Setor supermercadista em Goiás resiste a impactos enfrentados por redes internacionais

24 junho 2025 às 16h23

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Apesar dos sinais de retração em países da Europa e nos Estados Unidos, o setor supermercadista em Goiás segue resistente, sem registrar os impactos negativos como fechamento em massa de lojas ou demissões. A avaliação é do superintendente da Associação Goiana de Supermercados (Agos), Augusto de Araújo Almeida.
“Esses efeitos que têm afetado o varejo alimentar na Europa e nos Estados Unidos ainda não chegaram aqui. Em Goiás, não estamos sentindo isso de forma significativa”, afirmou Augusto. “Tivemos casos isolados, como o Super Barão, que chegou a ocupar o 89º lugar no ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), mas que enfrentou dificuldades por vários fatores.”
Segundo ele, o cenário goiano é marcado pela pulverização e regionalização do setor, o que o torna menos vulnerável a grandes oscilações. “Temos redes fortes em regiões como Rio Verde, Catalão, Itumbiara e no entorno do Distrito Federal. A estrutura é muito desconcentrada. No Brasil, cerca de 1.200 empresas são responsáveis por 25% do mercado. No Chile, por exemplo, três empresas concentram 78%”, comparou.
Conforme dados citados pelo superintendente, Goiás possui hoje cerca de 13.728 empresas registradas com CNAEs ligados ao varejo alimentar, um número que teve leve crescimento em relação ao ano anterior, com aproximadamente 700 novas lojas abertas.
Augusto também destacou que o setor supermercadista continua atraindo consumidores diariamente. “Em Goiás, aproximadamente 1 milhão de pessoas entram em supermercados todos os dias. Acho que só as escolas recebem mais gente diariamente do que os supermercados”, disse.
No entanto, o segmento opera com margens cada vez mais apertadas. “A inflação tem exigido criatividade dos supermercadistas. Muitos estão reduzindo margens em determinados produtos para manter os consumidores. Talvez essa operação com margens negativas tenha contribuído para a crise do Super Barão”, avaliou.
Apesar da resiliência, ele reconhece mudanças no comportamento do consumidor. “A gente percebe que o consumidor tem trocado produtos da linha A pôr itens mais acessíveis. Mas o supermercado, por essência, precisa atender todos os públicos – desde quem busca economia até quem quer produtos premium.”
Sobre as compras online, o crescimento tem sido tímido, mas relevante. “Hoje, nenhum supermercado pode operar sem essa opção. Mas o consumidor goiano ainda valoriza muito a experiência de ir à loja, tocar os produtos, fazer escolhas”, comentou.
A concorrência com grandes redes também tem moldado o setor. “As redes de atacarejo atraem muita gente pelo preço. Em resposta, os supermercados de bairro investem em diferenciais como atendimento personalizado, cortes especiais no açougue e serviços de entrega. Eles entendem os hábitos da vizinhança”, afirmou.
Em relação à tendência observada em mercados internacionais, como o fechamento de grandes lojas e o surgimento de unidades menores de vizinhança, Augusto vê movimentos semelhantes em São Paulo, mas ainda incipientes em Goiás. “Tem rede grande que está reduzindo o tamanho das lojas para se aproximar do cliente. O Carrefour, por exemplo, tem investido nas unidades de bairro”, observou.

Para ele, o Brasil possui características que ajudam a proteger o mercado local. “Somos um país de empreendedores. Enquanto na Europa as grandes redes não vão para os bairros, aqui há quem abra uma vendinha na garagem. Isso pulveriza o mercado e reduz os impactos em caso de falência de uma grande empresa”, afirmou.
Augusto ressalta, no entanto, que o setor está atento às mudanças. “Já acendemos uma luz amarela. O contexto aqui é diferente, mas estamos vigilantes. Ao mesmo tempo, vemos exemplos contrários, como o Trader Joe’s – rede estadunidense de supermercados, que é uma rede grande com cara de pequena, oferecendo atendimento mais acolhedor e layout de feira.”
Segundo ele, o comportamento do consumidor está mudando, e o setor acompanha essa transformação. “O mundo está mudando, e os hábitos de consumo também. Mas o brasileiro gosta de gente, gosta de se relacionar. O supermercado aqui ainda é um ponto de encontro, quase como um shopping”, concluiu.
Reestruturação global: grandes redes de supermercados enfrentam fechamentos
A instabilidade econômica global e a mudança nos hábitos de consumo têm forçado grandes redes de supermercados a promover reestruturações profundas em diversos países, inclusive no Brasil. O cenário inclui o fechamento de lojas, cortes de pessoal e a adoção de modelos de negócios mais enxutos.
Em 2025, esse movimento ganhou força especialmente na Europa e nos Estados Unidos. Na Espanha, a tradicional rede Alcampo, do grupo francês Auchan, anunciou o encerramento de 25 unidades e a redução de espaço físico em 15 hipermercados. A medida deve afetar cerca de 710 funcionários — aproximadamente 3% do quadro da empresa no país — e visa adequar a operação ao novo comportamento dos consumidores, que têm priorizado conveniência, digitalização e formatos de lojas menores.
No Brasil, o cenário também é de retração. A rede Dia comunicou o fechamento de 343 lojas e três centros de distribuição, com foco em concentrar suas atividades no estado de São Paulo. Em Goiás, o Grupo Super Barão, voltado ao atendimento de bairros periféricos e consumidores de menor poder aquisitivo, entrou com pedido de recuperação judicial e já fechou ao menos três grandes unidades.
A transformação do varejo alimentar tem como pano de fundo fatores como inflação, queda no poder de compra, elevação dos custos operacionais e o avanço das compras online. Tradicionalmente associadas à estabilidade, grandes redes como Walmart também têm encerrado operações em diversas regiões do mundo, em resposta à pressão por eficiência e competitividade.

Além da reorganização física das lojas, as empresas vêm investindo em canais digitais e na modernização das unidades restantes. O desafio, entretanto, envolve a gestão integrada de múltiplos canais, qualificação das equipes e a necessidade constante de inovação.
Especialistas apontam que o setor seguirá em transformação nos próximos anos. A tendência é de mais investimentos em tecnologia, diversificação de formatos — com foco em lojas de bairro e híbridas — e estratégias que conciliem redução de custos com melhor experiência de compra.
A crise, porém, não atinge apenas grandes grupos. Pequenos negócios com modelos comunitários ou mais sociais têm enfrentado dificuldades semelhantes, principalmente por falta de acesso a crédito, aumento dos custos e concorrência acirrada com plataformas virtuais.
Com margens de lucro cada vez mais comprimidas, o varejo alimentar global precisa equilibrar sustentabilidade financeira e adaptação ao novo perfil do consumidor — mais exigente, conectado e atento à praticidade.
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