O que é preciso dizer sobre o imbróglio Vanderlan Cardoso e Maguito Vilela
18 novembro 2020 às 20h55

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Não há dúvida que o candidato do PSD exagerou na forma. Mas é preciso divulgar informações amplas e precisas sobre o postulante do MDB e abrir espaço para o vice
Os eleitores de Goiânia escolheram, no dia 15 de novembro, dois candidatos que são políticos e gestores experimentados. Decidiram que era a oportunidade de colocar numa prefeitura gigante, como a da capital — que tem 1,5 milhão de habitantes e quase 1 milhão de eleitores —, uma pessoa com experiência comprovada. Um indivíduo que, de alguma forma, seja parecido com o prefeito Iris Rezende Machado, do MDB, espécie de ícone da cidade.
No segundo turno, portanto, a disputa é entre Maguito Vilela, do MDB, e Vanderlan Cardoso, do PSD.
Mesmo internado no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, Maguito Vilela foi o mais bem votado, tendo recebido 217.194 votos (36,02%). Vanderlan Cardoso obteve 148.739 (24,67%). Entretanto, ante o número de eleitores de Goiânia, as votações não foram tão expressivas. Ainda que se tenha de considerar o gigantismo da abstenção: 298.362 (30,02%) eleitores não foram às urnas. Juntos, o emedebista e o pessedista tiveram apenas 67.571 votos a mais do que a abstenção.
Postula-se, em geral, duas coisas. Primeiro, há uma abstenção histórica. Segundo, a pandemia do novo coronavírus pode ter contribuído para que mais eleitores ficassem em suas casas, se precavendo. É possível especular que o fato atípico de um dos candidatos estar internado na UTI de um hospital, para tratamento de Covid-19, pode ter contribuído para o aumento da abstenção? Talvez sim, talvez não.

Terminado o primeiro turno, Vanderlan Cardoso continuou com sua campanha, e Maguito Vilela, com quadro agravado, segundo informação do Hospital Albert Einstein, permanece ausente. O ex-governador luta com suas energias e apoio médico pela vida. Os goianos — não apenas os goianienses — torcem por sua recuperação. Uns por apreciá-lo; todos, por humanidade. O emedebista tem um histórico meritório — foi vereador, deputado, vice-governador, governador de Goiás, senador, vice-presidente do Banco do Brasil e prefeito de Aparecida de Goiânia. Seu balanço é altamente positivo. Todos que o conhecem dizem a mesma coisa: é um diplomata nato, um político que se dá bem com políticos de todos os demais partidos. O histórico de Vanderlan Cardoso também é altamente positivo: empresário (emprega centenas de trabalhadores), ex-prefeito de Senador Canedo, foi candidato a governador e é senador destacado e respeitado em Brasília. Também dialoga com todas as forças políticas.
Num gesto intempestivo, que não é de seu feitio, Vanderlan Cardoso cobrou informações precisas sobre o quadro de saúde de Maguito Vilela. O que foi considerado chocante. Mas o problema maior talvez seja a forma e não exatamente o conteúdo.
Pode-se falar, com base em suas palavras, que Vanderlan Cardoso “desejou” a morte de Maguito Vilela? Sugerir que uma pessoa não está bem, com base em boletim oficial do próprio Hospital Albert Einstein, não é o mesmo que sustentar que a pessoa está morrendo ou pode morrer.

Porém, a forma crua de Vanderlan Cardoso, ao cobrar informações sobre o real estado de saúde de Maguito Vilela, é mesmo chocante. O candidato, que se considera amigo de Maguito Vilela, apesar de politicamente trafegarem em direções opostas, deveria ter sido mais respeitoso.
Nos países anglo-saxões, como a Inglaterra e os Estados Unidos, considera-se que a vida privada de um homem público também deve ser pública. Portanto, saber o real estado de saúde de Maguito Vilela é de interesse público. De alto interesse público. Afinal, se eleito, governará uma cidade que, como se disse acima, tem 1,5 milhão de habitantes. Todos, direta ou indiretamente, dependerão de suas ações no dia a dia. Então, não é apenas a Vanderlan Cardoso que interessa saber a respeito da saúde do emedebista. Os goianienses querem e têm o direito de obter informações sobre o postulante a prefeito. Mas claro que isto tem de ser feito com critério, respeitando tanto a ciência quanto o ser humano. Deve-se evitar, a qualquer custo, o sensacionalismo e o oportunismo político.
A questão do vice
Há um truísmo que sugere que “vice não governa”. Ora, trata-se de um engano. João “Jango” Goulart era vice de Jânio Quadros, e, com a renúncia deste, assumiu a Presidência da República, em 1961. Por incapacidade de articular, acabou derrubado por um golpe de Estado que uniu civis e militares — daí a ditadura ser civil-militar. Pode-se sugerir que a noite cinza de 21 anos, entre 1964 e 1985, começou com um vice inadequado.
Em 1985, em seguida à longa noite ditatorial, o civil Tancredo Neves foi eleito presidente da República. Acabou morrendo e José Sarney, o vice, tomou posse. Por ter apoiado a ditadura, durante 21 anos, era quase um general sem farda. Não fez um grande governo, mas pelo menos se conduziu de maneira democrática. Tancredo Neves, um político mais moderno, teria, por certo, sido um presidente mais adequado aos novos tempos.
Em 1992, com a queda do presidente Fernando Collor, assumiu o vice Itamar Franco. Desta vez, com uma assessoria de primeira linha, como Fernando Henrique Cardoso, Pedro Malan e Edmar Bacha, o vice funcionou bem. No governo do político de Minas Gerais, deu-se a formulação do Plano Real, que, finalmente, estabilizou a economia e contribuiu, de maneira decisiva, para elevar o crescimento econômico e o desenvolvimento nos anos posteriores.
Mais recentemente, com o impeachment da presidente Dilma Rousseff, do PT, o vice-presidente Michel Temer assumiu e colaborou para estabilizar o país. Um dos motivos é que nomeou, de cara, o engenheiro goiano Henrique Meirelles para o Ministério da Fazenda. Porém, no campo da probidade, não há, a se aceitar as denúncias do Ministério Público Federal, como enaltecer o ex-líder emedebista.
O que se está dizendo é que, embora não pareça, o vice é crucial. Portanto, precisa ser mostrado para a população.
O vice de Vanderlan Cardoso é o engenheiro e empresário da construção civil Wilder Morais, do PSC. Ele foi senador, ocupando a vaga que era de Demóstenes Torres. Antes de ser vice do pessedista, era pré-candidato a prefeito. Tem aparecido na campanha? Muito pouco. Até por ser gestor e ter experiência política, deveria ser mais exibido. Porém, como Vanderlan Cardoso está na ativa, com seus 58 anos de idade, seu vice fica na sombra. Não deveria.
O vice de Maguito Vilela é o vereador Rogério Cruz, do partido Republicanos e pastor da Igreja Universal (cujo principal dirigente tem ligação com a TV Record). Não se destacou como vereador, tanto que a cúpula do partido (a parte ligada à igreja), mesmo antes de ser indicado para vice, já havia decidido que não seria candidato à reeleição, indicando outro postulante, por sinal o mais bem votado. Não se trata de depreciá-lo, até porque suas atividades são pouco conhecidas.
Entretanto, se Maguito Vilela está ausente, é mesmo preciso colocar Rogério Cruz na ribalta. Se Maguito Vilela for eleito, Rogério Cruz certamente assumirá o governo, ao menos durante algum tempo, o de convalescença do emedebista. Então, os eleitores merecem saber quem é o vice e quais são suas ideias sobre saúde, educação, transporte coletivo e organização do espaço urbano.
Daniel Vilela, por ser filho e presidente do MDB, pode falar pelo pai e aliado. Mas nem ele nem o prefeito de Aparecida de Goiânia, Gustavo Mendanha, do MDB, podem substituir Rogério Cruz, apagando-o do imaginário popular e das notícias de jornais e emissoras de rádio e televisão.
A aliança MDB-Republicanos não deve tratar o vice Rogério Cruz como uma presença-ausência, como um aliado pro forma. Não deve escondê-lo. Nos debates e entrevistas em jornais e emissoras de rádio e televisão, para permitir que os eleitores o avaliem, quem deve falar em nome de Maguito Vilela, como parceiro de chapa, é o vereador Rogério Cruz.
Postas as questões, para além do emocionalismo, que atinge até o jornalismo — que precisa ser mais objetivo —, é mesmo preciso dizer que o senador Vanderlan Cardoso, político e empresário, deve ter mais cuidado com as palavras. Assim como os fatos sobre os homens públicos devem ser transparentes para os habitantes (e não só os eleitores) de sua cidade.
Resta, por fim, cobrar uma campanha crítica mas pacífica. Mas sem a omissão de fatos verdadeiros.