Professor da UFG participa da descoberta de novo material supercondutor; resultado dá novo fôlego às pesquisas na área de energia

17 dezembro 2024 às 13h06

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Uma equipe de pesquisadores brasileiros e estadunidenses realizaram uma descoberta relevante no campo da supercondutividade. O grupo, que inclui o professor Vanuildo Silva de Carvalho do Instituto de Física da UFG, descobriu que o seleneto de ferro dopado com enxofre é um material supercondutor. A pesquisa é mais um passo para a descoberta de um material supercondutor que funcione em temperatura ambiente, o que revolucionaria vários setores ligados ao campo energético.
Em entrevista ao Jornal Opção, Vanuildo explica que a supercondutividade é um fenômeno que permite a condução de eletricidade sem a perda de energia, o que poderia resultar em baterias mais eficientes, computadores mais modernos, linhas de trem mais econômicas e rápidas, equipamentos eletromagnéticos mais duradouros entre outras revoluções em diversos setores da indústria e do cotidiano das pessoas.
Para além de Vanuildo, representando Goiás, o grupo de físicos teóricos e experimentais conta com profissionais da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da Universidade Yale, da Universidade da Califórnia e da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos. As descobertas foram publicadas em um dos periódicos de maior respeito em todo o planeta, a Nature Physics. Da equipe de treze pessoas, quatro são brasileiras, incluindo o líder do trabalho publicado neste período, Eduardo da Silva Neto, que leciona em Yale.
O grande problema que a comunidade científica enfrenta é que os materiais supercondutores conhecidos até então só funcionam em temperaturas extremamente baixas, com centenas de graus celsius abaixo de zero. Essa característica impossibilita o uso da tecnologia no cotidiano, limitando o uso da supercondutividade aos ambientes controlados e com alto custo. A descoberta do grupo de pesquisadores traz novo fôlego ao tema, já que o seleneto de ferro dopado com enxofre atinge o estado de supercondutividade em temperaturas mais próximas do ambiente.
Clique aqui e leia o artigo publicado na Nature Physics.
A pesquisa
Para explicar o que é a supercondutividade, o pesquisador do IF da UFG usa uma analogia. “É a mesma coisa de tentar se movimentar em uma rua com um monte de gente”, colocou. Vanuildo explica que o movimento não ordenado dos elétrons de uma corrente elétrica leva a colisões com os núcleos atômicos, gerando perda de parte dessa energia. “Se tem colisões entre as pessoas, você não consegue se movimentar da mesma maneira como se a rua estivesse vazia”, concluiu.
Dessa forma, com o movimento de elétrons ordenado, não existe o choque entre essas partículas e os núcleos atômicos, conservando a energia no sistema. Isso, coloca o pesquisador, é vantajoso para economizar energia e para o material se tornar supercondutor.
A pesquisa que Vanuildo participa coloca o material em estado de supercondutividade impulsionado pela nematicidade eletrônica, técnica que coloca os elétrons fluindo preferencialmente em uma única direção. “Em geral, os elétrons se movimentam em qualquer direção, mas, quando você tem essa fase nemática, os elétrons se movimentam apenas em uma única direção”, sintetizou.
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É nesse ponto que os resultados desta pesquisa se destacam: como a nematicidade eletrônica era um fundamento que existia apenas na teoria, encontrar esse material comprova seu funcionamento na prática, o que abre portas para mais descobertas fazendo uso da nematicidade eletrônica, podendo nos aproximar cada vez mais do supercondutor que funciona em temperatura ambiente.
“A gente não conhece todos os mecanismos que podem induzir essa fase supercondutora. É um mecanismo novo e, talvez, com algum tipo de truque tecnológico poderia chegar à temperatura ambiente”, explica as possibilidades que se abrem após a comprovação prática da nematicidade eletrônica.
Parte dos cálculos da teoria foi feito por Vanuildo, na UFG, enquanto a parte experimental da comprovação ficou a cargo dos pesquisadores estadunidenses, devido aos altos custos da experimentação.

O seleneto de ferro dopado com enxofre ainda precisa de temperaturas baixíssimas para atingir o estado de supercondutividade. Apesar de serem temperaturas maiores do que as anteriormente conhecidas, ainda é impraticável no cotidiano. Entretanto, “ele [o supercondutor recém descoberto] é uma prova de que existe o princípio dessa interação [supercondutividade por nematicidade eletrônica] e que essa interação pode ser relevante para obter um material que funciona à temperatura ambiente”, resumiu.
Apesar das dificuldades que se colocam na descoberta de um material supercondutor que pode ser usado em larga escala, o professor se mostra confiante. “Eu não sei dizer quantos anos, mas certamente em algum momento futuro isso [uso no cotidiano de supercondutores] vai acontecer. Cada dia mais essa temperatura de funcionamento do supercondutor acaba aumentando”, resume esperançoso.
Financiamento
Apesar da parte teórica da pesquisa ser um menos custosa do que a experimentação (que requer equipamentos de altíssimo custo), ainda há necessidade de algum suporte financeiro. “Eu cheguei a aplicar para alguns projetos aqui, para alguns editais, mas nós não conseguimos, então foi financiado com dinheiro próprio”, lamenta Vanuildo.
Apesar dos entraves, Vanuildo indica que ele e seu time continuarão a pesquisar o tema. “Outra possibilidade é dopar o seleneto de ferro com outros materiais para ver se consegue aumentar essa temperatura de funcionamento do material supercondutor”, exemplificou um caminho que o projeto pode tomar. “É um trabalho de tentativa e erro”, disse, reforçando as possíveis linhas de atuação para pesquisadores em todo o planeta.