Com sua produção primária (plantação da coca e formação da pasta) concentrada fortemente em três países, Colômbia, Peru e Bolívia — todos em nossas fronteiras — e produção secundária (refino, transformação em cloridrato e secagem) difundida por várias regiões do globo, a cocaína transformou-se em um dos maiores problemas sociais dos últimos 50 anos.

Basta dizer que os Estados Unidos, a principal economia do mundo, são tidos como os maiores consumidores da droga, superando o continente europeu como um todo, e que seria o segundo consumidor.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estima a produção mundial de cocaína em 3.700 toneladas, o que equivaleria, com 30.000 dólares o quilograma cotado no consumo final, a um mercado de altíssima rentabilidade e superior a 100 bilhões de dólares anuais.

Um índice da rentabilidade da atividade criminosa: o traficante Pablo Escobar, chefe do cartel de Medelín e grande exportador da droga para os EUA nos anos 1980, era, em 1990, um dos dez homens mais ricos do mundo (tinha algo, em valores de hoje, como 50 bilhões de dólares).

O tráfico arrasta consigo uma série de crimes correlatos: assaltos, roubos (de cargas inclusive) e furtos por parte de usuários; assassinatos entre facções; execuções de autoridades; tráfico de armas; domínio de áreas comunitárias; corrupção de autoridades e muita coisa mais (como tráfico de cigarros).

Mas o pior do narcotráfico é a corrupção da juventude, seja pelo vício (nas escolas, universidades, nas ruas, nas praças e nos parques), seja nas comunidades mais pobres, onde jovens são recrutados como “soldados do tráfico” e onde as mocinhas são objeto de assédio pelos chefes das facções.

Quem tem um drogadito na família conhece a maldição que afeta toda ela, e não somente o que se droga.

Não foi por acaso que Fidel Castro tornou Cuba uma base do tráfico para os EUA. Uma face de seu combate contra o “imperialismo” era o enfraquecimento da juventude norte-americana pelo vício.

Máfias tropicais e o general “El Pollo”

A rentabilidade alta dessa atividade criminosa faz com que seu poderio ameace a própria existência do Estado. Isso já aconteceu na Colômbia, onde existiu (e de certa forma ainda existe) até um exército do tráfico — as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Já aconteceu na Bolívia, e acontece agora na Venezuela.

A experiência mundial já demonstrou que o tráfico só se combate com tolerância zero, seja em Nova York, seja em San Salvador.

Não admira que no Brasil tenha surgido, há relativamente pouco tempo, uma organização do tráfico — o PCC — que não para de crescer e já é uma multinacional do crime. A tolerância dos poderes do Estado, entre nós, com essa atividade, é enorme.

Um episódio até recente desse submundo que cada vez mais emerge, tem roteiro de cinema.

Quando Hugo Chávez reinava na Venezuela, seu homem forte era um general do Exército venezuelano, que chefiava os Serviços Secretos. Mas desempenhava outra função, não pública e muito mais importante, segundo a Inteligência dos EUA, que não costuma se enganar: era também o chefe do narcotráfico venezuelano, designado por Chávez, principalmente para coordenar a remessa de cocaína para os EUA, que vinha da Colômbia e da Bolívia e seguia diretamente ou via Cuba e Panamá, para a Flórida e adjacências.

O general chama-se Hugo Armando Carvajal Barrios, de 65 anos, tem o apelido de “El Pollo”. Está preso nos EUA. Exerceu as suas funções por sete anos, junto a Chávez, e despertou ciúmes no círculo mais íntimo do ditador, pelos poderes que detinha. Esses ciúmes teriam provocado uma desavença de El Pollo com Nicolás Maduro, que sucedeu a Chávez, morto em 2013.

O fato é que El Pollo se afastou de Maduro, chegou a encenar uma aproximação com a oposição venezuelana e acabou fugindo para a Espanha, temendo ser morto. Ali viveu clandestino, pois havia um pedido de extradição contra ele, dos EUA, justamente por atividade de tráfico e terrorismo. O prêmio por sua cabeça era alto: 10 milhões de dólares por informação segura que levasse à sua prisão.

Denunciado por uma vizinha, segundo a imprensa, foi preso em 2021 e extraditado para os EUA, em 2023.

Antes, tentando evitar a sua entrega aos EUA, El Pollo propôs ao juízo espanhol uma delação, e adiantou algumas de suas informações bombásticas: o dinheiro sujo venezuelano financiou a esquerda pelo mundo afora.

Uma jornalista espanhola (Cristina Segui, do jornal “OK Diário”, de Madri), ainda em 2021, publicou a lista: Cristina Kirchner, na Argentina, Evo Morales, na Bolívia, Fernando Lugo, no Paraguai, José Luiz Zapatero, na própria Espanha e… Lula da Silva, no Brasil, além de um partido de esquerda italiano.

A “grande imprensa” brasileira silenciou. Na semana passada, depois de dois anos preso nos EUA, El Pollo fez parte de sua delação premiada. Repetiu, palavra por palavra, o que havia dito na Espanha, inclusive sobre o financiamento que havia promovido, com dinheiro escuso, para as eleições de Lula da Silva.

A notícia explodiu na imprensa internacional. Valeu até pronunciamento presidencial na Argentina. Uma jornalista brasileira, exilada nos EUA (Elisa Robson), conseguiu entrevistar El Pollo na prisão.

O general repetiu todas as acusações, mais uma vez. Notícia verdadeiramente explosiva, mas não aqui. Agora é que não sai mesmo nada na “grande imprensa”. Antes, os jornalistas “companheiros” não publicavam, a não ser que os donos dos jornais mandassem. Agora, com os bilhões de dinheiro público irrigando a imprensa, qual dono de jornal irá desagradar o governo? — pergunta-se.

INSS e golpe contra os aposentados

Mais uma prova desse silêncio obsequioso vem do escândalo do INSS, que também foi transformado em caluda.

Não existe nada mais abjeto do que roubar o pouco que possuem ou percebem velhinhos aposentados, deficientes físicos ou mentais, índios inimputáveis e outros desvalidos.

Mas é o que uma quadrilha infiltrada em entidades sindicais vem fazendo. Roubou bilhões, segundo levantamentos feitos pela Polícia Federal, em brilhante operação.

Algo para manchetes diárias garrafais, mas nada. Silêncio na “grande imprensa”. Afinal, não convém tratar disso.

Um dos citados nas denúncias é irmão de Lula da Silva. Frei Chico (que não é frei), por sinal, nem interrogado foi na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada para investigar a façanha.

Blindagem total por parte de governo, imprensa e Justiça. O que seria pior flagelo para o brasileiro lutador: o tráfico ou a corrupção? Não há como escolher: os dois estão por aqui, para tristeza de quem trabalha e é correto.