Os que falavam em derretimento agora falam em renascimento de Lula. É cedo pra avaliação peremptória

11 outubro 2025 às 21h00

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As reportagens precisam de fontes como lastro para torná-las confiáveis e densas. Há jornalistas experts em determinadas áreas, mas, ainda assim, nem sempre são tão especializados como economistas, físicos, biólogos, médicos, advogados, engenheiros, historiadores, filósofos, cientistas políticos etc.
Então, se um grupo de economistas, baseado nos dados disponíveis, diz que a economia vai crescer 1,8% — ou pouco mais, ou pouco menos —, os jornalistas vão transcrever suas análises. Lá na frente, quando os dados oficiais saírem, os números poderão ser outros. O crescimento pode ser superior ou não ao predito.
O que houve? Os economistas e jornalistas erraram? Sim. Mas não por má-fé, pelo menos na maioria das vezes.
Há quem acredite que a economia é uma “ciência exata”, filha da matemática. Mas, a rigor, não é. Quando avaliam um quadro econômico, o da circunstância, em geral os economistas são mais precisos. Mas, pelo apelo do mercado e do jornalismo, são levados a fazer “previsões”. E se tornam quase, exagerando, videntes. Márcios Sensitivos.
Entretanto, surge uma montanha no meio do caminho — o sr. imponderável, quem sabe, primo do Sobrenatural de Almeida de Nelson Rodrigues e, claro, filho da conjuntura, da circunstância.
O imponderável pode ser interno (inflação, crescimento baixo) ou externo (tarifaço de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos). Uma crise internacional do petróleo — combustível que move o mundo em larga escala — pode gerar problemas em vários países, como o Brasil. E pode resultar em crescimento menor.

Sinergia de Lula com pobres e classes médias
A popularidade do presidente Lula da Silva (PT) era baixa — a rigor, ainda não é tão alta — por que seu governo era ruim? Talvez não. O mais provável é que as medidas da gestão ainda não haviam sido apreciadas e absorvidas pela maioria dos brasileiros, sobretudo pobres e classes médias.
Com a criação de uma série de medidas de apoio à turma do andar de baixo — como a isenção de imposto renda para quem ganha até 5 mil reais e outras benesses —, a imagem do governo e de Lula da Silva começou a melhorar.
Por isso, hoje Lula da Silva é favorito na disputa pela reeleição. De acordo com os institutos, não perde, neste momento, para nenhum dos pré-candidatos listados.
Diz-se, comumente, que o tarifaço de Donald Trump ajudou Lula da Silva a recuperar parte de sua popularidade. Contribuiu. É fato. Porém, para o povão — que inclui parte das classes médias —, o tarifaço não é visto como tão importante. Mas as mudanças que geram benefícios diretos, que dizem respeito a mais dinheiro no bolso, influenciam os brasileiros a responderam positivamente pró-Lula da Silva nas pesquisas dos institutos.

O tarifaço de Donald Trump mexeu com os brios dos brasileiros — com seu nacionalismo. Como postou-se ao lado do presidente dos Estados Unidos — aquele que está expulsando brasileiros —, a direita bolsonarista começou a perder força entre pobres, classes médias e, mesmo, ricos.
De imediato, com um marketing inteligente, Lula da Silva encampou a defesa do Brasil, dos interesses dos empresários, produtores rurais e do povão.
A imagem que se cristalizou é que o bolsonarismo não está preocupado com o Brasil e os brasileiros, e sim em “salvar a pele” de Jair Bolsonaro, que foi condenado à prisão pelo Supremo Tribunal Federal. Lula da Silva, pelo contrário, começou a ficar com a imagem de ter sinergia com o país.
Quando Donald Trump começou a se conectar com Lula da Silva, as coisas pioraram ainda mais para a direita bolsonarista. A mensagem: se o presidente americano recuou — ou vai recuar —, isto quer dizer que estava errado, o presidente brasileiro está certo e a direita bolsonarista está errada.

Olhar mais social e menos o barulho de Trump
A imprensa, os economistas e o mercado tinham como prever o “renascimento” de Lula da Silva? Certamente que não.
Mas pode-se sugerir que há um alarmismo pessimista na imprensa, baseado em geral nas declarações de economistas e de experts do mercado financeiro, que contribui para gerar desgaste tanto na imagem do governante quanto à economia e não informa com equilíbrio.
Na ânsia de buscar objetividade, uma ética da precisão, o jornalismo não cria espaço para a dúvida. A busca da manchete explosiva — que gere mais audiência do que leitura — acaba por reduzir a margem para o contraponto, para a nuance.
Depois de sugerir que Lula da Silva estava “derretendo”, assim como seu governo, a imprensa, economistas e cientistas políticos — há exceções — agora o consideram praticamente reeleito para presidente da República.
Assim como erraram os que mencionaram “derretimento” podem acabar errando os que falam em “renascimento”.
Na verdade, Lula da Silva está mesmo forte e seus adversários parecem não saber combatê-lo. Porque o presidente começa a viver, quem sabe, uma lua de mel com a sociedade, com os brasileiros.
Mas e se a lua de Lula da Silva com os brasileiros for de mel, isto é, provisória? Política — e economia — é conjuntura. O que hoje é excelente, registrado pelas pesquisas, amanhã, por um motivo ou outro, pode não ser.
No momento, Lula da Silva vai, realistamente, administrar sua frente e tentar não cometer erros. O que seus adversários farão? Não se sabe. Mas precisam ficar de olho na conjuntura… até para entender a estrutura.
Há, por fim, a questão da campanha. Os brasileiros apreciam avaliar os candidatos, os verdadeiros — aqueles cujos nomes vão para as urnas —, durante a campanha, nos últimos dias.
Então, quem quiser ganhar — ou pelo menos tentar — de Lula da Silva precisa ser hábil o suficiente para contestar menos o que está fazendo e sugerir que, se eleito, será um avanço.
Vale olhar mais o social — a maneira como o petista-chefe reconquistou apoios — e menos o barulho de Donald Trump e bolsonaristas (que perderam a sintonia com o Brasil real, a dos avessos às questiúnculas ideológicas e mais preocupados com o bolso, com o ato de consumir).
Um aspecto a explorar é o combate falho do governo Lula da Silva ao crime organizado. Nesta questão, a gestão petista empata com a do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. São irmãs siamesas. A segurança vai mal no Brasil, sobretudo em São Paulo (reduto bolsonarista) e no Rio de Janeiro (reduto bolsonarista). E menos mal em alguns Estados, como Espírito Santo e Goiás. Ou seja, é possível resolver, ainda que de maneira parcial, o problema… e no curto (ou médio) prazo.