Pela segunda vez em vinte anos, o Brasil saiu do Mapa da Fome da ONU. Segunda vez porque depois de uma batalha histórica que permitiu que o país deixasse o mapa pela primeira vez em 2014, durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff, e voltamos à lista da fome a partir do triênio 2018–2020, já nos primeiros anos do governo de Jair Bolsonaro (PL). O relatório foi divulgado nesta segunda-feira, 29, pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

Esse relatório mostrou que o país reduziu a proporção da população em situação de subalimentação para menos de 2,5%, que é o limite técnico usado pela entidade para considerar que a fome deixou de ser um problema estrutural. Com Bolsonaro, justamente a subalimentação prevaleceu, por isso voltamos à lista. 

Mesmo que Lula muitas vezes mereça as críticas, no Brasil atual, esse feito só poderia acontecer com ele. Num terceiro mandato conturbado, a marca é simbólica para ele, o PT e a imagem de uma esquerda defasada e sem liderança. O feito reafirma o retorno das políticas públicas voltadas à segurança alimentar depois de um ciclo de desmonte institucional e prova que elas ainda funcionam.

Entre 2020 e 2022, 21,1 milhões de brasileiros estavam em situação de fome, mais do que o dobro dos 10,3 milhões registrados em 2018. O número caiu para 8,1 milhões em 2023, segundo o último Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia. A reversão está diretamente ligada ao redesenho de programas sociais: o novo Bolsa Família de R$ 600 e adicionais, o retorno do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), a recomposição dos estoques públicos de alimentos, e a volta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), desativado em 2019. 

O contraste com o governo anterior é nítido. Entre 2019 e 2022, o orçamento da política de segurança alimentar e nutricional foi reduzido em mais de 80%, de acordo com um levantamento da FGV Social de 2023. O Programa de Aquisição de Alimentos ficou praticamente inativo, e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) sofreu sucessivos congelamentos de repasses. O Bolsa Família foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil, que mesmo tendo aumentado os valores pagos, não garantia critérios técnicos, regularidade orçamentária ou integração com outras políticas públicas. A consequência foi cruel: a fome voltou a crescer ano após ano, atingindo o maior nível desde 2004.

A resposta de Lula priorizou os territórios mais afetados: Norte e Nordeste, periferias urbanas, populações indígenas e famílias chefiadas por mulheres negras. 7 em cada 10 lares em insegurança alimentar grave estavam nessas regiões, segundo a Rede PENSSAN. Por isso foram reativadas as cozinhas solidárias, os bancos de alimentos e centros do SUAS. O valor por pessoa da alimentação escolar foi reajustado pela primeira vez desde 2010, e os agricultores familiares voltaram a ser fornecedores diretos para creches e escolas. 

No último ano, a FAO reconheceu o Brasil como exemplo global na retomada de políticas sustentáveis contra a fome. O Brasil saiu do Mapa da Fome porque, desta vez, quis sair. A redução da fome vem de decisões políticas orientadas por prioridade social. Lula repete o feito em um cenário internacional e econômico ainda mais complicado, marcado por insegurança alimentar crescente. De novo, o Brasil volta a ser referência.

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