Audiência do jornalismo digital caiu porque o Google se tornou seu concorrente direto
30 agosto 2025 às 21h00

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Editores, repórteres e proprietários de jornais já estão cientes, mas o quadro tende a piorar, nos próximos meses: sua audiência está em queda e só com muito esforço, sobretudo com a publicação de reportagens caça-cliques, se poderá reduzir parte das perdas.
Que fique patente: o problema não é a qualidade do jornalismo. Os jornais, revistas e sites podem melhorar sua produção, mas os acessos continuarão baixos. Podem melhorar, de maneira episódica, por causa de uma reportagem que caiu no gosto dos leitores e ganhou as redes sociais.
No geral, mesmo com “patrocínio”, o tráfego será cada vez mais limitado.
Luciana Gurgel, num artigo para o Portal dos Jornalistas, pergunta no título: “Google virou concorrente direto do jornalismo digital? É o que diz a associação de editores americanos Digital Content Next”.
Estudo da associação americana Digital Content Next (DCN) mostra, regista Luciana Gurgel, que “o tráfego vindo do Google para sites jornalísticos e de entretenimento caiu 10% entre maio e junho em relação ao mesmo período de 2024”.

Jornais, revistas e sites brasileiros — e não apenas os patropis — esbaldavam-se na publicação de reportagens a respeito de seus milhões de acessos. Por sinal, continuam altos, na casa dos milhões, mas caiu muito. Há publicações que, de 23 milhões, caiu para 7 milhões. Outras caíram de 10 milhões para 3,5 milhões. Em Goiás, a “Revista Bula”, o Jornal Opção e o “Portal 6”, líderes em seus segmentos, tiveram uma queda brusca na audiência. Mas permanecem com milhões de acessos, graças à qualidade do jornalismo, que atrai leitores de todo o país e, inclusive, do exterior.
O relatório da DCN ressalta, na síntese de Luciana Gurgel, “que os resumos automáticos feitos por inteligência artificial”, quando “presentes na busca”, contribuem para a redução do tráfego dos jornais, revistas e sites.
Ocorre assim: o leitor dirige-se ao Google — ou outro site de busca, como o Bing, da Microsoft — e digita uma pergunta sobre determinado assunto. O Google e outros, no lugar de remeter o leitor diretamente às reportagens dos jornais, revistas e sites, sintetizam, por meio de inteligência artificial, o conteúdo, como se fosse de sua autoria, e colocam antes do material original.
Resultado: o leitor, sempre com pressa, pode acabar se contentando — como vem ocorrendo — com a síntese produzida por IA. O material tão arduamente produzido por profissionais fica esquecido, como se não existisse. Assim, cai o acesso de todos, menos do Google e similares.
Então, como sugere a DCN, o Google se tornou concorrente — um adversário cada vez mais hostil — do jornalismo digital. Mas não um concorrente que disputa o leitorado em igualdade de condições. Na verdade, o Google, com sua IA, leva o leitor a praticamente ignorar o conteúdo dos jornais, revistas e sites.
Luciana Gurgel ressalva que “o Google, com seu recurso AI Overview, não é o único buscador a oferecer resumos. Mas está no centro do debate por ser o principal caminho para quem quer achar alguma coisa na internet”.
O CEO da DCN, Jason Kint, diz que o Google “deixou de atuar como parceiro de distribuição e passou a ser concorrente direto dos sites que veiculam notícias, retendo a audiência e reduzindo o alcance do conteúdo” (a frase entre aspas é de autoria de Luciana Gurgel).
Jason Kint acrescenta, no sentido de alertar editores, repórteres e proprietários de jornais, revistas e sites: “Este novo modelo prejudica ainda mais a sustentabilidade do jornalismo digital, levando a menos leitores, menos impressões de anúncios e menos conversões em assinaturas. E compromete a diversidade da informação” (a síntese é de Luciana Gurgel).
Há uma saída imediata? A DCN sublinha que “é urgente estabelecer regras de transparência, opções de opt-out [opção de recusa], acordos de licenciamento e regulação das práticas do Google”.
Uma saída prática é mesclar jornalismo de primeira linha — para não manchar a qualidade editorial dos jornais — com reportagens de caráter popular (que, a rigor, não precisam ser ruins). Há, por exemplo, listas muito boas e listas meramente apelativas.
Há textos produzidos com inteligência artificial que, embora relativamente bem escritos, às vezes são confusos e nada acrescentam (por uma questão ética, editores e repórteres deveriam acrescentar ao final: “Este texto foi escrito com o apoio de IA”). E, claro, contribuem para gerar desemprego.
