General da ativa sugere que Exército pode intervir para “limpar” a democracia

18 setembro 2017 às 09h05

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Se o general Mourão não for punido, por sugerir uma intervenção militar, é sinal de que o comando militar concorda com suas ideias golpistas
Não. Não se trata de declarações de um general de pijama. No domingo, na “Folha de S. Paulo”, o repórter Rubens Valente publicou uma reportagem — “General do Exército ameaça ‘impor solução’ para crise política no país” — na qual menciona uma conferência do general Antônio Hamilton Mourão, na sede da maçonaria, em Brasília, cujo teor é, para a democracia, alarmante. Seu conteúdo praticamente é o mesmo de 1964. O general Mourão — o sobrenome lembra o de Olímpio Mourão, o que iniciou o golpe em 1964 — está na ativa e é secretário de Economia e Finanças do Exército. Quer dizer, ocupa um alto posto.
O general Mourão disse, segundo o registro de Rubens Valente, que “‘seus companheiros do alto comando do Exército’ entendem que uma ‘intervenção militar’ poderá ser adotada se o Judiciário ‘não solucionar o problema político’” (que seria a corrupção). “Mourão disse que poderia chegar o momento em que os militares terão que ‘impor isso’ [ação militar] e que essa ‘imposição não será fácil’. Segundo ele, seus ‘companheiros do Alto Comando do Exército avaliam que ainda não é o momento para a ação, mas ela poderá ocorrer após ‘aproximações sucessivas’”.
Texto literal do general Mourão: “Até chegar o momento em que ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos ou então nós teremos que impor isso”.
As boas intenções, como a retirada dos corruptos da cena política, às vezes correspondem a más intenções. Em 1964, dizia-se algo parecido: era preciso limpar a política dos comunistas e, sim, dos corruptos. O que os militares queriam de fato era tomar o poder. Agora se dá o mesmo? Tudo indica que não. O ministro do Exército, Eduardo Villas Boas, certamente tomará alguma providência, como tomou em 2015, ao transferir Mourão do Comando Militar do Sul da tropa para um cargo burocrático. Na época, o “Estadão” publicou: “A decisão de afastá-lo do comando foi tomada em virtude das declarações dadas a oficiais da reserva na qual fez duras críticas à classe política, ao governo e convocou os presentes para ‘o despertar de uma luta patriótica’. Em palestra, o comandante militar do Sul fez também críticas indiretas à presidente Dilma Rousseff e, ao comentar a possibilidade de impeachment de Dilma, disse que ‘a mera substituição da PR (presidente da República) não trará mudança significativa no ‘status quo’ e que ‘a vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção’”. O general Mourão é um dos defensores da memória do coronel Brilhante Ustra, morto há pouco tempo.
Se o general Mourão não for punido, por sugerir a necessidade de uma espécie de “golpe preventivo”, é sinal de que as coisas vão mesmo muito mal no Brasil. A função de uma general não é ameaçar nem “criar” a democracia perfeita. Em 21 anos, de 1964 a 1985, os militares não conseguiram produzir a Shangri-la tropical e acabar com a corrupção. O general-presidente Ernesto Geisel disse que era preciso acabar com a ditadura porque havia se tornado uma “bagunça”. Quer dizer, a derrocada da bagunça da democracia levou à bagunça da ditadura. Então, é melhor ficar mesmo com a democracia, mesmo sendo imperfeita. Antes uma democracia corrupta e inepta do que uma “democracia” tutelada por militares. (Euler de França Belém)