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A Reuters Institute e a Universidade de Oxfor recentemente divulgaram os resultados do maior levantamento já feito sobre comportamento dos consumidores de notícias em ambiente digital. Ao longo de 2024 e 2025, os pesquisadores associados em 24 países aplicaram questionários para identificar em quais divulgadores de notícias os leitores mais prestam atenção, e como as redes sociais e de vídeos impactam a distribuição de informação.

Usuários do Facebook, X, YouTube, Instagram, Snapchat ou TikTok foram questionados sobre as fontes de informação que eles mais consultavam, e quais jornalistas e personalidades mais acompanham para se informar. Analisaram ainda a natureza do trabalho dos jornalistas, celebridades ou influenciadores (classificados entre ‘comentário’, ‘investigação’, ‘explicação’ e ‘especialidades’). O cruzamento dos dados levou a grandes conclusões, e a um raio-x do consumo de jornalismo nos países — o Brasil incluído.

Conclusões gerais

O fato pode já ter sido pressentido tacitamente pelo leitor, mas agora há dados concretos para afirmar: o Brasil dá mais atenção aos influenciadores do que à imprensa. Neste quesito, o Brasil está ao lado de países como Indonésia, Tailândia, Quênia, Índia e África do Sul; e mais distante daqueles onde o jornalismo tradicional tem mais atenção, como México, Colômbia, Argentina, Austrália, Espanha, Canadá e França.

É ainda curioso notar como países mais ricos (Japão, Alemanha, Países Baixos, Reino Unido, Noruega, Tchéquia) prestam menos atenção às notícias do que os países em desenvolvimento, como Filipinas, África do Sul, Nigéria e Brasil. Talvez, a relevância das atualidades na vida cotidiana seja maior em locais marcados por conflitos; enquanto os mais ricos podem se dar ao luxo de descartar o consumo de notícias sem tantas consequências práticas. 

No Brasil, criadores individuais despontam em relação às empresas de jornalismo já estabelecidas. Esta afirmação é diferente da anterior, pois, mesmo jornalistas são maiores do que suas empresas no Brasil. É o caso de William Bonner, César Tralli, José Luiz Datena, Leo Dias, Luís Ernesto Lacombe, Alexandre Garcia e Luiz Bacci — todos mais acompanhados nas redes sociais do que suas empresas. Neste quesito, o Brasil surge ao lado de países como os Estados Unidos, onde poucos criadores de conteúdo, como Joe Rogan, concentram grande parte das audiências. 

Alguns achados servem para todos os países: os países de língua inglesa consomem o conteúdo jornalístico produzido em outros países de língua inglesa. Joe Rogan, Tucker Carlson, e Ben Shapiro são grandes entre todos os anglófonos. Em todos os países, os grandes criadores de notícias tendem a ser homens — no Brasil, 13 dos 15 maiores influenciadores noticiosos são homens. 

O YouTube é a plataforma mais importante para criadores de notícias. Embora o Facebook continue sendo uma plataforma importante de forma geral, são as plataformas de vídeo como o YouTube que tendem a ser os espaços mais importantes para os criadores. O YouTube, o TikTok e o Instagram são frequentemente preferidos por criadores que explicam ou simplificam as notícias, embora isso seja em grande parte uma função do público mais jovem para esse tipo de conteúdo. 

O X é particularmente importante nos Estados Unidos, África do Sul, Nigéria e Japão, e ainda é a principal plataforma para acompanhar políticos. O Instagram é amplamente utilizado para conteúdo político no Brasil e na Indonésia, e também é muito popular na Índia. Frequentemente, é a rede social preferida para conteúdo de estilo de vida e entretenimento, juntamente com o YouTube.

Entendendo a mídia digital no Brasil

“Criadores de notícias e influenciadores desempenham um papel muito maior no Brasil do que na maioria dos outros países analisados no estudo”, se lê no relatório. A Reuters aponta como excêntricos alguns fatos já naturalizados pelas audiências brasileiras, como “Os políticos têm um grande número de seguidores” e “O Instagram é muito mais importante para notícias do que em outros países”. Também chamou a atenção dos pesquisadores o fato de que o Brasil é onde foi encontrado o maior número de seguidores, tanto para conteúdo político quanto de entretenimento.

O país tem a tendência de misturar os gêneros noticiosos e de entretenimento. A presença da influenciadora de lifestyle Virgínia Fonseca na CPI das Bets atraiu atenção para suas redes, que, monetizadas, se tornam o meio e o fim da informação. Em outro exemplo, Leo Dias produz no gênero textual do ‘Infotenimento’: entrevista políticos de esquerda e direita sobre assuntos de interesse público, mas com a forma própria do entretenimento. 

No relatório se lê: “Tanto o atual presidente (Lula da Silva) quanto o ex-presidente (Jair Bolsonaro) possuem grande número de seguidores em plataformas de mídia social, que utilizam regularmente para mobilizar sua base política. Eles são cercados por um grande número de criadores de conteúdo ativistas (em sua maioria homens) com visões controversas, como Nikolas Ferreira, um jovem deputado que se descreve como um “cristão de direita, que entende de armas e defende a família”. Outras figuras de direita, como Augusto Nunes, Bárbara (Te Atualizei) Destefani e Gustavo Gayer, utilizam o Instagram para alcançar um público maior e o YouTube para monólogos, entrevistas e transmissões ao vivo; alguns também têm parcerias com rádio/TV ou podcasts.”

O relatório revela que há pouco diálogo entre esquerda e direita (Léo Dias é a única personalidade a transitar bem entre os campos). O público da esquerda é capaz de citar menos jornalistas do que a direita, com celebridades, políticos e influenciadores assumindo o protagonismo — Jones Manoel, Erika Hilton e Galãs Feios sendo alguns dos principais divulgadores de notícias. “O tamanho da amostra brasileira nos permite examinar as divisões partidárias e, assim como nos Estados Unidos, constatamos que o público das redes sociais está amplamente dividido por linhas ideológicas. Os respondentes de esquerda tendem a seguir apresentadores de canais de notícias da Globo, como William Bonner e César Tralli, bem como comentaristas da CNN. […] O público de direita é mais propenso a citar influenciadores de notícias do que o público de esquerda.”

O estudo foi coordenado no Brasil pelo jornalista Rodrigo Carro.