COMPARTILHAR

por Lígia Pereira Borges de Mesquita, Lívia Maria Oliveira Azeredo,
Vitória Cristhina da Silva Santos, João Carlos Nabout, Priscilla de Carvalho*
Especial para o Jornal Opção

Macrófitas aquáticas são plantas que possuem diferentes graus de adaptações (morfológicas e fisiológicas) que permitem que estas colonizem os ambientes aquáticos, tais como rios, lagos, pântanos e áreas alagadas. Elas são classificadas em diferentes grupos ecológicos, refletindo o grau de adaptação de cada espécie ao ambiente aquático, sendo: espécies emergentes (plantas enraizadas no sedimento, com folhas fora da água), flutuantes livres (plantas que flutuam na superfície da água), submersas enraizadas (plantas enraizadas no sedimento e que crescem totalmente submersas na água), submersas livres (plantas não enraizadas que permanecem submersas na água) e enraizadas com folhas flutuantes (plantas enraizadas no sedimento e com folhas flutuando na superfície da água).

Diagrama

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.
Grupos ecológicos das macrófitas aquáticas | Figura modificada de Thomaz e Bini 2003

A coleta das plantas aquáticas foi realizada com o uso de uma embarcação de baixa velocidade que percorria todo o perímetro das lagoas, quando essas plantas eram observadas elas eram coletadas para serem identificadas. Essas coletas foram feitas em todas as 150 lagoas estudadas. Além do levantamento da riqueza de espécies de macrófitas, alguns outros dados relacionados a essas plantas também foram coletados, como a comunidade zooplanctônica que usa os bancos de macrófitas como moradia e dados da cobertura vegetal capturados com o uso de drones. 

Nos últimos 3 anos (2023, 2024 e 2025) a equipe do programa “Araguaia Vivo 2030” (@araguaiavivo), financiado pela FAPEG e executado pela TWRA, e do Programa “PPBio Araguaia” (@ppbio.araguaia) e do INCT em Ecologia, Evolução e Conservação da Biodiversidade (estes dois últimos financiados pelo CNPq), tem realizado o levantamento das comunidades de macrófitas aquáticas em 150 lagoas na planície de inundação do Rio Araguaia. 

A map of a large white map with black and red lines

Description automatically generated
Mapa do esforço de coleta de macrófitas aquáticas na última expedição “Araguaia Vivo 2030”

As macrófitas aquáticas têm sido amostradas na bacia Tocantins-Araguaia há muitos anos e, em um trabalho publicado recentemente, os pesquisadores mapearam todas as coletas já registradas de macrófitas aquáticas na bacia Tocantins-Araguaia. Nessa pesquisa os pesquisadores observaram que a primeira coleta na bacia ocorreu em 1891, em uma expedição coordenada pelo botânico inglês Spencer Le Marchant Moore. Moore atuou nos Jardins Botânicos de Kew e no Museu de História Natural de Londres, tendo realizado expedições na Austrália e no Brasil — incluindo a Expedição ao Mato Grosso — onde descreveu milhares de espécies vegetais. Desde essa expedição, foram encontrados 655 registros de esforço amostral documentados em 21 trabalhos científicos. A pesquisa também indicou que há diversas regiões na bacia Tocantins-Araguaia com poucas coletas ou até mesmo regiões ainda não amostradas. Esses resultados demonstram a importância de expedições ao Araguaia para ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade na região dessa importante bacia hidrográfica, em especial das macrófitas aquáticas.

Durante as diversas expedições do nosso grupo de pesquisa que ocorreram nos anos de 2023, 2024 e 2025 foram identificadas 48 espécies, pertencentes aos diferentes grupos ecológicos. Algumas dessas espécie tinha sido registradas poucas vezes na bacia do rio Araguaia. Por exemplo, a espécie Eichornia azurea, apresentava vários registros no Brasil, mas somente 3 registros na bacia Araguaia. Após a expedição, houve um grande aumento de novos registros na bacia, sendo que atualmente temos o registro dessa espécie em 20 locais diferentes da bacia Araguaia, conforme figura abaixo.

Registros de ocorrência de Eichornia azurea. Pontos em preto são registros antigos e já documentados pela ciência. Os pontos em vermelho são os novos pontos encontrados pela expedição do programa “Araguaia Vivo 2030”. A bacia Araguaia está destacada em azul com seus principais rios

Vamos destacar a seguir as espécies mais frequentes na região do Araguaia coletadas e estudadas por nossa equipe e descrevê-las rapidamente.

Salvinia auriculata Aubl.

Essa é a espécie mais comum na planície de inundação do Rio Araguaia, pertencente à famímila Salviniaceae, é popularmente conhecida como “orelha de onça”. S. auriculata é uma espécie flutuante livre e essa característica facilita sua dispersão, sendo levada pela corrente de água para diferentes ambientes. Além disso, podemos destacar a reprodução assexuada desta espécie, favorecendo o aumento de sua área de cobertura em curto período de tempo, caso o ambiente tenha elevadas concentrações de nutrientes. 

Foto: Acervo dos pesquisadores

Paspalum repens P.J.Bergius

Esta gramínea conhecida como “capim d´água” (família Poaceae) também é uma espécie muito comum na planície de inundação do Rio Araguaia. Essa macrófita aquática é enraizada no substrato com suas folhas flutuantes na coluna d`água e pode ser usada como forma de alimento para bovinos e equinos.

Foto: Acervo dos pesquisadores

Utricularia foliosa L.

Essa espécie de macrófita (família Lentibulariaceae) pertencente ao grupo das submersas livres e é bem comum na planície de inundação do Rio Araguaia. É uma planta caracterizada por possuir um conjunto de folhas delicadas que permanecem imergidas na coluna d`água, com uma flor amarela que se mantem acima da coluna d`água, chamando a atenção de quem á observa. Podemos destacar ainda que uma planta aquática carnívora, possuindo pequenos utrículos que capturam pequenos organismos aquáticos, digerindo-os e absorvendo seus nutrientes.

Pontederia crassipes Mart

Essa espécie, pertencente à família Pontederiaceae, é uma espécie flutuante livre que também pode ser encontrada na planície de inundação do Rio Araguaia. Esta planta aquática chama bastante atenção pela beleza, possuindo uma inflorescência lilás que se destaca entre as folhas verdes. Esta espécie é bastante popular e é comumente chamada de aguapé ou baronesa pela população local.

Foto: Acervo dos pesquisadores

A Importância Ecológica das Macrófitas Aquáticas

O crescimento excessivo de algumas espécies de macrófitas, principalmente quando há um excesso de nutrientes no ambiente aquático (eutrofização), pode resultar em prejuízos aos usos múltiplos destes ecossistemas, por exemplo, na recreação, navegação e pesca. Nestas situações, estas plantas são chamadas de “daninhas”.

Por outro lado, essas plantas desempenham diversas funções ecológicas importantes nos ecossistemas aquáticos, sendo importantes produtores primários. Juntamente com as algas, são responsáveis pela produção primária dos ambientes aquáticos, formando a base da cadeia alimentar, servindo de alimento para muitos organismos, como peixes, invertebrados e herbívoros aquáticos. Além disso, fornecem abrigo e locais de reprodução para diversas espécies aquáticas, como peixes e invertebrados, sendo responsáveis pela maior diversidade biológica na região colonizada por estas plantas. Atuam ainda como filtros naturais, melhorando a qualidade da água ao absorverem nutrientes e poluentes dissolvidos na água provenientes, por exemplo, de ações antrópicas, como o lançamento de efluentes e o escoamento de resíduos agrícolas e industriais, que são erroneamente descartados e acabam chegando nos corpos aquáticos. Por último, participam ativamente na ciclagem de nutrientes nos ecossistemas aquáticos, tendo em vista que, além da absorção de nutrientes, quando estas plantas morrem, sua decomposição libera nutrientes ao ambiente.

De fato, na planície de inundação do Rio Araguaia, alguns estudos preliminares têm demonstrado a importância da presença destas plantas na biodiversidade de alguns invertebrados aquáticos. Assim, as pesquisas realizadas por meio do Programa “Araguaia Vivo 2030” e “PPBio Araguaia” são essenciais para conhecermos a biodiversidade desta importante bacia hidrográfica, além de contribuir para a compreendermos melhor a importância destas plantas aquáticas para os múltiplos serviços ecossistêmicos.

*Lígia Pereira Borges de Mesquita – Doutoranda em Ecologia e Evolução pela Universidade Federal de Goiás e pesquisadora voluntária do Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA e do “PPBio Araguaia”

Lívia Maria Oliveira Azeredo – graduanda em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Goiás e bolsista de iniciação científica do Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA.

Vitória Cristhina da Silva Santos – graduanda em gestão ambiental pela Universidade de Brasília e bolsista de iniciação científica do Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA.

João Carlos Nabout – Professor na Universidade Estadual de Goiás, coordenador da Atividade de biodiversidade aquática no Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA, pesquisador no “PPBio Araguaia”.
Priscilla de Carvalho – Professora na Universidade Federal de Goiás, vice-coordenadora da Atividade de biodiversidade aquática no Programa “Araguaia Vivo 2030” da TWRA, pesquisadora no “PPBio Araguaia”.