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Há pouco mais de dois anos, sob grande estardalhaço e em meio a sérias acusações de irregularidades em contratos, denúncias de cabides de indicações políticas e ineficiência na coleta de lixo, a Câmara Municipal de Goiânia oficializava a instalação de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar a Companhia de Urbanização de Goiânia, a Comurg.

A CEI da Comurg, como ficou conhecida, nasceu em um cenário perfeito para cumprir o objetivo a que se propôs: investigar e combater irregularidades na empresa. Afinal, sacos de lixo se amontoavam pelas ruas, a cidade estava imunda e uma população insatisfeita e sedenta por soluções alimentava o furor dos vereadores, sobretudo os de oposição, em escancarar o que estivesse errado na Comurg.

Cinco meses, 30 reuniões e 18 oitivas depois, o desfecho foi mais insosso e melancólico do que se não tivesse existido. Com membros da Comissão de Inquérito empossados em secretarias ou agraciados pelo Executivo, então liderado por um Rogério Cruz já em início de desespero, com cargos e indicações, o relatório final foi entregue sem qualquer indiciamento.

Conforme o documento, que pareceu mais justificar seu esvaziamento do que corresponder ao furor inicial que deu origem à CEI, a finalidade não era responsabilizar os envolvidos em falcatruas, mas apenas “reunir elementos necessários” para que o Ministério Público pudesse adotar as medidas cabíveis perante o Poder Judiciário.

O curioso é que, em maio do ano passado, nove meses após a aprovação do relatório final, o resultado dos trabalhos sequer havia sido encaminhado aos órgãos competentes: Ministério Público de Goiás, Paço Municipal e Tribunal de Contas dos Municípios.

O gosto que restou à população foi amargo, rançoso. A imagem deixada foi a de mais uma CEI criada para colocar a faca no pescoço do prefeito e que, após o apaziguamento dos ânimos entre Legislativo e Executivo, acabou em pizza.

Em agosto de 2025, uma nova CEI surgiu na Câmara Municipal. Desta vez, para investigar supostas irregularidades na execução do contrato de limpeza urbana em Goiânia. E, mais uma vez, a população parece duvidar da “nobreza” do motivo que levou à sua criação.

É inevitável notar que a investigação nasceu em meio a um clima de animosidade entre Legislativo e Executivo. Diz-se, inclusive, que o empenho do Paço em tornar mais rígido o controle das emendas e as constantes negativas do prefeito em ampliar os recursos para indicações políticas solicitadas pelos vereadores teriam deixado muita gente de nariz torcido.

Diz-se nos bastidores que o próprio líder do prefeito, Sandro Mabel, hoje já destituído da função, teria sido um dos maiores entusiastas da CEI justamente para aumentar a pressão sobre o Executivo pela liberação de benefícios.

É preciso ser justo: comissões de inquérito criadas para desgastar o Executivo e finalizadas em pizza não são exclusividade do Legislativo goianiense. Quem não se lembra da CPI da Covid? Concluiu seu relatório quando o Brasil ultrapassava 600 mil mortos pela doença, apontou negligência na condução da pandemia por parte do governo federal, indiciou o então presidente e outros 60 nomes, mas não resultou em punição efetiva.

Cabe aqui destacar: é inegável a importância das comissões de inquérito para a manutenção do Estado Democrático de Direito. É delas a competência, no âmbito do Legislativo, de investigar, fiscalizar e apontar os erros, com os limites impostos pela Constituição e pelos regimentos internos. No entanto, tão importante quanto instaurá-las é garantir que surjam por motivações legítimas e que, após sua conclusão, os desmandos e crimes por elas descobertos sejam de fato levados a sério.