De olho em 2022, Bolsonaro observa opinião pública para intervir na Petrobras e tirar foco da pandemia

28 fevereiro 2021 às 00h00

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Queda da popularidade em janeiro com fim do auxílio emergencial e avanço de casos e mortes por Covid-19 começa a ser invertida com presidente atento ao eleitorado favorável a ação do governo na tabela de preço dos combustíveis
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não age no comando do Palácio do Planalto como um solucionador de problemas. Não é e nunca será um gestor público, mesmo que democraticamente eleito para o cargo que ocupa por quatro anos – talvez por mais quatro a partir de 2023. Bolsonaro responde à queda ou alta de sua popularidade e aprovação. E janeiro foi um mês bastante desfavorável para o presidente da República com o fim do pagamento do auxílio emergencial e o agravamento da pandemia da Covid-19 no Brasil.
No final de janeiro, a pesquisa Datafolha mostrou que a avaliação do presidente como ruim ou péssimo chegou a 40% desde o início de dezembro, quando o índice negativo era de 32%. O crescimento de oito pontos percentuais na rejeição à gestão Bolsonaro na Datafolha veio acompanhado com queda de 6 pontos, de 37% para 31%, entre os brasileiros que avaliam o governo do presidente como bom ou ótimo.
Quando chegamos a 8 de fevereiro, a pesquisa XP/Ipespe confirmou a tendência de queda na boa avaliação do presidente junto à opinião pública em 2021. Aqueles que consideram o governo Bolsonaro ruim ou péssimo subiram de 40% em janeiro para 42% neste mês no levantamento da XP. Os mesmos dois pontos oscilaram negativamente na opinião de quem considera a gestão Bolsonaro boa ou ótima, de 32% para 30%.
Avaliação estratificada
Alguns dados da pesquisa XP/Ipespe são interessantes para entender o momento em que o presidente Jair Bolsonaro anuncia que irá intervir na política de preços e na presidência da Petrobras. Entre as pessoas que recebem até dois salários mínimos, a avaliação ruim ou péssima subiu de 39% para 45%, uma alta de seis pontos. No Nordeste, a reprovação à gestão Bolsonaro saltou de 43% para 48%. Nas regiões Norte e Centro-Oeste, o ruim e péssimo atingiu alta de oito pontos, de 32% em janeiro para 40% no início de fevereiro.
Os equívocos e a negligência do governo Bolsonaro no combate à pandemia da Covid-19 começaram a pesar mais para a popularidade do presidente no início de 2021, quando chegamos ao pior momento da crise sanitária causada pela doença no País. A falta de vacinas compradas pelo Ministério da Saúde começa a cobrar seu preço.
A parcela da população, que varia de 33 milhões a 50 milhões de desempregados e informais, que ficou sem renda com o término das parcelas do auxílio emergencial sentiu na pele a demora na tomada de atitude da gestão Bolsonaro diante da pandemia, com um presidente que prefere manter o discurso de negação dos benefícios do uso da máscara, do distanciamento social e da vacinação na prevenção à Covid-19.
Guerra ao diesel
Quando a Petrobras anunciou o quarto aumento seguido em 2021 nos preços dos combustíveis nas refinarias, o presidente já dedicava todos seus esforços para dedicar a atenção de seus discursos à guerra do diesel, gasolina e etanol com governadores. Principalmente o chefe do Executivo de São Paulo, João Doria (PSDB), que havia se destacado por iniciar a vacinação contra a Covid-19 antes do governo federal. Bolsonaro retomou a narrativa de que o preço em alta dos combustíveis tinha como responsável a alíquota diferenciada do ICMS cobrado pelos Estados.
Acertou em parte do problema, mas tentava, a partir daquele momento, fugir da responsabilidade por escancarar que o preço dos combustíveis no Brasil, desde o governo Michel Temer (MDB), foi indexado ao valor do barril de petróleo em dólar. Se a cotação do combustível sobe lá fora, automaticamente a Petrobras é obrigada a reajustar, conta que é repassada para as refinarias, o que aumenta o custo do transporte e, no dia a dia da população, encarece o litro da gasolina, do etanol e do diesel no posto.
Se Bolsonaro fosse de fato um liberal, o que só acreditou mesmo quem quis se fingir de inocente, como a Faria Lima e grande parte do mercado – apoiadores da eleição do presidente em 2018 em defesa do economista Paulo Guedes como o guru financeiro do presidente (o que se comprovou uma mentira de campanha) –, jamais teria interferido em 2019 no preço do diesel ou batido no peito e anunciado há dez dias que iria mexer na Petrobras. Valorizaria a política de privatizações das refinarias proposta pela equipe de Guedes, da qual quase ninguém permanece no governo, e daria um sinal aos investidores de que podem investir no Brasil por meio das ações da estatal na bolsa de valores.
Preço de mercado?
Mas Bolsonaro não se preocupa com a valorização do preço de mercado da Petrobras ou com as dificuldades econômicas advindas de emitir sinal de desconfiança e insegurança política aos investidores brasileiros e estrangeiros. As ações do presidente são voltadas exclusivamente para garantir a reeleição em 2022, proteger sua família de investigações e ver o apoio populacional crescer.
E para nós, que acordamos de manhã e precisamos abastecer o carro ou a moto para trabalhar, pouco importa se congelar o preço do diesel por dois meses pode causar um prejuízo de R$ 3 bilhões aos cofres públicos – o que Paulo Guedes quer compensar com o fim da obrigação de aplicar o mínimo constitucional com saúde e educação do orçamento da União, dos Estados e municípios.
Nós queremos que nosso salário dê para bancar o custo do supermercado, que está pela hora da morte pela alta do dólar frente à desvalorização do real, do transporte, que varia de acordo com o preço do barril do petróleo no mundo, e ter gás e energia para comer e ver TV ou usar a internet em casa. Quando Bolsonaro anuncia a indicação de um novo presidente para a Petrobras e que, a partir de agora, irá interferir no preço dos combustíveis, o resultado imediato é o aumento do apoio da população, impactada até o pescoço com as restrições econômicas agravadas pela pandemia.
Apoio popular
A reação imediata é um apoio de 56% (pesquisa XP) a 60,5% (Idea Big Data) dos brasileiros ao congelamento de preços dos combustíveis pelo governo federal. 74% da base de eleitores do presidente Bolsonaro apoia a intervenção no preço da gasolina e do diesel, assim como 64% dos evangélicos, outro eleitorado bolsonarista, concorda com a canetada na política de reajuste dos combustíveis da Petrobras. Entre a população pertencente à classe C, 65% defendem que o chefe do Executivo nacional interfira na alta dos combustíveis.
Não espere da população que se recorde de quando a então presidente Dilma Rousseff (PT) congelou o preço da gasolina, mesmo alertada por aliados que a intervenção quebraria a indústria sucroalcooleira brasileira, o que gerou prejuízos até hoje percebidos na economia. A ação de Bolsonaro adotada há uma semana caminha para a mesma direção. E tem uma explicação mais do que clara: Bolsonaro não é nem nunca será liberal, não apoia o plano de privatizações, enxugamento do tamanho do Estado ou quer “mais Brasil e menos Brasília”, como iludiu a muitos na campanha de 2018.
O presidente Jair Bolsonaro quer estatais como a Petrobras à sua disposição para usar quando precisar aumentar sua popularidade e margem de intenção de votos. Nada mais. Porque no dia que 1.582 pessoas tiveram a morte confirmada no Brasil por Covid-19, Bolsonaro usou dados falsos para criticar o uso de máscaras e o distanciamento social na pandemia. Bolsonaro não se preocupa se o óleo ou a carne estão com preços impraticáveis para as finanças mensais dos brasileiros. O presidente quer ser reeleito. E se o custo da intervenção na política de preços da Petrobras render votos, assim será.