naquela região do Nordeste de Goiás inúmeras barragens para poder produzir energia e ter uma maior produção agrícola. Só que tentaram fazer isso via estatal. Resultado: não saiu do lugar. A iniciativa privada é que tem de ter poupança, condição, capital nacional, capital internacional e alianças para que a gente possa alavancar projetos que tragam maior desenvolvimento.

Euler de França Belém — Houve uma divergência em relação à concessão de incentivos fiscais com a Secretaria Estadual da Fazenda. Isso foi equacionado?
Goiás conseguiu ocupar o vácuo da falta de uma política de planejamento regional do Brasil com a criação dos incentivos fiscais. No começo, ainda no primeiro governo de Iris Rezende (PMDB), entre 1982 e 1985, com o Programa Fomentar; e depois em nosso governo, com o Produzir, que foi uma reformulação dos incentivos. E Goiás teve um salto qualitativo ao longo desse período, ocupou espaço, agregou valor à sua economia, gerou maior industrialização, maior produção, maior produtividade e desenvolvimento.

Deixamos de ser um Estado periférico. Ainda estamos longe de outros Estados, mas somos a 9ª economia, como o Brasil também é em nível mundial. O Brasil é a 9ª economia mundial e Goiás é a 9ª economia dentro do Brasil.

Penso que os incentivos fiscais, em um determinado momento, terão de ser revistos. Essa polêmica que foi criada pela Secretaria da Fazenda aconteceu para ter um planejamento melhor dos setores que devem receber incentivos e benefícios. Foi assim que o Brasil foi criado. Eu vejo pessoas gritando contra os incentivos fiscais e benefícios, como se todos os Estados brasileiros não tivessem se desenvolvido em cima disso.

Ora, foi assim com São Paulo entre as décadas de 1930 e 1960; com Minas Gerais e o próprio parque metalúrgico do Rio de Janeiro. Tudo isso criado a partir de incentivos fiscais. A política do café com leite [hegemonia política de Minas Gerais e São Paulo nas décadas de 10 e de 20 do século passado] foi toda criada na época do processo de industrialização. As empresas obtiveram e continuam tendo incentivos fiscais. A Zona Franca de Manaus tem, a linha branca de eletrodomésticos, da mesma forma. Se tomarmos o orçamento do governo federal, há ainda uma quantidade grandiosa de benefícios e incentivos fiscais.

Concordo que é necessário que haja uma repactuação. Mas essa repactuação tem de vir juntamente com uma nova política de desenvolvimento regional. E aqui no Estado de Goiás, acho que nós precisamos muito mais do que isso. Avançamos muito, o governo Marconi inseriu Goiás na rota do desenvolvimento, mas nós ainda repetimos o modelo, apesar de tudo o que se avançou em termos no PIB, de infraestrutura, de agregar valores, de trazer indústrias. Nós trabalhávamos para aumentar a produtividade agrícola e hoje já temos indústria metalomecânica, por exemplo. De qualquer forma, é preciso muito mais, porque ainda há um desequilíbrio regional grande que requer políticas públicas para ser revertido. Há regiões ricas em detrimento de regiões pobres. Há estudos do Instituto Mauro Bor­ges que mostram que os dez municípios mais ricos de Goiás concentram 66% da riqueza do Estado, e os outros 236 municípios ficam com 34%. Isso reflete um desequilíbrio regional, sem contar a disparidade social que existe no Estado e no País em geral. É uma realidade de concentração de riqueza nas mãos de poucos.

Então, entendo que precisamos dar um novo salto de qualidade. Temos de perseverar nessa luta que o governo Marconi vem fazendo para modernizar o Estado e para inovar e, então, passarmos o bastão para um novo salto de desenvolvimento e de crescimento econômico no Estado.

Euler de França Belém — A crise econômica é realidade no País e os Estados, principalmente Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, estão sofrendo muito. Por que em Goiás não é sentida essa crise tão profunda? É o agrone­gócio goiano que alivia essa situação?
Não somos uma ilha, não estamos ao largo da crise, mas entendo que o agronegócio deu a Goiás uma condição de não sofrer tanto os efeitos da crise econômica. E temos de destacar também o tanto que conseguimos aumentar de produção e de produtividade. Hoje, produtos como carne, soja, milho, sorgo e frango nos deram condição de inserção internacional. Produzimos não só para o mercado brasileiro, mas também para exportação.

Mas Goiás vai ter de alcançar uma nova inserção qualitativa, que passará pela melhoria da infraestrutura, da comunicação, da educação, do conhecimento, que é valor chave, estratégico, fundamental. Passa também pela melhor qualificação de mão de obra. O Brasil hoje não melhora a produtividade porque tem uma mão de obra ainda de pouca qualificação. É preciso melhorar isso. Temos de continuar melhorando na produção, na industrialização, e na competitividade. Por que um mesmo produto produzido em Goiás, em Minas, na Argentina e na Ásia tem preços diferentes? É que qualquer produto tem um conjunto de fatores — como mão de obra, qualificação, impostos, infraestrutura, entre outros — para compor seu preço. Quem consegue desenvolver esses fatores de competividade de melhor forma consegue também produzir com custo menor. Goiás tem de conseguir essa inserção qualitativa.

Por isso eu disse: temos de continuar esse novo de desenvolvimento em Goiás, com inovação, com conhecimento, para passar o bastão e não ocorrer o que houve no Rio Grande do Sul, um Estado com economia agrícola muito mais desenvolvida que a nossa, mas que hoje está em situação muito difícil.

Augusto Diniz — Os incentivos fiscais deram poder de atração de empresas para alguns Estados, como Goiás. A ex-secretária da Fazenda Ana Carla Abrão contestou, de certa forma, esse sistema…
A ex-secretária tentou, pelo que pude perceber, ser mais seletiva nos incentivos fiscais — até porque essa política não era apenas dela, é uma política mais “macro”. Lembremo-nos de que o governador Marconi Perillo está em seu quarto mandato, mas, quando era secretário da Fazenda, nossa crítica naquela época, em 2003, era de que o boi saía “em pé” [sem abatimento], que a soja não era esmagada, que o milho não era processado em Goiás. E nós criamos uma política de incentivos fiscais e atraímos 21 frigoríficos para o Estado de um dia para outro. Hoje ninguém fala que o boi sai em pé — podem até dizer que a JBS [empresa de frigoríficos] está cada vez mais comprando unidades, mas Goiás agregou valor na produção pecuária.

Os incentivos são políticas públicas que os governos usam para se desenvolver, mas concordo que é preciso ser mais seletivo na concessão do benefício. Até porque no dia que o Brasil acabar com os todos os incentivos — e benefícios fiscais, que são diferentes de incentivos — aí sim, dará para discutir uma questão mais equânime. Mas, como não existe isso, se torna uma conversa de paulistas, mineiros e cariocas.

Euler de França Belém — O Estado privatizou Cachoeira Dourada [em 1997 pelo então governador Maguito Vilela, do PMDB] e atomizou seus recursos, que foram usados para compra de cestas básicas, jalecos e outra coisas. Agora, com a venda da Celg, não pode ocorrer a mesma coisa?
Estou vendo o governo de Goiás planejando como usar os recursos que vai receber pela venda da Celg. O vice-governador José Eliton (PSDB), encarregado pelo governador Marconi, vai apresentar os estudos sobre onde aplicar esses recursos, para que possa ter um efeito multiplicador na economia, para que não sejam dispersados como ocorreu na venda de Cachoeira Dourada. Certamente isso é fundamental a Goiás para trazer desenvolvimento, inovação, uma condição de inserção qualitativa para o Estado.

Euler de França Belém — Ao mesmo tempo em que a Celg é vendida, o governo, em parceria com empresas, está investindo em energia fotovoltaica. É rentável, é um investimento correto?
Não tenho conhecimento preciso para emitir uma opinião se esse segmento de geração de energia é o caminho. Mas tenho clareza de que é preciso haver alternativas às fontes hídricas de energia. E, então, se encaixam a fonte eólica, a fotovoltaica e outras. Fundamental é ter energia em quantidade, com qualidade e a preço acessível para gerar desenvolvimento. Energia é um insumo fundamental para a produção.

Deputado federal Giuseppe Vecci: “Fundamental é ter energia em quantidade, com qualidade e a preço acessível” | Foto: Fernando Leite / Jornal Opção

Euler de França Belém — O que o sr. acha do modelo implantado pela Celg GT associada com empresas?
É o papel do Estado de fomentar momentaneamente a criação de empresas que possam gerar desenvolvimento e passar isso mais à frente. O Estado sempre vai estar num processo de construção de novas etapas, depois de sua consolidação, para, então, fazer o repasse dessas etapas para outros. É o que o economista Schumpeter [Joseph Alois Schum­peter, austríaco, 1883-1950] chamou de “destruição criativa”: constrói-se algo hoje, que então melhora, agrega valor, avança um tanto, depois se passa a outro valor e assim se segue num processo evolutivo. Acho que esse é um papel mais moderno do Estado, não é um papel keynesiano, é mais um papel de inovação, de criar tecnologias e depois partir para outra etapa. Foi o que a Embrapa fez na década de 1970 no Brasil. A profusão de inovação é fundamental e isso ocorre com o fomento dos governos brasileiros.

Marcos Nunes Carreiro — Ao falar da necessidade do “salto qualitativo” na orientação do governo, o sr. vê no vice-governador José Eliton o nome para guiar esse salto a partir de 2018?
Não tenho a menor dúvida. Ele está se preparando, trabalhou nesse período como vice-governador, como presidente da Celg, como secretário de Desenvolvimento Econômico, como secretário de Segurança Pública, o que lhe deu uma visão mais holística da administração pública. E está engajado no projeto de modernizar, de inovar, de dar esse salto de qualidade na nossa economia e também de uma nova prática política que se traduz no equilíbrio para poder aglutinar as forças no Estado e levá-las a esse novo salto que Goiás precisa dar. Aquilo que chamei anteriormente inserção qualitativa. Isso quer dizer chamar a iniciativa privada para fazer infraestrutura, chamar as academias para aplicar seu conhecimento, chamar o segmento empresarial para qualificar melhor a mão de obra. Isso é para que a gente possa criar condições de crescimento e desenvolvimento, não apenas para geração de riquezas, o que é fundamental, mas também para a melhoria da qualidade de vida daqueles que aqui residem.

Augusto Diniz — Como o sr., presidente do PSDB estadual, pretende trabalhar com a base para superar o desgaste natural que existe pelo período no poder desse grupo? Afinal, o PSDB comanda o Tempo Novo que, em 2018, completa 20 anos no poder.
Não somos radicais nem sectários. Entendemos que há um pré-candidato, que é José Eliton, que reúne todas as condições de atravessar esse momento e ser a pessoa que dará um novo salto de qualidade. Agora, se há desgaste, também há trunfos para mostrar à sociedade goiana. E não vejo ninguém com as mesmas condições do vice-governador para fazer isso. Porém, ninguém faz política de maneira isolada e é preciso que nós do PSDB, bem como todas as forças que se aglutinarem em torno de José Eliton, possamos levantar novas bandeiras que possam canalizar o interesse maior da nossa economia e criar perspectivas de continuar desenvolvendo o Estado, gerando emprego e renda. E há disposição de fazer um plano de governo que aglutine tanto os interesses da economia quanto da política.

Augusto Diniz — Quando o sr. desistiu de disputar a eleição a prefeito de Goiânia, o governo optou por apoiar Vanderlan Cardoso (PSB), mesmo a base tendo um candidato, que era Francisco Júnior, do PSD. Isso pode gerar algum desgaste dentro da base em 2018?
É um grande exemplo do que não pode ocorrer em 2018. Nós deveríamos ter nos juntado. Eu tive o desprendimento de retirar meu nome, pois não consegui aglutinar todos os partidos da base aliada. Como isso não aconteceu com nenhum outro nome também, o resultado foi a vitória de nossos opositores. Isso não quer dizer que, internamente, não possamos debater e dialogar na busca de encontrar um denominador comum. Temos um pré-candidato e acredito que ele tem condições de aglutinar a base, mas isso não nos deixa imunes a receber alternativas para o processo de discussão.

Entendo que, se continuarmos unidos e tivermos um projeto inovador, de desenvolvimento e de crescimento para Goiás, por que não continuar? E é nesse sentido que nós, do PSDB, queremos trabalhar. Não queremos ter um governo populista, que venda facilidades. Quem disse que Goiás não tem problemas? Temos. O governo acertou em muita coisa, mas há outras que precisam ser ajustadas. E vamos fazer isso. Não existe salvador da pátria, mas o somatório de esforços nos levará a um futuro melhor.

Marcos Nunes Carreiro — Quais são seus planos para 2018? Será candidato à reeleição?
Ainda estou trabalhando com 2017. Assumi agora a presidência estadual do PSDB e quero, juntamente com meus colegas de partido e da executiva municipal, fazer ações muito dinâmicas neste ano. Já estive em Catalão, em Jataí, em Morrinhos e em Anápolis e vamos percorrer o Estado inteiro para recuperar a interlocução do partido com seus filiados e, assim, fazer um processo massivo de novas filiações, para nos oxigenar e mostrarmos o que é o PSDB. Não tenho interesse em dizer que somos melhores que ninguém. Somos da social democracia, de um partido que reúne brasileiros compromissados com ideias simples e claros para assegurar a retomada do desenvolvimento.

O PSDB não tem medo de reformas. Estamos apoiando o presidente Temer nas reformas que são polêmicas no País. O partido tem tido esse equilíbrio entre o capital e o trabalho, entre o social e o econômico, entre as culturas do direito e do dever. Não temos medo de fazer ajuste fiscal e entendemos a importância de trabalhar a desigualdade social do país e acreditamos no trabalho produtivo e na negociação dos conflitos.

Não acreditamos mais que o mercado vai resolver todos os problemas do Brasil. Acreditamos na ação do Estado regulador para estimular e contribuir com o desenvolvimento. Então, essas posturas equilibradas do PSDB vão refletir no avanço de um projeto de desenvolvimento, que foi colocado em prática durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Além disso, não é à toa que a maioria dos governadores com três ou quatro mandatos seja do PSDB. Veja o governo de Marconi Perillo. Está fazendo ajuste fiscal, algo que ninguém gosta. Ninguém gosta de mandar comissionados embora, mas é preciso ter coragem para fazer. Isso é necessário para criar um Estado que sirva à população.

Elder Dias — Teremos um cenário diferente para as eleições do ano que vem, pois a Operação Lavo Jato deverá avançar mais. O sr. já prepara o partido para essas novas condições?
Um de nossos propósitos é o de organizar, internamente no PSDB, as eleições dos diretórios municipais que ocorrerão até abril em todo o Estado. Queremos fortalecer o partido em todos os municípios goianos, especialmente nos 50 maiores. Queremos que o PSDB tenha condições de ter boa chapa para deputados estaduais e federais, senadores, governador e que possa criar condições de chegarmos a 2020 com um partido oxigenado para a eleição de vereadores e prefeitos.

A aglutinação que houve em torno de meu nome — fui eleito por aclamação — possibilita que eu possa chamar todos os ex-presidentes para somarmos esforços no sentido de oxigenar o partido e fazê-lo crescer tanto quantitativa quanto qualitativamente. Vamos avançar em novas filiações nas áreas da saúde e da educação, entre pequenos e médios empresários e na área social e comunitária, além dos segmentos organizados da sociedade: mulheres, jovens e minorias. Tudo isso para mostrar que é pela política que nós podemos modificar a sociedade.

Augusto Diniz — O sr. acompanha o governo Marconi Perillo já há algum tempo. Qual será o futuro político dele?
Acho que o governador tem todas as credenciais para uma inserção nacional. Goiás precisa acabar com a timidez de ter posturas. Ele é o grande exemplo que nós temos atualmente de político que se credenciou a ser um político nacional. Não é à toa que criou um consórcio de governadores que tem projeção e credibilidade.

Augusto Diniz — Atrapalha para Marconi o fato de o PSDB nacional colocar o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (SP) para trabalhar junto aos governadores do Consórcio Brasil Central?
De maneira alguma. O PSDB tem grandes candidatos: o governador Alckmin, o presidente [do PSDB nacional] e senador Aécio Neves (MG), o governador Marconi, o ministro José Serra [Relações Exteriores] etc. Isso demonstra que nosso partido tem opções e que, no momento certo, saberá escolher o nome daquele que deverá liderar a retomada democrática da Presidência da República.

Augusto Diniz — A figura do parlamentar é uma das mais desgastadas hoje, diante da sociedade. Em sua visão, esse desgaste com a opinião pública é justo?
Nas redes sociais, as pessoas vendem o que compram sem uma análise profunda. Estou lendo o livro “Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar”, de Daniel Kahneman, em que ele coloca a questão da estatística intuitiva, o que tem muito a ver com o que se fala hoje dos parlamentares. Estatisticamente, as pessoas observam mais os parlamentares do que observam qualquer outro segmento. Então, há uma tendência a generalizar intuitivamente, sem ter uma estatística básica, dizendo que tudo é ruim vem dos parlamentares. A classe dos jornalistas e a imprensa em geral focam muito mais nossa classe do que o setor empresarial, ou da administração pública em geral.

Então, o que vejo é que transparece — no caso, de forma negativa —, em um primeiro momento, que essas atitudes negativas em relação à ética são exclusivas dos parlamentares. Mas não é assim: é algo cultural, do ponto de vista estatístico essas atitudes permeiam todos os segmentos — a começar dos mais pobres, que não têm nem caixa 1 e já praticam o caixa 2. Basta analisar todos os segmentos e profissões em geral (profissionais liberais, empresários, igrejas etc.). É preciso ter uma visão mais ampla para então emitir uma opinião.

Elder Dias — Mas não é natural que os parlamentares sejam os mais visados, já que são os representantes da sociedade?
É isso que digo, a partir do que o livro fala: em um pensamento “rápido”, o que vem à cabeça é que o parlamentar é o grande culpado; em um pensamento mais “lento”, analítico, se observa que ele nada mais é do que um segmento, um extrato representativo daquilo que é a população. Por isso o que diz esse livro é interessante por conta disso, de perceber que certas coisas chegam para que emitamos a opinião sem qualquer análise mais profunda.

Elder Dias — Mas a que conclusão o sr. chega, então?
De que a sociedade brasileira inteira é assim e os parlamentares são um extrato dela.

Elder Dias — Pensando “lento”, como o sr. ressalta, e centrando o foco na figura do parlamentar, ele realmente é aquilo que as pessoas pensam ou não?
Ele é a sociedade. Eu lhe pergunto, ao contrário: a sociedade é isso que se pensa dos parlamentares?

Euler de França Belém — Um filósofo e psiquiatra inglês, Theodore Dalrymple, que, em um livro com vários ensaios, um deles sobre a corrupção, em que compara a Itália à Inglaterra. Dalrymple diz que a burocracia honesta inglesa atrapalha a economia e que a corrupção na Itália não atrapalha o país. Já um magistrado italiano, Gherardo Colombo, que foi presidente da Suprema Corte, disse que, enquanto a Operação Mãos Limpas [ocorrida na Itália nas décadas de 1980 e 1990 e que inspirou a Lava Jato no Brasil] estava investigando apenas políticos e empresários, a população a aplaudia; quando acabou essa fase e começaram a investigar as pessoas comuns, como as que vendiam apresuntado como se fosse presunto, os italianos médios começaram a questionar a investigação, indignados.
Isso diz respeito ao que acabei de falar. Considero que os parlamentares têm seus problemas, mas que são reflexos dos mesmos problemas da sociedade em geral. Quem condena o político, muitas vezes, é o mesmo que frauda seu imposto de renda, é o profissional liberal que pede um recibo irregular, enfim, é o brasileiro. Por isso digo que a Operação Lava Jato tem um papel muito importante para passar o País a limpo. Mas tem de pegar uma “régua” daqui para frente, porque, se pegar voltada para o passado, não sobra ninguém — porque essa é a cultura brasileira.

Euler de França Belém — Na Itália, por conta da Mãos Limpas, foram destruídos o pior e o melhor da classe política. O resultado final foi o surgimento de uma figura como Silvio Berlusconi [primeiro-ministro da Itália por três vezes, entre 1994 e 2011 e envolto em acusações e condenações diversas].
O importante deste momento que vivemos é termos tido a oportunidade de ver que a Justiça — ou parcela dela — conseguiu afetar pessoas consideradas até então inatingíveis no Brasil. O que é preciso agora é modificar as leis para que quem deseje ser político não crie provas contra si mesmo. Do jeito que está hoje, qualquer político é vítima disso, cria essas provas imediatamente. Isso é ruim.

Por exemplo: criminalizamos o caixa 2 e a compra de votos. Imagine chegar ao interior de Goiás, nas próximas eleições, com essa lei. As pessoas não fazem política com dinheiro zero, é preciso pagar o cabo eleitoral, ceder a gasolina. Mas, ao passar qualquer recurso para um cabo eleitoral, isso já vai suscitar compra de votos, já vai estar sujeito a penalidades. Ou seja, vai ficar muito complicado se as leis não estiverem interagindo com nossa cultura.

Elder Dias — Não seria um erro esse enfoque a respeito da militância? Afinal, a militância não deveria ser de fato espontânea?
Não conheço um partido que tenha militância espontânea.

Elder Dias — Mas não seria, então, a hora de começar a haver esse tipo de militância? Não seria a cabeça do político que teria de mudar, com uma nova lei?
Sim, eu sou favorável a isso, para nós que temos ideais, isso é muito positivo. Mas, mesmo nos partidos que, em tese, tinham uma militância mais firme — os ideológicos ou de esquerda —, sempre houve dinheiro, direta ou diretamente, usando a estrutura estatal, por exemplo. Mas você está correto, no sentido de minorar, de reduzir o custo de uma eleição. É preciso criar oportunidades iguais para as pessoas, o dinheiro não pode ser determinante. Porque, se não for assim, só serão eleitos, sempre, os que tiverem dinheiro.