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Se a invasão da Ucrânia não afetar a conjuntura internacional por muito tempo, o Brasil pode crescer acima de 1%, superando as expectativas dos economistas

A economia do Brasil parece que é mais sólida do que imaginam alguns especialistas. Há quem subestime o crescimento de 4,6% do PIB em 2021, apontando que se compensou as perdas de 2020, provocadas pela pandemia da Covid-19. Mesmo assim, o fato é que, com ou sem “intempéries” econômicas internas ou externas, o país cresceu, e de maneira sólida. As perspectivas para 2022, anunciam economistas e consultores de bancos, não são tão boas. O governo postula um crescimento de 1% — há até quem fale em 2%. No entanto, a maioria menciona um crescimento de 0,6% ou 0,3% — há quem fale em não-crescimento. O mais provável é que, se a crise Rússia-Ucrânia não durar muito, o crescimento surpreenda e o país talvez cresça por volta de 1%, que é melhor do que nada. (Vale apresentar uma análise do economista Roberto Macedo, publicada no “Estadão”: “O IBGE anunciou que, entre 2020 e 2021, o PIB cresceu 4,6%, o que dá uma visão enganosa da variação do PIB dentro de 2021, que foi de apenas 1,3%. O resultado — 4,5% — veio mais do buraco de 2020 do que do desempenho no ano passado”. Ainda assim, houve, mesmo, uma recuperação — que, a rigor, é o que importa.)

Por vezes, quando se fala em PIB, fica-se com a impressão de que o crescimento depende quase que inteiramente do governo federal. De fato, em grande parte depende. Se o governo for mal, por exemplo no controle do teto de gastos, contribui para o descrédito do país ante o mercado, o que leva à redução dos investimentos. Porém, se o governo for bem, ou medianamente bem, a economia tende a estabilizar e a, progressivamente, crescer. Mas, no geral, o crescimento depende basicamente do funcionamento dos vários setores da economia, como a agropecuária, a indústria e os serviços. Com uma economia estável, os serviços (peso maior na formatação do PIB), para citar um exemplo, se expandem e tendem a puxar a economia para cima.

A agropecuária é importante para a retomada do crescimento | Foto: Reprodução

A jornalista Miriam Leitão publicou um artigo, “PIB volta ao tombo puxado por investimento, mas cenário de 2022 continua fraco” (sexta-feira, 4), que é mais otimista do que o título sugere. Citando economistas, afirma-se que o “PIB deve voltar a crescer entre zero e 1% este ano”.

Miriam Leitão aponta uma boa notícia a respeito do PIB de 2021: “A taxa de investimento chegou a 19,2% do PIB, o maior percentual desde 2014. Isso aconteceu porque a taxa de poupança também subiu, para 17,4%, e permitiu o financiamento dos investimentos. E mais investimento sempre aponta para crescimento futuro”. Ou seja, o crescimento de 2022 poderá acabar surpreendendo, se a crise europeia, provocada pela guerra na Ucrânia, não durar muito tempo. Porém, a jornalista ressalva que, com juros altos — para conter a inflação —, a economia pode retrair.

A comentarista econômica aponta outro dado relevante: “O PIB do quarto trimestre subiu 0,5%, acima das projeções do mercado, em torno de 0,2%”.  Já, para 2022, há uma expectativa de crescimento de 0,3%, mas os dados atuais sugerem a possiblidade de 0,6%. Miriam Leitão está tratando, agora, da conexão do crescimento de 2021 com o de 2022.

Retomando 2021, a analista econômica sublinha que “a surpresa veio nos serviços, que o mercado apostava em queda, mas veio com alta de 0,5%, e no consumo das famílias, que saltou 1,5%”. Voltando a 2022: se a pandemia arrefecer ainda mais, os serviços tendem a alavancar o crescimento, levando, quem sabe, a uma expansão de ao menos 1%. Quando os serviços sobem há uma tendência de puxar outros setores, inclusive elevando o consumo.

Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia): a indústria é vital para o crescimento econômico

Por mais que o presidente Jair Bolsonaro seja errático, o ministro da Economia, Paulo Guedes, é um fator de estabilidade — o que gera certa confiança no mercado. O Posto Ipiranga controlou, até certo ponto, o teto de gastos. Porém, em ano eleitoral, com o Centrão (leia-se o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira) dominando o palco, o teto de gastos certamente não será respeitado, o que pode desestimular investimentos, pois o mercado tende a perceber que, sem respeitar as regras pactuadas, o país se tornará instável.

Sendo assim, o que fazer para tentar elevar o crescimento em 2022? A conjuntura externa pode ser uma pedra no caminho do Brasil. O preço do petróleo, por exemplo, pode subir ainda mais, o que contribuirá para certa instabilidade, inclusive política. E há a questão da dificuldade de comprar produtos, como fertilizantes da Rússia.

Paulo Guedes postula que, se o Brasil se apresentar — e conseguir provar que é — como um porto seguro para investimentos privados (dada a instabilidade europeia), atraindo fartos recursos no mercado, a possibilidade de crescimento pode ser ainda maior. Na equipe de Paulo Guedes há quem fale em crescimento de 2,1% em 2022. Um dado francamente contrário e acima do apresentado pelo mercado (0,3% ou, no máximo, 0,6%).

Para atrair investimentos, será preciso, avaliam Paulo Guedes e sua equipe, “manter a agenda de reformas” (o projeto de lei do Novo Marco de Garantias para crédito, a medida provisória de registros públicos e o projeto de debêntures incentivadas). “Seria importante também obter a aprovação legislativa para a privatização dos Correios e realizar a privatização da Eletrobrás ainda no primeiro semestre”, afirma o Ministério da Economia. “Por isso a importância do ministro Paulo Guedes ter ido aos Estados Unidos mostrar ao mundo que neste momento o Brasil é um porto seguro para o investimento internacional”, afirma o chefe da Assessoria Especial de Assuntos Estratégicos do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida.

Qual o drummond no meio do caminho? Simples: as eleições presidenciais de 2 de outubro. Medidas duras, que provoquem grande discussão na sociedade, como as privatizações — Correios e Eletrobrás —, podem não sair do papel. O Centrão certamente só deixará passar aquilo que não atrapalhe a campanha eleitoral de Jair Bolsonaro, que está em segundo lugar nas pesquisas eleitorais, mas com perspectiva de crescimento — agora que Lula da Silva parece ter atingido seu teto (na faixa de 40%). Há o risco de gastança, com a quebra do teto de gastos, que, se pode ajudar a viabilizar a campanha de reeleição, tende a prejudicar a economia. A elevação de Bolsonaro nas pesquisas de intenção de gastos, se às custas de gastança indiscriminada (e não se está falando dos programas sociais, que são necessários), pode resultar em menos crescimento. Mas um crescimento sustentável da economia, tendo como base a recuperação efetiva da maioria dos setores, como a agropecuária, pode ajudar o presidente.

O Ministério da Economia diz que, como as taxas de emprego retomaram as médias históricas e há a possibilidade de se atrair novos investimentos privados, a expectativa de um crescimento maior para 2022 não é irrealista. “Ademais, os dados do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) indicam que deverão ser investidos cerca de 78 bilhões de reais neste ano”, diz nota técnica do Ministério da Economia.

A economia gigante do Brasil, com tantos empreendedores dedicados e com a possibilidade de chegar maciços investimentos externos, pode surpreender os economistas e os pessimistas. Se a conjuntura interna não afetar estruturalmente o Brasil, é possível que o ano de 2022 seja melhor do que aquilo que se está projetando nas previsões. Agora, se o país não crescer, do ponto de vista eleitoral será positivo para Lula da Silva e ruim para Bolsonaro. Mas será ruim mesmo é para todos os brasileiros, notadamente para as classes médias e os pobres. Portanto, é melhor torcer, ainda que de maneira racional, para que o país cresça, e de maneira estável, neste ano.