A modelo diz que ficou com o jogador por prazer. Apesar das dúvidas, se for verdade, fica evidente que há uma “nova” mulher na praça

A história da modelo Najila Trindade e do jogador Neymar Jr., craque da seleção brasileira e do Paris Saint-Germain, é uma novela da vida real. Não dá para saber, a partir do que se divulgou até agora, como terminará, e até se poderá ser concluída. Mesmo decisões judiciais, que parecem encerrar um caso, às vezes não conseguem contribuir para elucidá-lo de maneira integral. Há uma zona pantanosa na vida, especialmente quando um fato ocorre entre duas pessoas — sem testemunhas distanciadas —, que jamais será esclarecida de acordo com o que querem todos nós. A dúvida sempre persistirá. O escritor Henry James (“A Taça de Ouro” e “As Asas da Pomba”) entendeu à perfeição — ao criar personagens — a ambiguidade do ser humano. Aquilo que jamais é esclarecido.

Neymar e Najila Trindade: todos estão à espera de um esclarecimento definitivo, que talvez nunca poderá ser formulado, nem mesmo pela Justiça

Najila Trindade diz que foi estuprada. Neymar afirma que não a estuprou. Ela diz que ele se recusou a colocar camisinha, o que seria útil para proteger os dois — que parecem ter vida sexual ativa. O jogador afirma que a relação foi consensual.

Colocadas as duas versões, as pessoas, que transformaram uma questão privada num assunto de “todos” — tornou-se público e a imprensa não para de divulgá-lo, porque rende audiência (e não iluminação) —, começaram a comentá-las e apresentar suas próprias interpretações. Nas redes sociais, há quem avalie Neymar como “degenerado”, por ter “importado” até Paris uma mulher unicamente para ter relações sexuais, e apresenta Najila como uma “interesseira” e, até, “golpista”.

A Taça de Ouro, As Asas da Pomba e Retrato de uma Senhora: guias diretos ou indiretos para tentar entender a ambiguidade humana | Foto: Jornal Opção

Mas o que chama a atenção é que, num breve comentário, Najila faz o elogio do prazer. Sim, uma mulher diz que sente prazer e que quer ficar com um homem “x” (bonito, famoso, carismático e, sim, rico). Um homem que ela escolheu para ficar e ter relacionamento-prazer sexual. Não é amor. É sexo. Esta busca do prazer, com uma mulher assumindo que se sente bem transando — e não necessariamente “fazendo amor”, o, digamos, “papai com mamãe” —, é um avanço. Uma micro revolução. Uma mulher agente, sujeito, que dirige e fala. Vão tachá-la de tudo, até de mulher que se comporta como homem e interessada na grana do atleta do Paris Saint-Germain; por sinal, mesmo antes de Gertrude Stein e Hemingway, Paris é uma festa. Ainda assim, o que há a dizer é: Najila é uma outra mulher — o que talvez tenha assustado Neymar, que parece um jovem e, ao mesmo tempo, parece um velho — cuja personalidade é definida, não por si, mas pelo pai. Pode ser um equívoco (um excesso) interpretativo, mas fica-se com a impressão de que o craque — sim, craquíssimo, ainda que controvertido e imaturo — só se liberta da família, notadamente do papai, quando está em campo, enfrentando chuteirudos, e na cama, com mulheres belas.

Hitchcock e Kim Novak: o diretor certamente saberia fazer um filme sobre a trama dos brasileiros | Foto: Reprodução

Neymar, por ser o ás da seleção, é heroico, Najila, endividada e morando de aluguel, seria uma sirigaita (na verdade, é gente como a gente; Machado de Assis, criador da enigmática Capitu, certamente a adoraria. Hitchcock quiçá a transformaria numa de suas loiras fatais). Neymar, um “salvador” da pátria — o mágico que cria felicidade prêt-à-porter —, parece ter deixado a imprensa mesmerizada (apesar da força moral da palavra estupro). De repente, a mulher virou vilã. O mais provável é que se trate de uma grande história sem mocinhos — que talvez possa ser mais explicada pela literatura, com sua imaginação à flor da pele, do que pelo jornalismo, cuja busca da verdade apressada acaba por espantar a verdade-verdadeira, que é sombria, ambivalente, nuançada e, quase sempre, mais problemática do que se pensa.

A imprensa, ou parte dela, notadamente a Globo, escolheu seu lado — a do quase-rei de Paris. Najila, apesar de bela, é uma fera plebeia. A mulher é, do ponto de vista masculino, sempre culpada? É o que parece. Sua liberdade “agride” a força masculina.