Editora libanesa diz que a imprensa não está morrendo e deve defender a democracia

23 junho 2024 às 00h01

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O jornal “Valor Econômico” publicou na sexta-feira, 21, uma curta mas importante reportagem, sob o título de “A imprensa não está morrendo, diz editora”.
Nayla Tueni é editora e presidente do jornal “AnNahar”, do Líbano. No festival de criatividade Cannes Lions 2024, em Cannes, na França, a jornalista disse que, para a democracia, é decisivo que a imprensa seja forte e proativa.
“As pessoas dizem que a imprensa está morrendo, mas ela não está. Estamos aqui para ficar, para escrever sobre o presente e o futuro do nosso país, da região e do mundo”, sublinhou Nayla Tueni, tida como uma profissional de uma coragem inaudita.
O jornal “AnNahar”, fundado em 1933 pelo avô de Nayla Tueni, “é conhecido no mercado publicitário por implantar ideias ousadas na defesa da democracia”. Por isso conquistou três Grand Prix no Cannes Lions. Trata-se simplesmente da “premiação máxima do festival”.
Nayla Tueni enfatiza que “proteger os jornalistas, incentivá-los a escrever, falar e fazer vídeos é muito importante. Assim conseguimos empoderar as pessoas e permanecer fortes”.
O pai de Nayla Tueni, Gebran Tueni, foi “assassinado em 2005 por um carro-bomba em Beirute, capital do Líbano”. Porém, no comando do jornal, a notável profissional não recuou um milímetro. Pelo contrário, aumentou a ousadia e a criatividade de sua equipe.
Uma das invenções do “AnNahar”, que obteve repercussão internacional, foi a criação de um presidente para o Líbano por meio de inteligência artificial. Trata-se de uma crítica à política do país, que ficou dois anos sem presidente — “após a saída de Michel Aoun, em novembro de 2022”.
Não se trata de fake news, e sim de uma intervenção político-jornalística. “Queríamos usar a inteligência artificial de uma boa forma, porque muitas pessoas estão criticando a inteligência artificial por notícias falsas e informações falsas. E estamos, novamente, com outro problema para o Líbano, que é estar sem presidente”, sublinha Dami Richa, presidente do conselho da agência BBDO para o Oriente Médio e Norte da África. A Impact BBDO atua em parceria com o “AnNahar”.
De acordo com o “Valor”, “a ferramenta de IA, lançada em abril, foi modelada com conteúdo acumulado em 91 anos de história do jornal”. Nayla Tueni assinala que “foi um trabalho difícil de resgate de arquivos para treinar a IA. Mas, após mais de dois anos sem presidente, decidimos criar a plataforma, com base no que foi escrito por nossos jornalistas e colunistas”.
Em 2023, uma edição do “AnNahar” contou a história de cinco jornais que, perseguidos pelo governo e com problemas econômicos, fecharam as portas. Chamada de “Jornal dentro da edição do jornal”, a campanha faturou “a premiação do Cannes Lions 2023 na categoria Print&Publishing”.
O “AnNahar” doou, em 2022, papel e tinta “para a produção de cédulas de votação no Líbano”. Em função disso, parou de circular, momentaneamente, na versão impressa — permanecendo a edição online. Pela importância do ato, um indicativo de que aposta no fortalecimento da democracia, o jornal ganhou o GrandPrix de 2022.
Em 2019, o “AnNahar” saiu com oito páginas em branco para ressaltar a instabilidade política e econômica do país, que estava sem presidente. O jornal fez uma campanha sugerindo que os leitores escrevessem e se manifestassem sobre os problemas do Líbano e a respeito do governo (ou desgoverno) nas redes sociais. O país, por assim dizer, “convulsionou-se” — pondo-se em movimento, de maneira crítica. Por isso o jornal ganhou o primeiro grande prêmio no Cannes Lions, no mesmo ano.
Nayla Tueni sugere que os jornais devem ser participantes e não meramente reativos e divulgadores de fatos sobre os quais não procura interferir. “Nós acreditamos em causas sociais. Não estamos somente preocupados com nosso nome e nossa marca”, assinala.