Grupo Globo não está falindo e nem Bolsonaro é responsável por sua suposta crise

09 maio 2021 às 00h00

COMPARTILHAR
A concorrência externa, com produção diversificada, abalou a audiência da TV Globo. Ela estava preparada pra enfrentar Record e SBT, mas não os competidores externos
Celso e Joaquim (meu parente) são dois leitores do Jornal Opção que, quando publico notícias sobre o Grupo Globo — TV Globo, GloboNews e jornal “O Globo” (o mais lido do país, superando a “Folha de S. Paulo”) —, enviam mensagens sugerindo que o empreendimento da família “está falindo” e que o presidente Jair Bolsonaro é responsável por sua crise.
Joaquim e Celso estão certos ou equivocados? Eles estariam espalhando fake news?
Primeiro, Jair Bolsonaro governa o Brasil há apenas dois anos e quatro meses. Num período tão curto, não teria condições de contribuir para “quebrar” uma empresa tão poderosa quanto o Grupo Globo. Portanto, se há uma crise, como sugerem os dois leitores, ela não tem a ver, basicamente, com o governo do presidente que representa a extrema direita de caráter cada vez mais fundamentalista e autoritário-populista.
Segundo, o Grupo Globo é lucrativo, e, mesmo com o país sob crise econômica — o que reduz o volume dos anúncios —, não está falido. Pelo contrário, o empreendimento é sólido.
Terceiro, cortar custos, reduzindo a equipe — e pagando salários mais condizentes com o novo mercado —, não é sinônimo de crise. Na verdade, o que se quer é manter a margem de lucro e a capacidade de investimento. O Grupo Globo está ficando menor e tende a requalificar sua produção, aumentando-a, e tornando-a mais universal, pois terá de vendê-la para outros países. O negócio é ficar menor — com custo mais baixo — e mais diversificado para sobreviver e lucrar mais.

Quarto, a crise verdadeira não é apenas do Grupo Globo. Ela atinge todos os meios de comunicação, sobretudo os maiores — cuja despesa mensal é mais alta. As estruturas dos veículos da família Marinho e dos jornais “Folha de S. Paulo” e “O Estado de S. Paulo” foram constituídas para um tempo — de bonança e quase nenhuma concorrência de peso — que não existe (e não volta) mais.
A diversificação da comunicação — sua globalização — é a grande responsável pela crise dos meios de comunicação globais (não apenas da Globo). Concorrer com a TV Record e o SBT era fácil. Porque as duas redes sempre competiram pelo segundo lugar, não pelo primeiro. Mas como competir com Netflix, Fox, Amazon Prime, ESPN, CNN Brasil e tantos outros meios tanto na televisão quanto na internet?
A Globo, que navegava solitária nos mares brasileiros, com produção de qualidade e anunciantes de peso, agora tem de enfrentar gigantes com produtos variados e com os quais só agora despertou para estabelecer uma produção competitiva. Dará para sobreviver, mas sob outra perspectiva.
A rigor, Bolsonaro é um problema para a Globo, mas um problema menor. A partir de agora, a rede dos Marinho terá de se contentar com audiências menores e terá de fornecer aos telespectadores produtos diferenciados — como minisséries, séries, documentários e, até, filmes. A rede ganhou competidores internacionais, que estão solapando sua audiência (principalmente a dos telespectadores de maior poder aquisitivo) — muito mais do que Record e SBT, que também perderam espaço —, e, para enfrentá-los, terá de oferecer produtos semelhantes. Já começa a oferecer, como na Globoplay, mas está apenas no meio do caminho de um negócio muito mais abrangente. Com uma estrutura mais enxuta, e com incentivo aos seus setores criativos, a Globo poderá não vencer os gigantes que chegaram para ficar, mas pelo menos terá condições de sobreviver — preservando um naco generoso do mercado.
Ao boicotar o Grupo Globo, obrigando-o a rever seu custo, Bolsonaro acabou dando, indiretamente, uma contribuição positiva para a família Marinho. Porque a fez repensar o negócio antes que ele, devido à concorrência externa, naufragasse de vez. Portanto, o presidente se tornou uma espécie de “aliado” do Grupo Globo. É a dialética da vida.