Ainda estão frescas na memória da população as demonstrações um tanto quanto patéticas de admiração extrema de Jair Bolsonaro por Donald Trump. Em setembro de 2019, na sala GA-200 da Assembleia Geral da ONU, por exemplo, o então presidente brasileiro soltou um constrangedor “I love you” para o norte-americano, que devolveu com um “Nice to see you”, algo como “Bom te ver”.

As demonstrações de “amor” também vinham em forma institucional e por meio de ações de seu governo, tudo para, aparentemente, conseguir um mínimo de atenção e consideração por parte do presidente dos EUA. Ainda em 2019, em um gesto de generosidade com os Estados Unidos, o governo brasileiro decidiu ampliar de 600 milhões para 750 milhões de litros a cota anual de importação de etanol com redução tarifária, beneficiando diretamente os norte-americanos, maiores exportadores do produto ao Brasil.

Além disso, o Ministério da Economia prorrogou, à época, uma isenção concedida aos EUA de uma tarifa de 20% cobrada sobre a importação de etanol. Ao mesmo tempo em que beneficiou Trump, a medida prejudicou produtores do Nordeste brasileiro.

Cada movimentação internacional, fosse ela comercial ou diplomática, do governo Bolsonaro parecia ter como único intuito aproximar-se do presidente Trump, e não do governo norte-americano em si. O que, diga-se de passagem, não era exatamente um erro, desde que essa aproximação gerasse frutos, ou ao menos alguma reciprocidade, para o Brasil. O que nunca aconteceu.

Donald Trump é visto por analistas e especialistas como um homem pragmático e extremamente vaidoso. O político, dono de um império na rede hoteleira de luxo, imóveis de alto padrão e campos de golfe, nunca faz amigos: faz aliados. E os mantém sob sua simpatia desde que possam oferecer algo a ele ou ao seu governo.

O ponto é que, assim como seu pai, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, desde o início do ano morando nos Estados Unidos, cometeu o mesmo erro e provou não ter aprendido nada sobre o líder norte-americano.

Há meses, Eduardo trabalha assumidamente para distanciar o governo norte-americano do brasileiro, liderado por Lula, nêmesis político de Jair Bolsonaro. O parlamentar atribuiu a si mesmo, e à sua “grande influência”, a sobretaxa imposta por Trump a produtos brasileiros na importação, bem como as sanções da Lei Magnitsky contra o ministro do STF Alexandre de Moraes e sua esposa.

Eduardo se posicionava como um “amigo do rei”, bastando um pedido simples para que viessem punições mais pesadas contra o Brasil e qualquer brasileiro que ousasse atrapalhar seu grande objetivo: livrar Jair Bolsonaro das consequências de seus atos.

O ex-presidente da República cumpre pena de 27 anos em regime fechado por planejar e tentar um golpe de Estado, e viu em Trump uma tábua de salvação para livrar a cara do pai. As ameaças de mais sanções, ou da intensificação das que já estavam em vigor, eram diárias. Como um portador da chave do cofre, Eduardo alardeava: soltem meu pai, que livro o Brasil da fúria de Trump.

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Reunião entre Trump e Lula. | Foto: Planalto

Mas bastou um mínimo de aproximação entre Lula e Trump para o castelo de ilusão de poder da família Bolsonaro desmoronar ruidosamente.

Após poucos encontros presenciais e algumas ligações, um vínculo de diálogo, que antes parecia altamente improvável, foi estabelecido entre os líderes do Brasil e dos EUA, levando ao fim da escalada de tensões e sanções de um país contra o outro.

O primeiro sinal positivo de Trump em direção ao Brasil acendeu o alerta máximo entre bolsonaristas. Em uma canetada, o presidente norte-americano recuou e removeu a sobretaxa de 40% sobre produtos brasileiros da agricultura, livrando itens como café, chá e frutas. Na ocasião, Eduardo minimizou o movimento: “Não foi um sucesso da diplomacia brasileira. Foram fatores internos que estão afetando muito o bolso do trabalhador americano, que, por consequência, fazem com que o pessoal do movimento MAGA pressione o presidente Trump a retirar essas tarifas”, disse o parlamentar, em entrevista ao portal Jota.

No mês seguinte, após elogios trocados entre os dois presidentes, principalmente por parte de Trump em relação a Lula, o norte-americano voltou atrás, novamente, nas sanções contra o Brasil. Dessa vez, Trump retirou da lista de sancionados pela Magnitsky o ministro Alexandre de Moraes e sua mulher.

A iniciativa foi o golpe de misericórdia no discurso bolsonarista de “influência na Casa Branca”. Pelo X, Eduardo publicou uma manifestação. Na nota, o parlamentar afirmou ter recebido “com pesar” a notícia de que Moraes, tido por ele como algoz de seu pai, não mais figurava na relação de sancionados pelos EUA. O sentimento revelado por Eduardo era esperado e compreensível. O que chamou atenção, porém, foi o culpado da vez.

Na nota, o filho do ex-presidente diz lamentar “que a sociedade brasileira, diante da janela de oportunidades que teve em mãos, não tenha conseguido construir a unidade política necessária para enfrentar seus próprios problemas estruturais”. “A falta de coesão interna e o insuficiente apoio às iniciativas conduzidas no exterior contribuíram para o agravamento da situação”, completa. Desorientado e furioso, Eduardo Bolsonaro culpou a população brasileira pela queda das sanções norte-americanas contra Alexandre de Moraes.

Acontece que as movimentações recentes do presidente norte-americano Donald Trump, aliadas às reações desesperadas do clã Bolsonaro, expuseram uma realidade hoje tão clara quanto a luz do dia: caiu com estrondo o último pilar de sustentação do discurso de poder dos Bolsonaro. Abandonados pelo último líder relevante que ainda prestava atenção aos seus apelos, os Bolsonaro foram deixados à própria sorte.

A lição maior a ser aprendida, mas que muito provavelmente não será absorvida pelo clã familiar, é a de que bajular não é estabelecer vínculos diplomáticos. Não é só Trump: ninguém gosta de quem abre mão da própria dignidade.