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Em outubro do ano passado, o secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappelli (que, inclusive, está com os dias contados na pasta), oficializou, com o óbvio aval de Flávio Dino e Lula, a nomeação do delegado Carlos Afonso Gonçalves Gomes Coelho para um cargo de coordenação na Polícia Federal (PF). O posto em questão era nada menos que a coordenação do Comando de Aviação Operacional, setor vinculado à diretoria-executiva do órgão. 

Coelho ficou apenas três meses no cargo, sendo exonerado na última sexta-feira, 26, após vir à tona a informação de que ele era um dos alvos da própria PF em uma investigação que mira o esquema montado dentro da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, durante a gestão Bolsonaro para espionar, supostamente, jornalistas, advogados, juízes e adversários políticos do então presidente da República. 

O esquema, que foi apelidado de ‘Abin Paralela’, teria monitorado ilegalmente os passos até de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. 

No entanto, o mais surpreendente de tudo isso é saber que o delegado Carlos Afonso Coelho, que foi assessor especial da Secretaria de Governo da Presidência da República e secretário de Planejamento e Gestão da Abin na gestão Bolsonaro, foi nomeado para um cargo fundamental dentro da PF que, por si só, demandava insuspeição absoluta. Ora, estamos falando de Lula colocando dentro do ninho da inteligência federal aquele que era tido como o braço direito de Alexandre Ramagem, bolsonarista de carteirinha que chefiou a Abin e que hoje é epicentro da investigação da PF. 

Não se pode crer que o Palácio do Planalto, tendo ciência de ter “pegado o bastão” de um presidente que insuflou seu eleitorado a acreditar que sua derrota confirmaria uma fraude nas eleições, receberia uma máquina pública magicamente comprometida com o projeto de governo eleito. 

Vejamos bem: não estamos falando, aqui, de uma “caça às bruxas” contra servidores que atuaram em órgãos públicos na gestão Bolsonaro. Mas, sim, de uma renovação lógica e estratégica em cargos – até uma criança sabe disso – onde é necessário haver pessoal de confiança do atual gestor. 

O governo parece assistir aturdido o fato de que nichos fundamentais de estratégia e inteligência do governo podem estar, ainda, cheios de pessoas temerosas de virarem alvos de investigação por movimentações e atos suspeitos praticados durante a última gestão. 

Se não é tolice, é de extrema ingenuidade por parte do atual presidente não ter se dado conta de que parte de seu governo joga contra o próprio governo. E se a coisa estourar ainda mais para o lado dele, é como diz o velho ditado modificado com o tempo, mas que mantém a mesma mensagem: Quem pariu Mateus, que o embale. 

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