Por Abílio Wolney Aires Neto
Misturando aventura, fantasia histórica e mitologia, o filme apresenta uma narrativa que parte de um mapa daquele período, conduzindo um grupo de aventureiros contemporâneos à busca do lendário “Tesouro dos Martírios”, em meio a rios, florestas, povos originários e lendas que atravessam séculos
No encontro do “Clube do Livro da UBE”, de 27 de novembro de 2025, sob a direção do Presidente, professor Ademir Luiz, a discussão de O Avesso da Pele demonstrará o quanto esse romance continua atual e necessário. Na qualidade de articulista e como pesquisador que estudou a obra no âmbito da disciplina Direito e Linguagem no IDP — elaboramos uma resenha crítica à guisa de leitura complementar — sinto-me compelido a oferecer uma análise mais densa: não apenas da narrativa, mas das tensões entre literatura, memória, racismo estrutural e o papel formativo da linguagem.
Publicado em 2020 e laureado com o Prêmio Jabuti de 2021, O Avesso da Pele narra a trajetória de uma família negra em Porto Alegre, pelo olhar de Pedro — narrador e filho de Henrique (professor) — que tenta reconstruir a vida do pai após seu assassinato numa abordagem policial. A narrativa se faz por meio de memórias, lacunas, objetos, relatos de conviventes — ao mesmo tempo que atravessa o luto, a negritude, as fraturas existenciais e os traumas que marcam não apenas uma pessoa, mas uma herança para gerações. A narrativa é estruturada de modo inusitado e potente: a voz narrativa, muitas vezes em segunda pessoa, convoca o leitor a habitar o lugar do pai — Henrique — ou a mergulhar no avesso da pele, essa parte invisível da identidade, atravessada pela história e pelo preconceito.
Embora o luto e a relação familiar — pai/filho — sejam eixos centrais, o livro denuncia com clareza a persistência do racismo estrutural no Brasil contemporâneo. A desconfiança às pessoas negras, o medo da autoridade policial, a objetificação dos corpos negros — todos esses elementos permeiam a trama como aspectos cotidianos da negritude. A figura de Henrique, professor de escola pública, também denuncia o colapso do sistema educacional e a dureza de ensinar em espaços marcados pela desigualdade, pobreza, racismo e descaso institucional. Mais do que expor o sofrimento, Tenório (via Pedro) aponta a literatura, a memória e o afeto como ferramentas de resistência. A reconstrução da trajetória paterna é também um esforço de ressignificar a negritude — não apenas como marca de dor, mas como herança identitária e de ancestralidade.
A força de O Avesso da Pele não está apenas no que é narrado, mas em como: há momentos em que o autor confere à linguagem uma dimensão poética, intensa, capaz de traduzir o trauma, o sentimento de perda, a busca por presença e a dor existencial. Por exemplo: “Às vezes você fazia um pensamento e morava nele. Afastava-se. … Construía uma casa assim. Longínqua. Dentro de si. Era esse o seu modo de lidar com as coisas. Hoje, prefiro pensar que você partiu para regressar a mim. Eu não queria apenas a sua ausência como legado. Eu queria um tipo de presença, ainda que dolorida e triste. E apesar de tudo, nesta casa, neste apartamento, você será sempre um corpo que não vai parar de morrer. Será sempre o pai que se recusa a partir.” Esse fragmento revela a ambivalência entre ausência e presença, perda e memória, dor e redenção — elementos que fazem da obra muito mais do que denúncia: fazem dela um lamento e uma esperança coletiva.
Na resenha, agora articulada, percebi que a escolha narrativa — fragmentada, carregada de memórias, lacunas, silêncio — é uma estratégia estética coerente com a temática: reconstruir o pai é também reconstruir uma identidade marcada por silêncios, apagamentos e violência. A linguagem poética e disforme dialoga com as fissuras da história. Além disso, a obra revela o risco de reduzir sujeitos negros a estereótipos, violência, criminalidade — algo que a sociedade frequentemente naturaliza, mas que a literatura de Tenório escancara em sua brutalidade e persistência. Por outro lado, a aposta na afetividade — na memória, no amor, no luto — não cai numa sentimentalidade vazia: ela articula uma crítica social que pede não só empatia individual, mas transformações estruturais — na educação, na memória nacional, na consciência racial.
Desde sua publicação, O Avesso da Pele alcançou destaque: além do Prêmio Jabuti, foi finalista de premiações importantes. Contudo, a obra foi alvo de controvérsias: em 2024, entrou na mira de setores conservadores que alegaram haver “linguagem inadequada” e cenas sexualizadas — o que levou, em alguns estados, à retirada do livro do ambiente escolar. Esse episódio revela que o incômodo provocado não está na suposta “vulgaridade” da linguagem ou da sexualidade, mas no desconforto que a literatura causa ao expor a violência racial, estrutural — aquilo que muitos prefeririam manter invisível. Como observa o autor: “é curioso como palavras de baixo calão e atos sexuais causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras.”
Reconhece-se em O Avesso da Pele um instrumento poderoso de reflexão sobre a negritude, a violência institucional e a memória histórica brasileira. A obra é um apelo humano, um convite à empatia, um alerta. Para o campo jurídico e social, o romance põe em cena a urgência da visibilidade: das vítimas, das suas histórias, dos corpos e das memórias que o Estado — direta ou indireta — tem apagado. No contexto de debates sobre violência policial, racismo estrutural e direitos humanos, o livro funciona como um documento literário e moral. Para a linguagem, a obra demonstra que o português — essa língua nacional marcada por heranças coloniais — pode se tornar veículo de reparação simbólica, de denúncia, de memória. A segunda pessoa do narrador, a fragmentação temporal e o luto expressado em linguagem intensa e poética tornam a leitura um ato de reconstrução identitária. Para a memória social, o romance contribui para desfazer o mito da “democracia racial” e expõe a persistência das feridas abertas no corpo da nação — feridas que muitas vezes se chamam “cor da pele”.
Em um Brasil que constantemente tenta apagar ou minimizar a dor de sua população negra — seja por meio da negação, seja por omissão institucional — O Avesso da Pele surge como um grito literário: dolorido, urgente, necessário. A obra não é mero exercício ficcional ou memorialismo íntimo. Ela é um testemunho, um legado e uma convocação. Para lembrar, para sentir, para resistir. Para fazer com que o “avesso” deixe de ser escondido — e se torne visível, reconhecido, reconhecível. Talvez essa seja a mais profunda função da literatura: dar voz aos silenciados; transformar feridas em memória coletiva; e, sobretudo, nos obrigar a encarar o avesso da pele — e, com ele, o avesso da história.
É fundamental ressaltar que os dados que sustentam a existência da matéria escura e da energia escura têm fontes reais e são baseados em rigorosas observações astronômicas e cosmológicas
O caminho para "adiar o fim do mundo" – tanto o ecológico quanto o psíquico – passa, necessariamente, por restaurar a qualidade de nossos vínculos
Lançamento desta obra será realizado pelo Instituto Altair Sales e pelo Centro Universitário Araguaia (UniAraguaia) no dia 28 de novembro, no IHGG
Protagonista da obra, o "Sonhador", é a perfeita alegoria da alma que prefere a segurança estéril da fantasia à incerteza vital da realidade
"O Cajado Viajante", de Everaldo Jr., acaba de chegar às livrarias como um convite a uma viagem sem fronteiras
Nascido em Correntina (Bahia), em março de 1960, Hélverton Baiano mora em Goiânia desde a adolescência
Lançamento do livro será realizado no dia 26 de novembro, às 19 horas, na sede da União Brasileira de Escritores de Goiás (UBE-GO)
Evento não apenas honra a sua trajetória multifacetada, mas também celebra a rica produção cultural e científica do estado de Goiás
O Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG) e o Instituto Cultural e Educacional Bernardo Élis para os Povos do Cerrado (ICEBE) anuncia uma exposição dedicada à trajetória multifacetada e ao legado da escritora, gestora cultural e ativista Maria Abadia Silva. Intitulada "MARIA ABADIA SILVA: Vida e Obra", a mostra é um reconhecimento à expressiva contribuição da personalidade goiana para a cultura, educação e sociedade do estado e do país. A abertura da exposição está marcada para esta sexta-feira, 14, às 9h, na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), em Goiânia.
O evento é uma oportunidade para o público conhecer de perto os diferentes campos de atuação de Maria Abadia Silva, desde sua influência na formulação de políticas públicas até sua notável carreira literária. Maria Abadia é uma das figuras mais proeminentes de Goiás, com uma atuação que perpassa a literatura, o direito, a gestão pública e o ativismo social. Sua biografia é marcada pela dedicação à cultura e à educação, com passagens por importantes cargos de liderança.
Do seu invejável currículo, destacam-se:
- Formação Acadêmica e Especializações:
- Mestre em Letras, Crítica Literária (PUC-GO, 2018/19).
- Bacharel em Direito (Universidade Federal Fluminense, RJ).
- Especializações em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento Urbano da América Latina (Cátedra Unesco, ITUC, PE), Pintura Espontânea, Psicologia Junguiana (IJEP-DF), Formação Holística e Transdisciplinar (Unipaz/DF), Arteterapia junguiana (IJEP-DF), e Constelações Sistêmicas (IBS, GO).
- Experiência Profissional e Gestão:
- Mais de trinta anos em gestão e organização de projetos educacionais, culturais e sociais.
- Secretária de Estado da Cultura de Goiás (Governo Henrique Santillo) e Secretária da Cultura de Goiânia (Governo Darci Accorsi).
- Superintendente do Patrimônio Histórico e Artístico de Goiás.
- Criação e implantação de políticas públicas, como o Programa Salário Escola (Governo Marconi Perillo) e programas de inclusão social na Secretaria de Educação de Goiás (Programa Bolsa Escola, em 1050 escolas).
- Diretora do Polo de Cinema de Brasília (2001/2002) e Assessora da Presidência do BRB.
- Trabalhou na Câmara dos Deputados de Brasília, em Comissões como Direitos Humanos, Educação e Cultura, entre outras.
- Presidente da Aliança Francesa de Goiás (dois mandatos) e Coordenadora da Unipaz em Goiânia, além de facilitadora do Programa Nacional da Avipaz.
- Atual Presidente da Associação Protetora do Bosque dos Buritis (desde 2016).
- Foi Presidente da Comissão de Cultura da OAB-GO (2016/2017) e membro do Conselho Federal da OAB/DF na Comissão de Direitos Humanos (1996/97).
- Reconhecimento e Publicações:
- Membro da Academia Goiana de Letras (cadeira n.30), do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, da União Brasileira de Escritores (UBE-Go) e da Internacional EcoAcademia de Letras, Ciências e Artes.
- Escritora premiada com diversas obras, destacando-se:
- “Espaços” (Prêmio Bolsa de Publicações Hugo de Carvalho Ramos, 1980).
- “Cabeça Cauda” (Prêmio Bolsa José Décio Filho, 1986, e Prêmio Nacional Fundação Banco do Brasil, 1987).
- “Desamario” (2007, 2ª ed. 2019).
- “Frei Confaloni, o Renascimento em Goiás” (em parceria com Narcisa Cordeiro, 2021).
- “A arte poética de Confaloni” (Ed. Viseu, 2023).
- “Lembranças vivas de Dr Expedito M. Ribeiro” (Ed. Contato, 2024).
Convite à Comunidade
A exposição "MARIA ABADIA SILVA: Vida e Obra" é um tributo merecido a uma das mais ativas e influentes personalidades da cena cultural goiana. É um convite à comunidade para mergulhar em uma vida dedicada à arte, à educação e ao serviço público.
Evento: Exposição "Maria Abadia Silva: Vida e Obra"
Data: sexta-feira, 14
Horário: 9h
Local: Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG) - Rua 82, 455 - Setor Sul
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Eleição é um reconhecimento de sua ampla e premiada trajetória nas letras, no jornalismo e na gestão cultural do estado
Livro, que já vendeu mais de 20 mil exemplares, se consolida como um pilar fundamental para a compreensão da trajetória estadual, oferecendo uma visão abrangente e crítica dos séculos XVIII ao XXI
Evento, que reconhece anualmente personalidades de destaque na cena cultural goiana, acontecerá às 9h no Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG)
Durante séculos, o temor da morte e do castigo sustentou a ideia do inferno como instrumento de controle espiritual e moral
