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Li mais uma vez a biografia “Roberto Carlos em Detalhes”, do escritor e historiador Paulo Cesar Araújo. Trata-se, de fato, de uma obra alentada, mas laudatória. Falta uma interpretação mais detida da música de Roberto Carlos e evidenciar o seu lugar na música brasileira. É biografia de pesquisador sério e apaixonado. Mas a paixão turva, aqui e ali, a capacidade de julgar — daí a laudação. Fica-se com a impressão de que, sem Roberto Carlos — um cantor de certo mérito —, a música brasileira não existiria ou, ao menos, seria menor.

Se o livro é elogioso, “em detalhes”, por que Roberto Carlos recorreu à Justiça para censurá-lo? Possivelmente devido à menção da doença-morte de Maria Rita, grande paixão do cantor, e do acidente no qual o menino Roberto Carlos perdeu uma perna (um trem de ferro cortou-a). Será isto mesmo? Paulo Cesar tem sugerido que o artista sempre quer faturar com os “produtos Roberto Carlos” e a biografia publicada pela Editora Planeta não lhe rendeu nenhum centavo. Talvez o motivo real permaneça no terreno do insondável, não do comercial. Ao pedir a retirada do livro de circulação, o que obteve na Justiça, ele certamente queria mandar um recado para outros biógrafos, quiçá mais sensacionalistas: “Não mexem comigo, não revelem meus segredos”.

Agora, como o Supremo Tribunal Federal decidiu que não se precisa de autorização prévia para se publicar biografias — as chamadas “não autorizadas” —, Paulo Cesar informa que vai publicar uma edição revista, pois a primeira edição saiu há nove anos. “A Suprema Corte acabou com esse entulho autoritário da censura prévia. Meu livro voltará. Será atualizado. A publicação anterior era de 2006, Roberto Carlos não tinha feito ‘Esse cara sou eu’. Então será uma obra ampliada e atualizada”, disse o biógrafo ao jornal “O Globo”.

Paulo Cesar frisa que vai contar, na nova edição, a história do conflito judicial com Roberto Carlos. “Tudo isso faz parte da história de Roberto Carlos. Ele sempre se declarou apolítico e pela primeira vez defendeu publicamente uma causa, a da censura prévia. E foi derrotado. Vou narrar isso em detalhes”, afirma. Na verdade, o autor já contou parte da história no livro “O Réu e o Rei — Minha História com Roberto Carlos” (Companhia das Letras, 528 páginas).

Espera-se que a mágoa não turve a mente de Paulo Cesar. Ele garante que sua admiração pela música de Roberto Carlos, apesar da pendenga judicial, permanece. “Não acho a música dele feia porque me processou”, sublinha. Mas, ao menos nas entrevistas, o autor mostra-se, com certa razão, tremendamente magoado. O cantor não quis aceitar a óbvio: o livro só o promove.