Recuo de Tarcísio resulta de conjuntura favorável a Lula; direita tem tempo pra preparar candidato
20 setembro 2025 às 21h00

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Com Jair Bolsonaro preso, o bolsonarismo terá condições de bancar um candidato da família, como o senador Flávio Bolsonaro e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, para presidente?
A prisão de Jair Bolsonaro é, claramente, um desestímulo à candidatura de um parente. Na campanha, a história da prisão, com novas informações, prejudicaria o postulante. Seria o tema dominante dos debates.
O caminho, portanto, é lançar um bolsonarista que não seja da família, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, do Republicanos e cotado para se filiar ao PL de Jair Bolsonaro.

Para cair nas graças do bolsonarismo radical — que mobiliza o eleitorado da direita nas redes sociais —, Tarcísio de Freitas radicalizou o discurso e chegou a atacar o ministro Alexandre de Moraes e o Supremo Tribunal Federal.
As diatribes recentes de Tarcísio de Freitas, que mantinha uma fachada moderada, desagradaram parte da sociedade e políticos e eleitores de centro. Tanto que, no lugar de melhorar seus índices nas pesquisas de intenção de voto, caiu e o presidente Lula da Silva, do PT, se mostra mais robustecido.
Aqueles eleitores que não são de esquerda, mas não querem saber do bolsonarismo radical, se “assustaram” com as falas de um Tarcísio de Freitas “fora da caixinha” e cara de “justiceiro do mal”.

A circulada por Brasília, com discurso de Tarcísio “Bolsonaro” — falando mais para os hermanos Carlos e Eduardo Bolsonaro e as redes sociais —, e as pesquisas de intenção de voto, indicando que pode perder para Lula da Silva, o moderado, também “assustaram” o gestor de São Paulo.
Então, como a articulação nacional, feita a partir de um discurso equivocado — radical e polarizador —, não deu certo, gerando dúvidas sobre sua moderação, Tarcísio de Freitas deu declaração de que deve ser candidato à reeleição.
Problemas pro bolsonarismo: perda de 2 países
Há dois problemas: o bolsonarismo pode perder a Presidência da República e o governo de São Paulo, o Estado mais rico e poderoso do país.

As pesquisas mostram que o prefeito de Sampa, Ricardo Nunes, tem chance de, substituindo Tarcísio de Freitas na chapa paulista, vencer o pleito para governador do Estado de São Paulo. Mas, com Lula da Silva fortalecido, a tendência é o vice-presidente Geraldo Alckmin aproximar-se do postulante emedebista, que será apoiado pelo bolsonarismo, seu diferencial.
Então, se perder o Brasil e São Paulo, o bolsonarismo perderá os dois “países” mais ricos da América do Sul (o PIB de São Paulo supera o da Argentina, o do Chile e o da Colômbia). Pode ser uma debacle para as facções bolsonaristas.
Política é conjuntura. Para operar com eficiência na conjuntura deve se escolher as táticas de primeira linha. Não se pode perder de vista a estratégia, a finalidade última, que, no caso do bolsonarismo, é a disputa da Presidência da República (o eleito, se bolsonarista, pode agir para livrar Jair Bolsonaro da cadeia).

Na conjuntura há momentos de avançar e de recuar. Tarcísio de Freitas, neste momento, recuou para, digamos assim, tentar garantir (consolidar) uma posição importante — sua reeleição em São Paulo, que é factível.
A pergunta que se deve fazer é: o recuo de Tarcísio de Freitas é definitivo ou tático? Ou seja, vai esperar as coisas esfriarem um pouco, para, reacomodadas, tomar uma posição definitiva?
A imprensa quer a explicação cabal, mas, às vezes, nem os políticos sabem quais rumos tomarão. Como ninguém é inteiramente dono de seu futuro, é preciso levar em conta o imponderável.
Entre os aliados de Gilberto Kassab, a eminência parda do governador, firma-se a, digamos, “crença” de que Tarcísio de Freitas será candidato a governador. Seria a posição dominante hoje.
Porém, entre os aliados de Jair Bolsonaro — e não exatamente do bolsonarismo, uma força (quase um movimento) relativamente autônoma e mais ligada a Carlos e Eduardo Bolsonaro — persiste outra “crença”. De que Tarcísio de Freitas será candidato a presidente. Porque é, eleitoralmente, o nome mais forte da direita e é aceitável para o Centrão (cujo faro político-eleitoral é “apurado”).

Caiado tem discurso e presença nacional
Entretanto, se a decisão de Tarcísio de Freitas for definitiva, como ficarão as direitas? Ficarão órfãs ou não?
Há, claro, Flávio Bolsonaro e Michelle Bolsonaro, o filho e a mulher de Jair Bolsonaro. Porém, parece um consenso familiar de que nenhum dos dois será candidato a presidente. Mas, se um deles disputar, não será frágil numa disputa contra Lula da Silva. Pode até não ganhar, mas fará boa figuração.
As direitas têm nomes que são, cada um a seu modo, consistentes: os governadores Ronaldo Caiado (dizem que é o preferido de Tarcísio de Freitas), de Goiás, Ratinho Júnior, do Paraná, e Romeu Zema, de Minas Gerais.
Ronaldo Caiado (União Brasil), Ratinho Júnior (PSD) e Romeu Zema (Novo) são gestores eficientes. Mas, dos três, o único que parece ter um discurso mais nacional — não provinciano — é o governador de Goiás.

A respeito do tema segurança pública, para citar um exemplo, Ronaldo Caiado é o que tem mais a dizer ao país, e a mostrar o que já está fazendo.
Diferentemente de outros políticos, no lugar de discurso — os eleitores estão cansados de panaceias e verborragia —, Ronaldo Caiado tem o quer mostrar. O crime organizado não desapareceu de Goiás, mas está contido. Porque a polícia goiana é dura e preventiva.
Em São Paulo, o delegado aposentado Ruy Ferraz Fontes, que no seu tempo enquadrou o PCC de Marcola, foi assassinado recentemente. Porque não recebia proteção alguma do governo de Tarcísio de Freitas. O promotor de justiça Lincoln Gakiya afirma: “Vivo sob decreto de morte do PCC que não tem volta”. Há uma espécie de “fatwa” laica? É o que parece.
As autoridades (as sérias) de São Paulo, por combaterem o crime organizado — o PCC é uma máfia —, estão acossadas.
Ratinho Júnior e Romeu Zema ainda não têm um discurso para o país — são por demais ligados, respectivamente, ao Paraná e Minas. Ronaldo Caiado fala mais ao país e tem mais presença nacional.
Por serem consistentes, como gestores e políticos (Romeu Zema nem tanto, porque é o rei da bola fora, sempre o primeiro a chegar atrasado), qualquer um dos três têm condições de enfrentar Lula da Silva. Mas precisam do apoio de Jair Bolsonaro (mesmo preso), do bolsonarismo e de Tarcísio de Freitas (insista-se: mais simpático a Ronaldo Caiado).
Como se disse, política é conjuntura. Portanto, a conjuntura de 2026 pode ser diferente, até muito diferente, da atual.
Enquanto se discute se o centrão fica com a direita, o mais provável, ou se vai caminhar, ainda que parcialmente, com Lula da Silva, o petista-chefe opera pacotes de “bondades” para os pobres — o que pode lhe garantir um apoio ampliado na disputa eleitoral.
A imagem de nacionalista de Lula da Silva, de que protege a soberania do país — contra o tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump —, está sendo consolidada. A direita está perdendo o discurso de defesa dos interesses nacionais. Será preciso verificar como será a lembrança disto daqui a um ano.
O fato é que um ano — menos, claro, pois o candidato da direita precisa ficar “pronto” pelo menos até agosto de 2026 — é suficiente para preparar um candidato da direita e divulgá-lo em todo o país, inclusive com a modulação do discurso nacional e dos discursos regionais (cada Estado, numa nação continental, é praticamente um país).
Então, é possível dizer que as peças estão sendo movidas, porém ainda muito lentamente. Por isso, com a mudança da conjuntura e com um candidato aceitável aos eleitores, a direita tem chance de enfrentar o favorito Lula da Silva. Do que precisa? Ter um discurso para o país, com firmeza na questão da segurança, ser diferente de Jair Bolsonaro ma non troppo e escapar de um discurso elitista. Terá de notar que, se está perdendo o centro político, Lula da Silva está em busca do povão.
