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O PL mantém uma das maiores bancadas do Congresso, com mais de 90 deputados federais, ficando atrás apenas da recém-criada federação UB-PP. Desde 2021 (quando Jair Bolsonaro se filiou), seus inúmeros representantes têm surfado na onda do bolsonarismo para se eleger e reeleger, sempre sob os mesmos preceitos ideológicos de “Deus, Pátria e Família”. O bolsonarismo, aliás, parecer ser hoje o único sustentáculo da legenda, mesmo com o afastamento político de seu líder maior: inelegível, Jair Bolsonaro cumpre prisão domiciliar e está a poucos passos de uma condenação por tentativa de golpe de Estado.

O que por muito tempo foi trunfo do PL, a força da muitos dos quadros eleitos não por trajetória política ou atuação social, mas pelo simples “crachá” bolsonarista, agora pode se transformar em fraqueza. Isso porque vários de seus mandatários, em diferentes estados e esferas de poder, enfrentam sérios problemas na Justiça, correndo o risco não apenas de perder mandatos, mas também de ficarem afastados da política por um longo período. Em Goiás, o cenário não é diferente.

Nas eleições de 2022, o youtuber e professor de inglês Gustavo Gayer foi o segundo deputado federal mais votado do estado, ficando atrás apenas da jornalista Silvye Alves. Com 200,5 mil votos, estreou na política já ocupando uma cadeira na Câmara. Sua ascensão foi meteórica: amigo pessoal de Bolsonaro, Gayer se tornou um dos nomes de maior destaque do PL, ao lado do jovem deputado Nikolas Ferreira. Ambos protagonizam discursos inflamados (muitas vezes de tom teatral) no plenário da Câmara, com falas recortadas em vídeos que viralizam e mantêm mobilizada a militância bolsonarista, tanto em Brasília quanto nas redes sociais.

Não à toa, em 2024 Gayer chegou a ser cotado como principal nome para disputar a Prefeitura de Goiânia, projeto que fortaleceria o bolsonarismo no Executivo municipal. Porém, na reta final, seu nome foi substituído pelo do deputado estadual cassado Fred Rodrigues, derrotado no segundo turno pelo empresário Sandro Mabel.

Diz-se que dois fatores levaram à escolha de Bolsonaro por Fred em detrimento de Gayer. Primeiro, a necessidade de manter o deputado federal em Brasília, como voz ativa na oposição ao governo Lula. Segundo, as incertezas jurídicas que pairam sobre Gayer: há algum tempo circula nos bastidores do PL e em Brasília a possibilidade de ele perder o mandato.

De fato, o deputado enfrenta uma série de processos. Tornou-se réu após o senador Vanderlan Cardoso apresentar queixa-crime por calúnia, difamação e injúria em vídeo publicado nas redes sociais. Além disso, foi alvo de investigação que resultou em mandados de busca e apreensão por suspeita de desvio de cotas parlamentares.

Bolsonaro e Fred Rodrigues, em 2024 | Foto: Guilherme Alves/ jornal Opção

Agora, soma-se a isso uma nova frente de desgaste: na última sexta-feira, 15, o presidente da Câmara, Hugo Motta, enviou ao Conselho de Ética 20 pedidos de abertura de processos por quebra de decoro contra 11 deputados, incluindo Gayer. O pedido, feito pelo PT, alega que o parlamentar distorceu uma fala do presidente Lula e proferiu ofensas contra Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann, Davi Alcolumbre e o próprio Hugo Motta, chamando Lula de “cafetão” e comparando Gleisi a um “objeto sexual”.

Embora o rito de cassação no Conselho de Ética seja demorado e repleto de etapas, além de boa parte do colegiado da comissão ser do PL, os efeitos para Gayer podem ser especialmente danosos, comprometendo não só sua carreira, mas também os planos do PL em Goiás. O partido deseja lançá-lo candidato ao Senado em 2026 e cogita até uma aliança com o governador Ronaldo Caiado, cenário em que abriria mão de Wilder Morais para o governo, apoiando Daniel Vilela, em troca do apoio da base caiadista a Gayer para o Senado.

Esse plano, no entanto, agora está ameaçado. Com dois poderes – Legislativo e Judiciário – colocando em risco seu mandato e até sua elegibilidade, o PL goiano precisará recalcular a rota. A primeira medida deve ser contestar a resolução da Executiva Nacional que, neste mês, proibiu parlamentares de apoiar pré-candidaturas de outros partidos. Essa regra, com ou sem Gayer, inviabiliza alianças com a base caiadista e pode isolar o PL não só em Goiás, mas em diversos estados.

A segunda alternativa é reavaliar e voltar a considerar o nome do vereador Vitor Hugo como possível candidato ao Senado. Sem Gayer na disputa, uma das vagas governistas ao Senado ficaria em aberto. Alguns nomes interessados em ir para o Senado Federal, ouvidos pelo Jornal Opção, inclusive, chegaram a admitir satisfação com o risco de cassação de Gayer, enxergando na crise uma oportunidade de se projetar com apoio da base.

Independentemente do desfecho, o PL precisa reconhecer que já não ocupa o patamar confortável em que esteve nas últimas eleições. No cenário nacional, seu principal líder caminha para a prisão e se recusa a escolher um sucessor. No regional, uma de suas maiores estrelas em Goiás pode ficar sem mandato e inelegível. E se (ou quando?) quando essas situações se concretizarem, o risco de debandada de filiados será enorme. Na melhor das hipóteses, o partido enfrentará turbulências e um desgaste irreversível, que inevitavelmente se refletirá nas urnas.

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