Nos anos 1990, Osmar Pires Martins Júnior era consultado por meio mundo na área de meio ambiente. Por diversos motivos. Entendia do assunto. Possuía as titulações, mas usava linguagem acadêmica apenas entre os especialistas, sabia traduzi-la para o público amplo. Não demorou e as autoridades descobriram que precisavam dele. Por isso, assessorou a Procuradoria-Geral de Justiça e presidiu a Agência Goiana do Meio Ambiente, hoje secretaria de Estado. Tão rápidos quanto o prestígio chegaram a inveja e os processos. O mais duradouro deles o atormentou até esta semana, quando finalmente o Tribunal de Justiça de Goiás decidiu que parte do caso deveria ser anulado.

“Osmar, na verdade, jamais cometeu ato ímprobo”, diz seu advogado Demóstenes Torres. “Por um erro do Judiciário, que deixou de cadastrar seus defensores então constituídos, ele não teve direito de se defender adequadamente contra uma sentença mal fundamentada. Dez anos depois, o TJGO reconheceu a ilegalidade”. Em suma, Osmar cumpre a pena desde 2005, quando se iniciou a perseguição: “No plano pessoal, eu e minha família arcamos com múltiplos prejuízos”, lamenta a vítima.

O advogado Caio Alcântara, sócio de Demóstenes e um dos grandes criminalistas do País, resume o caso: “O não cadastramento dos advogados foi em 2015. O processo foi julgado sem qualquer intimação válida para Osmar, que só teve ciência com a ilegal penhora em sua aposentadoria. Ainda assim, desde o começo de 2021, temos [o escritório de Demóstenes] sustentado a nulidade do processo com questões de ordem, embargos de declaração, dois agravos de instrumento e agravo interno. Isso mostra que, por mais claro que o direito pareça, é necessário persistir”.

O dano maior foi o moral, com o seu nome exposto na mídia como desonesto no imenso escritório do ódio que a internet já era uma década atrás (WhatsApp estava começando seu auge). Teve o salário suspenso em até 100% e não podia comprar fiado ou tirar financiamento para se manter porque havia restrição de créditos, ficha suja no SPC e Serasa. Perda dos direitos políticos. Proibição de contratar e de receber benefícios. Bloqueio de bens. “Até a nossa residência familiar foi submetida a penhora, assim como as verbas de aposentadoria como servidor público estadual”, conta Osmar.

O técnico ultra capacitado que estava sem condição sequer de ir ao supermercado comprar víveres foi acossado pelo Ministério Público por improbidade administrativa que nunca cometeu. O promotor de justiça ajuizou a “ação com pedido de ressarcimento por inexistente dano ao erário de R$ 10 milhões”. Com a inflação do período, somem-se 90% e teremos um aposentado que não dispunha sequer da féria do mês tendo de devolver R$ 19 milhões por um crime que não cometeu.

O desembargador José Proto de Oliveira, relator do agravo de instrumento assinado pela defesa, escreveu que “não se pode admitir que o agravante [Osmar Pires] seja prejudicado por erro processual a que não deu causa”. E concluiu: “O vício, originado por falha do próprio aparato judicial, impediu o exercício efetivo do contraditório e da ampla defesa, ocasionando prejuízo manifesto e insanável”.

O julgamento foi presidido pelo desembargador Átila Naves Amaral. Na defesa, além de Demóstenes e Caio, atuaram os advogados Elias Menta Macedo e Vitor Oliveira Dias.