Presidente da OAB, Beto Simonetti está certo ao criticar o STF? Talvez esteja (só) em parte

22 fevereiro 2025 às 21h00

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A democracia é assim: todos têm o direito de se defender, com o auxílio de um advogado, de maneira ampla. Pode ser o maior criminoso da paróquia. Pode ser o maior golpista político do país.
Advogados podem ter preconceitos contra determinados criminosos? Podem, às vezes devem. Mas tais criminosos, ainda assim, precisam de uma defesa feita por advogados. É a lei. É como funciona a sociedade democrática.
Há pessoas que se irritam com advogados que defendem um golpista juramentado como Jair Bolsonaro, ex-presidente da República. Mas é, claramente, um direito dele. É assim, insistamos, que funciona a democracia. O Estado Democrático de Direito.
Na democracia, o melhor e o pior dos regimes políticos, até aqueles que jogam contra ela, operando para trocá-la por uma ditadura, têm o direito de serem defendidos por um advogado.
Estou entre aqueles que se alinham com o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, nas decisões rigorosas contra os golpistas do 8 de Janeiro e contra os propagadores de fake news. A competência e a coragem do magistrado são notáveis e, como tais, merecem o aplauso da sociedade.
Por outro lado, receio que, em nome da defesa da democracia, magistrados, notadamente ministros do Supremo, a última instância, excedam. É crucial que se mantenha o direito de ampla defesa, em tempo hábil e adequado.

Porém, como tratar golpistas, que falam até em matar o presidente da República, Lula da Silva, e o ministro Alexandre de Moraes? Com o rigor da lei, é claro. Mas, insistindo, com o direito a uma defesa ampla e qualificada.
Os legalistas, como Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, precisam ser “melhores” do que os não-legalistas, como os golpistas Jair Bolsonaro, Arthur Braga Netto e Augusto Heleno. É assim que tem de ser.
O arrazoado acima tem a ver com um interessante discurso do presidente nacional da OAB, Beto Simonetti, feito na quarta-feira, 19, na posse de Leonardo Sica como presidente da OAB de São Paulo.
Em defesa da advocacia, Beto Simonetti criticou uma decisão do ministro Alexandre de Moraes. “Em processos dos réus do 8 de Janeiro, advogados tiveram direito apenas a apresentar seus argumentos de defesa em vídeo gravado — não mais presencialmente em sessão —, o que tem gerado uma série de críticas no meio jurídico”, assinala a repórter Renata Galf, da “Folha de S. Paulo” (quarta-feira, 19).
Beto Simonetti é taxativo: “Tenho bradado por todo o país e falo isso de maneira respeitosa, mas frontal, para o Brasil, na bancada do Supremo Tribunal Federal: vídeo gravado jamais será sustentação oral”.

O presidente da OAB acrescentou: “A sustentação oral é um direito fundamental da advocacia, é um pilar do devido processo legal. A advocacia não aceitará ser reduzida a mera espectadora do próprio julgamento”.
Há um trecho da fala de Beto Simonetti que, embora correta, merece ressalva: “O Brasil precisa de lideranças pacificadoras, não figuras que alimentam divisões”. Certo, precisa mesmo.
Mas tudo indica que a direita, a liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, não se interessa, na prática, por um país pacificado. A movimentação da direita — ou melhor, da extrema direita bolsonarista —, tanto em redes sociais quanto em outros foros, como o Congresso, não é, em nenhuma medida, pela pacificação. O bolsonarismo aposta no exceder dos conflitos. É seu alimento. Ela cresce quando excede e desrespeita as regras democráticas.
A Procuradoria-Geral da República denunciou na terça-feira, 18, os “atletas” do golpismo, como Jair Bolsonaro, Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Teodoro e outros.
Beto Simonetti sublinha que o julgamento dos golpistas do bolsonarismo se dê “fora do clima de politização”. Em seguida, ele próprio se corrige, admitindo que, como o caso envolve políticos famosos, não há como escapar à politização.
O fato é que, com golpistas, é possível ser “idealista” na aplicação das regras do Direito, ou melhor, das leis? Talvez não. É preciso ser rigoroso, no limite da lei.
Mas acrescenta-se: o direito de defesa e o direito de o advogado atuar, de maneira respeitosa, devem ser acatados pelos magistrados.
O (quase-)ditador (Jair Bolsonaro) quis matar o democrata (no caso, o presidente Lula da Silva). Mas o democrata não pode querer matar o ditador. Tem de aceitar que ele, o ditador (ou aspirante a ditador, como Jair Bolsonaro), tem o direito a uma defesa ampla, sem nenhum cerceamento. Insistindo: é assim que funciona a democracia. Para o bem. Ou para o mal.
(Email: [email protected])