A política clama por homens públicos — como Lissauer Vieira — com espírito de estadista

13 março 2022 às 00h00

COMPARTILHAR
O presidente da Assembleia Legislativa de Goiás sugere que prefere se transferir para o TCE. Se isto acontecer, é uma perda para a política do Estado
Os eleitores clamam por políticos com cariz de estadistas no Brasil. O jornalista e economista Herbert de Moraes Ribeiro, um leitor de Kant, Max Weber e Hannah Arendt, costumava dizer que, na busca da imposição de uma moralidade exemplar, era preciso preservar os bons políticos — aqueles que tinham de fato uma visão de Estado e da defesa da sociedade e dos indivíduos. Várias vezes, nas reuniões com jornalistas, advertia que não se deveria “destruir” os homens públicos de valor real. Insistia também que o jornalismo tem de ficar ao lado dos que, acima de tudo, defendem os interesses de Goiás, e não de lobistas profissionais e grupos empresariais que, se os governantes abrirem brechas, “privatizam” o Estado.
Em Goiás há políticos que merecem ser chamados de estadistas (e alguns nem precisaram ser administradores públicos). Entre eles estão Leopoldo de Bulhões (um dos primeiros a trabalhar pelo ajustamento da economia brasileira, no início do século 20), Pedro Ludovico Teixeira, Domingos Vellasco, Emival Caiado, Mauro Borges, Otávio Lage, Leonino Caiado, Irapuan Costa Júnior, Henrique Santillo, Fernando Cunha, Iris Rezende, Maguito Vilela, Paulo Roberto Cunha, Paulo Campos, Adib Elias, Lúcia Vânia, Nion Albernaz, Ronaldo Caiado, Jânio Darrot, Vilmar Rocha e Henrique Meirelles. Há outros, claro, mas os citados são figuras emblemáticas. Do grupo estão vivos Leonino, Vilmar Rocha, Henrique Meirelles, Jânio Darrot, Lúcia Vânia, Irapuan Costa Junior, Adib Elias e Ronaldo Caiado. Este é o atual governador de Goiás, eleito, em 2028, no primeiro turno.
Hoje, Ronaldo Caiado é o maior nome da política de Goiás. Além de gestor eficiente, conseguiu desalojar do poder um grupo que controlava a política do Estado havia 20 anos. Liderado pelo ex-governador Marconi Perillo, o grupo era considerado invencível. Mas o chamado Tempo Novo não se renovou, se tornou “velho” no poder — perdeu o “pulso” (contato) com a sociedade real — e acabou derrotado na disputa de 2018, há pouco mais de três anos.
As pesquisas de intenção de voto sugerem que Ronaldo Caiado deve ser reeleito na disputa deste ano. Se eleito, concluirá o mandato em 2026. A tendência é que, ao deixar o governo, dispute mandato de senador (duas vagas estão em jogo). Seu vice, Daniela Vilela (MDB), assumindo o governo, será candidato a governador.
Porém, em 2030, se tiver sido eleito em 2026, Daniel Vilela não poderá ser candidato a governador — então o quadro político ficará inteiramente aberto para os políticos que vão disputar duas eleições estaduais que ocorrerão entre 2022 e 2026. (Frise-se que Marconi Perillo também estará no jogo da disputa governamental em 2026 ou 2030. Daqui a quatro anos, terá apenas 63 anos.)
O espaço em política não fica aberto — ou pelo menos não fica vazio — por muito tempo. Portanto, aqueles que colocarem seus blocos nas ruas, nas três eleições (2022, 2026 e 2030, e três pleitos nunca estiveram tão conectados na história de Goiás) — para ganhar ou mesmo marcar posição —, terão mais chances de disputar o governo e o Senado numa delas. Há quem estranhe a perseverança do ex-ministro Alexandre Baldy, do partido Progressistas, e dos deputados federais Delegado Waldir Soares, do União Brasil, e João Campos, do Republicanos, ao sustentarem, o tempo todo, que vão disputar mandato de senador. O que explica a firmeza de propósitos? Que eles estão se colocando tanto para o presente — porque o mundo nunca está inteiramente “construído”, está sempre sendo “edificado” — quanto para o futuro. Estão dizendo aos eleitores: “Estamos vivos” e “fiquem de olho em nós”. Na prática, estão correndo riscos, o que é seminal em política.

A seguir, em ordem estritamente alfabética, alguns nomes que estão no páreo para voos mais altos para os pleitos de 2022, 2026 e 2030 (e há o pleito intermédio de 2024, quando estará em jogo as prefeituras, como as de Goiânia, Aparecida de Goiânia, Anápolis, Rio Verde e Luziânia): Adriana Accorsi, Alexandre Baldy, Antônio Gomide, Bruno Peixoto, Daniel Vilela, Delegado Waldir, Diego Sorgatto, Flávia Morais, Francisco Júnior, Gustavo Mendanha, Henrique César, Ismael Alexandrino, Issy Quinan, João Campos, Lissauer Vieira, Lucas Vergílio, Major Vitor Hugo, Márcio Corrêa, Marcos Cabral, Marden Júnior, Pábio Mossoró, Pedro Sales, Renato de Castro, Roberto Naves, Romário Policarpo, Sabrina Garcêz, Vanuza Valadares e Virmondes Cruvinel. Há outros, mas os citados são representativos.
Dependendo da reconfiguração do quadro político, um deles — ou alguns deles — vai ocupar a cena com destaque. Para governador ou senador.
O caso Lissauer Vieira
Às vezes o imponderável surge no meio do caminho, como uma espécie de drummond — uma pedra incontornável —, e muda os fados. O presidente da Assembleia Legislativa, Lissauer Vieira (PSB), até pouco tempo era um político circunscrito a Rio Verde. Mas soube aproveitar a oportunidade e provou que o Legislativo pode ser forte, autônomo, sem ser radical e pirotécnico. O orçamento impositivo, uma das conquistas, deu força para os deputados em suas conexões no interior.
Então, de uma hora para a outra, o deputado de Rio Verde, que parecia um jovem provinciano — ele tem apenas 41 anos —, tornou-se um gestor eficiente do Poder Legislativo e, sobretudo, soube fortalecê-lo. Não se agachou ante o Executivo, nem, por outro lado, radicalizou as ações da Assembleia. Pelo contrário, na sua gestão, houve e ainda há equilíbrio e profundo respeito entre os dois gestores, Ronaldo Caiado e Lissauer Vieira.
Pode-se dizer que, ao mesmo tempo, se tornou um político cosmopolita, “emancipando-se” de uma mentalidade meramente municipal, se se pode dizer assim, e com um perfil de estadista, que, se deixar a política agora, não terá como consolidar.
De repente, a notícia explosiva, e tão incômoda para tantos políticos — entre eles deputados e prefeitos — que acreditavam em seu projeto de disputar mandato de deputado federal: Lissauer Vieira, um jovem, decidiu encerrar a carreira política para se tornar conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE). A pergunta de 100 milhões de grívnias (ou hryvnias) já foi respondida pelo deputado, mas talvez não seja a que seus aliados esperam. Porém, como é de foro pessoal, íntimo, provavelmente não merece questionamento. O que se dirá adiante é mais uma simples discussão do que está acontecendo.
O conselheiro Sebastião Tejota, do TCE, quer voltar à política e, por isso, quer enviar seu filho, o vice-governador Lincoln Tejota, de apenas 38 anos, para o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Para o lugar de Tejotão iria ou irá Lissauer Vieira. Trata-se de uma bomba que não caiu do céu, e sim de uma bomba que saiu da terra e a implodiu. Um terremoto.
Sabe-se, de Luziânia, no Entorno de Brasília, a Porangatu, no Norte de Goiás, que Lissauer Vieira havia montado uma ampla estrutura para ser candidato a deputado federal. Tinha, inclusive, o apoio do pré-candidato a senador pelo PSD, Henrique Meirelles, de vários prefeitos e deputados estaduais. Todos aqueles que lidam com política e pesquisas eleitorais admitem que era um dos favoritos. Comenta-se, até, que seria um dos campeões de voto, ao lado, possivelmente, de Flávia Morais (PDT) e Zacharias Calil (União Brasil).

Porém, Lissauer Vieira diz que não vai disputar mandato de deputado federal, mas, se confirmado no TCE, agora ou em dezembro, afirma que continuará na vida pública. Sim, porque o TCE e o TCM são instituições públicas respeitáveis e, como tal, merecem o respeito dos políticos e da sociedade. Não é republicano deputados pressionarem conselheiro a se aposentar com ameaças de que vai trabalhar, via projeto, por sua extinção. O TCM é o mais “ameaçado”. Mas pergunte aos prefeitos se querem seu fim. Não querem. Porque o TCM hoje é muito menos punitivo e muito mais orientador do que se deve fazer nas prefeituras. Noutras palavras, é útil, e até fundamental, para a lisura nas prefeituras — e, como se sabe, a vida começa nos municípios (o Estado em si é quase uma figura abstrata). Sob a gestão de Joaquim de Castro, um ex-deputado e ex-prefeito experimentado, o TCM de Goiás tem merecido reconhecimento nacional. Só não percebe o fato aquele que se esmera em ser nefelibata.
A morte recente do pai mexeu, de maneira indelével, com as emoções de Lissauer Vieira. O abalo se deu de duas formas. Primeiro, porque amava o pai, era sua referência. Segundo, porque sua ausência — ainda que a referência, como guia, permaneça — levou-o a mudar os planos. A família tem fazendas e é produtora rural, na região de Rio Verde, no Sudoeste goiano.
A produção rural exige uma presença constante, num mercado tão instável quanto o brasileiro, para que os negócios não desandem? Talvez sim. Sem querer questionar a decisão de Lissauer Vieira, por ser de foro íntimo, vale o registro de que o deputado federal José Mário Schreiner, conhecido como Zé Mário, arrenda terras, pois é produtor rural (de soja) e é presidente da Federação da Agricultura do Estado de Goiás.

Para os amigos e aliados, Lissauer Vieira sugeriu que, se for eleito deputado federal, teria de se mudar para Brasília, e ficaria distante dos negócios da família, que agora terá de acompanhar mais de perto, e de maneira presencial. Ficando no TCE, teria mais tempo para cuidar dos próprios negócios. Sem querer afrontar o parlamentar, vale informar que um deputado federal fica em Brasília, no geral, de terça-feira a quinta-feira — basicamente três dias. Nos demais dias, domingo, segunda, sexta-feira e sábado, podem dar assistência às suas bases eleitorais e, ao mesmo tempo, aos negócios privados. No TCE, o expediente é de segunda a sexta-feira, ou seja, cinco dias — com folga apenas no sábado e no domingo. Vale acrescentar que Brasília está incrustada em solo goiano e, a rigor, não fica tão distante de Rio Verde, município onde está instalada a família do deputado. Um deputado federal disse ao Jornal Opção: “Há vários deputados que são produtores rurais em Estados que ficam bem mais longe de Brasília. O que fizeram, não sei. Talvez tenham colocado um executivo no comando dos negócios”.
A rigor, o Jornal Opção não quer discutir nem condenar a decisão de foro íntimo de Lissauer Vieira. Pelo contrário, respeita-a. E, se for para o TCE, vai engrandecer o tribunal, uma instituição, insistamos, respeitável.
O que o Jornal Opção está querendo dizer, quiçá de maneira enviesada, em zigue-zague, é que, sendo Lissauer Vieira um bom valor, uma descoberta recente e positiva, sua “aposentadoria” não é benéfica para o Estado, para os goianos e talvez nem para si (vai pairar, para sempre, a “sombra” do que poderia ter sido na política do Estado que escolheu para empreender e fazer política). O deputado é agregador e é dotado de grande equilíbrio. Como tem apenas 41 anos, poderia ser deputado entre 2023 e 2026, e depois alçar votos políticos mais altos. Espaço há, e, sabendo aproveitá-lo, se poderá ir longe, muito longe. Não deixa de ser triste que um excelente “jogador” esteja “enterrando” a própria carreira política, sem que nenhum obstáculo — pequeno, médio ou grande — fosse colocado à sua frente. É lamentável e melancólico.
Há tempo para repensar, para voltar a ser candidato? Há, claro. Se alguém perguntar aos deputados e aos prefeitos, além de vários outros aliados, todo dirão a mesma coisa: “Fica, Lissauer Vieira”. Se não retornar, Goiás perderá um político jovem que caminhava para se tornar um estadista.
Recentemente, durante a luta pela aprovação do plano de recuperação fiscal do governo de Goiás (já aprovado pelo governo federal), Lissauer Vieira operou, como estadista, convencendo os deputados, inclusive os de oposição, que estavam aprovando não o governo de Ronaldo Caiado, e sim um projeto de viabilização presente e futura de Goiás. Sua serenidade, simplicidade, capacidade de convencer e credibilidade foram fundamentais para os três anos e dois meses do governo do líder do partido Democratas.