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Por Wellington Hannibal, Hermes Willyan Parreira Claro, José Silonardo Pereira, Carolina Fontoura,
Ana Claudia Bernardes Dias, Carolina Alves, Lucas Sampaio, Isabelle Carvalho Pimenta
Especial para o Jornal Opção

O Brasil abriga uma das faunas de mamíferos mais ricas do planeta, com aproximadamente 785 espécies reconhecidas, distribuídas em muitos grupos diferentes. Um passo fundamental para o avanço do conhecimento sobre essa mastofauna regional é a elaboração de listas de espécies por unidade federativa, as quais mobilizam redes de pesquisadores e instituições voltadas ao inventário da biodiversidade local, e já estão publicadas as listas de mamíferos para os estados de Goiás  e Mato Grosso. Mas é preciso ampliar ainda mais essa amplitude geográfica. Nesse sentido, a Bacia do Rio Araguaia é uma das mais importantes do Brasil, atravessando os Estados de Goiás, Mato Grosso, Pará e Tocantins. Abrangendo áreas de Cerrado e Amazônia e criando conexões entre esses biomas, essa região abriga uma rica biodiversidade — muito dela ainda pouco conhecida pelo grande público, mas já ameaçada de extinção!

Foi para desvendar parte dessa biodiversidade que pesquisadores do Laboratório de Ecologia e Biogeografia de Mamíferos da Universidade Estadual de Goiás (UEG) integraram a equipe do programa “Araguaia Vivo 2030” (@araguaiavivo), financiado pela FAPEG e executado pela TWRA, e do Programa “PPBio Araguaia” (@ppbio.araguaia) financiado pelo CNPq, realizaram expedições ao longo da bacia entre 2024 e 2025. Nosso objetivo: registrar os mamíferos que vivem nessa região e ajudar a entender como protegê-los melhor.

Expedições no Alto e Médio Araguaia

Até o momento, as coletas ocorreram em duas partes distintas do rio: o Alto Araguaia (em Goiás e Mato Grosso) e Médio Araguaia (entre Goiás, Mato Grosso e Tocantins). Percorremos diferentes tipos de vegetação nativa, como matas de galeria, cerradões e áreas campestres, inseridas em meio a fazendas, plantações e cidades.

Mapa da bacia do Rio Araguaia com destaque para os locais (pontos) de monitoramento de mamíferos no Alto Araguaia (Alto Araguaia [MT], Ponte Branca [MT] e Baliza [GO]) e Médio Araguaia (Aruanã [GO], Cocalinho [MT], Nova Crixás [GO], Nova Nazaré [MT], Sandolândia [TO], Lagoa da Confusão [TO] e Pium [TO]) | Foto: Acervo Araguaia Vivo

Para encontrar os animais, usamos diferentes estratégias: armadilhas específicas para a captura de pequenos mamíferos como ratos e gambás, armadilhas fotográficas para flagrar espécies maiores, redes de neblina para morcegos e até rastreamento por pegadas, fezes e sons. Todo o material coletado foi encaminhado à Coleção de Mamíferos da Universidade Estadual de Goiás [CMUEG], que ajuda a conservar e estudar a fauna brasileira.

Armadilhas convencionais, gaiola de arame e Sherman para a captura de pequenos roedores e marsupiais, e armadilha fotográfica para foto e vídeo de mamíferos | Foto: Acervo Araguaia Vivo

Mais de 40 espécies já registradas

O esforço já valeu a pena. No total, identificamos 41 espécies de mamíferos, distribuídas em 17 famílias e 9 ordens biológicas. Os grupos mais numerosos foram os roedores (capivara, cutia, paca e ratos do mato), os marsupiais (gambás, cuícas e catitas), os carnívoros (onças, cachorros-do-mato, quatis e iraras) e os artiodátilos (como veados e queixadas). Os marsupiais e pequenos roedores foram registrados principalmente pela captura nas armadilhas convencionais, enquanto os mamíferos de médio e grande porte foram registrados por meio das armadilhas fotográficas, como podemos ver nas imagens a seguir.

Entre os destaques estão espécies vulneráveis à extinção, como a onça-pintada (Panthera onca), o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), a anta (Tapirus terrestris), o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus) e o queixada (Tayassu pecari). Essas espécies indicam que, mesmo pressionada por atividades humanas, a região ainda serve como refúgio para animais de grande porte.

Mamíferos de médio e grande porte registradas na bacia do rio Araguaia por meio de armadilhas fotográficas: a) cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), b) onça-pintada (Panthera onca), c) quati (Nasua nasua), d) mão-pelada (Procyon cancrivorus), e) tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), f) tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla), g) capivara (Hydrochoerus hydrochaeris), h) paca (Cuniculus paca), i) cotia (Dasyprocta azarae), j) anta (Tapirus terrestris), k) queixada (Tayassu pecari), e l) cateto (Dicotyles tajacu) | Foto: Acervo Araguaia Vivo

O que aprendemos com os mamíferos do Araguaia

Este levantamento faz parte de duas grandes iniciativas de pesquisa e conservação no Araguaia, de modo que esses esforços ajudam a preencher lacunas de conhecimento sobre a fauna do Centro-Oeste, especialmente em regiões pouco estudadas do Cerrado e Amazônia. Os dados coletados podem orientar políticas públicas, criação de áreas protegidas e ações educativas voltadas à valorização da natureza local.

A fauna da Bacia do Araguaia é rica, diversa e cheia de espécies-chave para o equilíbrio dos ecossistemas. Esse trabalho mostra que, mesmo diante da expansão agrícola e da urbanização, ainda existem áreas que funcionam como abrigo para espécies ameaçadas. Preservar essa biodiversidade é preservar o próprio futuro do Cerrado e das populações que dele dependem. Conhecer os mamíferos do Araguaia é um passo importante nesse caminho.

Autores do artigo

Wellington Hannibal – Professor na Universidade Estadual de Goiás (UEG), pesquisador voluntário no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”
Hermes Willyan Parreira ClaroDoutorando em Ciências Ambientais (UFG), pesquisador voluntário no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”
José Silonardo Pereira – Doutorando em Biodiversidade Animal (UFG), pesquisador voluntário no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”
Carolina FontouraMestra em Biodiversidade e Conservação (IF-Goiano), pesquisadora voluntária no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”
Ana Claudia Bernardes DiasDoutoranda em Ecologia e Evolução (UFG), pesquisadora voluntária no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”
Carolina AlvesDoutoranda em Biodiversidade Animal (UFG), pesquisadora voluntária no “PPBio Araguaia” e no “Araguaia Vivo”Araguaia”
Lucas SampaioGraduando em Ciências Biológicas (UEG)
Isabelle Carvalho Pimenta – Mestranda em Biodiversidade Animal (UFG)