O jornalista Fernando Pedreira lança, aos 90 anos, suas memórias

02 julho 2016 às 10h25
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“Entre a Lagoa e o Mar” relata o rompimento com o Partido Comunista, o trabalho do profissional na redação do Estado e a fúria de um Mesquita contra a ditadura
José Maria Mayrink resenha no “Estadão” as memórias do jornalista Fernando Pedreira, de 90 anos — “Entre a Lagoa e o Mar” (Bem-Te-Vi, 428 páginas). Considerando o histórico do autor, trata-se de obra imperdível de um estilista da Língua Portuguesa. Poucos escrevem tão bem, ao menos em jornal, quanto o ex-editor de “O Estado de S. Paulo”. Seus artigos eram, por vezes, autênticas peças literárias. Eram lidos, devorados e esperados com paixão pelos leitores. O comentarista informa que “Pedreira concluiu o primeiro volume de ‘Entre a Lagoa e o Mar’, em 2015. Se ele se refere a primeiro volume, supõe-se que a história vá continuar”.
Como outros liberais, Fernando Pedreira pertenceu ao Partido Comunista, com o qual rompeu no período da desestalinização na União Soviética, em 1956. A invasão da Hungria chocou-o, assim como a Osvaldo Peralta (autor do seminal “O Retrato”, finalmente reeditado), Mário Schenberg e Agildo Barata.
Durante parte da ditadura civil-militar, Fernando Pedreira tornou-se adido de imprensa da representação do Brasil na ONU, em Nova York, e da embaixada brasileira em Washington. “Pedreira lembra a fúria demonstrada pelo Doutor Julinho (Julio de Mesquita Filho), num restaurante de Nova York, quando o governo Castello Branco cancelou as prometidas eleições presidenciais de 1965, cortando o futuro de Carlos Lacerda, virtual candidato”, anota José Maria Mayrink. Carlos Lacerda, o líder da UDN e vivandeira que colaborou na articulação do golpe de 1964, era a paixão política da família Mesquita.
Trecho do livro
“Sou um tímido, sempre serei. Escondi-me por trás da palavra escrita. Suo muito nas palmas das mãos, demais. Muitas vezes, antes de dar a mão a um interlocutor, um recém-chegado, tento enxugá-la disfarçadamente nas calças, ou na aba do paletó, para ocultar o vexame; às vezes, emudeço, já não sei o que dizer; me torço e retorço por dentro, sem motivo nenhum”.
José Maria Mayrink revela que “a timidez estende-se ao telefone, que ele só atende quando não há alguém por perto, sempre imaginando que a ligação é para ele”.