Resultados do marcador: Área adquirida pela Belcar

Ação popular de 2011 pode levar à condenação de ex-prefeito e mais 17 pessoas, por suposta lesão ao Erário municipal em mais de 1 milhão, em permuta de áreas entre município e associação filantrópica
Frederico Vitor
Ainda continua em fase de instrução o processo iniciado em 11 de maio de 2011 contra o ex-prefeito de Goiânia Iris Rezende (PMDB), candidato ao governo pela coligação Amor por Goiás, e outras 17 pessoas na Terceira Vara da Fazenda Pública Municipal de Goiânia. Todos foram acusados em ação popular de participação em uma operação triangular que permitiu a venda de área pública 90% abaixo do real valor de mercado ao Grupo Belcar, o que teria provocado prejuízo superior a R$ 1 milhão ao Município de Goiânia. O Ministério Público de Goiás (MP-GO) emitiu parecer favorável à condenação de todos os envolvidos na transação.
Na ação popular liderada pelo vereador Elias Vaz (PSB) consta que Iris Rezende autorizou a permuta de uma área pública com a Associação de Apoio aos Doentes Carentes em Tratamento de Saúde (AADCTS) que, em seguida, a revendeu ao Grupo Belcar. O problema, apontado na petição e no parecer do Ministério Público, está na avaliação da área municipal muito abaixo do preço de mercado, artifício empregado para descer ao valor do imóvel da associação e dar aparência legal ao negócio. Também foi questionado o motivo que levou a entidade a vender à Belcar uma propriedade recém-adquirida para usufruto de seus associados.
A operação triangular veio à tona na tribuna da Câmara Municipal por denúncia dos vereadores Elias Vaz (à época PSol, hoje PSB/Rede), Santana Gomes (à época PMDB, hoje PSL) e Geovani Antônio (PSDB) que protocolaram a ação popular no Fórum de Goiânia. A promotora de Justiça Villis Marra, titular da 78ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público do Ministério Público, emitiu parecer pela condenação de Iris Rezende e dos demais acusados. A petição apresentada pelos legisladores municipais indica que a operação de permuta com a entidade filantrópica foi apenas o pano de fundo para a transferência de uma área em frente ao Paço Municipal para o Grupo Belcar por um preço que chega a ser 90% inferior ao praticado pelo mercado imobiliário.
O Ministério Público apurou que, no ano de 2008, a Prefeitura de Goiânia, na gestão de Iris Rezende, procurou a AADCTS para que o município pudesse comprar uma área de 22 mil metros quadrados localizada no Residencial Itamaracá, região Noroeste da capital. O terreno deveria ser utilizado para abrigar 140 famílias que tiveram suas moradias desapropriadas em virtude das obras da Avenida Leste-Oeste. A área em questão era uma doação onerosa do empresário Eurípedes Ferreira dos Santos, criador da AADCTS, ex-presidente e atualmente um dos conselheiros da Câmara de Dirigentes Legistas (CDL). Como condição para ser efetivada a doação, o imóvel deveria ser utilizado, no prazo de oito anos, para construir uma instituição para acolhida de menores carentes e idosos, para amparo material e espiritual.
Para a concretização da permuta, segundo o Ministério Público, os procuradores do município de Goiânia cuidaram dos aspectos jurídicos com interferência e inobservância de regras procedimentais. Após parecer de “legalidade” dada pelos procuradores, o processo foi encaminhado ao procurador-geral do Município, à época Marconi Sérgio de Azevedo Pimenteira que, por sua vez, foi favorável à permuta, encaminhando o processo ao então prefeito Iris Rezende para que, finalmente, autorizasse a permuta, o que foi feito.
Permuta realizada
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Ministério Público apurou série de irregularidades nas avaliações de áreas realizadas pela prefeitura
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Laudos falhos
Em suma, o perito do Ministério Público estabeleceu as seguintes conclusões relativas aos laudos feitos pela comissão técnica da prefeitura: “O avaliador não possui atribuição legal para a realização de laudos de avaliação. Tais laudos apresentados, apesar de pretensamente se apresentarem com nível de rigor, não obedecem aos preceitos mínimos das normas de avaliação de imóvel. Além disso, apresentaram uma série de falhas cabais em seu desenvolvimento, portanto sem condições de serem considerados referência de valor para áreas em questão.” Deste modo, os peritos do Ministério Público avaliaram o imóvel do Jardim Goiás em R$ 2.382.748,36, e o terreno do Residencial Itamaracá em R$ 1.361.236,80. Assim, considerando a depreciação do terreno do Jardim Goiás e o superfaturamento do imóvel do Itamaracá, a promotoria pública endossa a ação popular movida pelo vereador Elias Vaz, de que o município sofreu danos ao Erário com a realização do que o Ministério Público chama de “fraudulenta permuta”, que resultou num prejuízo aos cofres municipais de pelo menos R$ 1.011.527,38. O Jornal Opção procurou o especialista em corretagem de imóveis, Cláudio Mendes, e, segundo ele, nos valores de hoje, um imóvel localizado no Jardim Goiás, próximo à BR-153, não é negociado por menos de R$ 4 mil o metro quadrado. Já no Residencial Itamaracá, na região Noroeste de Goiânia, dado o adensamento populacional e a vinda de empreendimentos como shopping centers, comércios e condomínios, um lote não é comercializado por menos de R$ 1,5 mil o metro quadrado. Sendo assim, a área do Jardim Goiás valeria atualmente cerca de R$ 36 milhões e, do Itamaracá, estaria valendo aproximadamente R$ 33 milhões. Mais: segundo o Ministério Público, a diferença detectada pela perícia do órgão só veio a reforçar o que já era óbvio, isto é, a “permuta entre o município e a AADCTS foi um mero engodo, uma artimanha, um verdadeiro artifício. Desde o início, a intenção dos envolvidos era facilitar a aquisição, com enriquecimento ilícito e prejuízo ao Erário, da área situada no Jardim Goiás.”Acusados se defendem de suspeitas de irregularidades em permuta lesiva ao Erário
O ex-prefeito de Goiânia Iris Rezende (PMDB) foi procurado pelo Jornal Opção, porém sua assessoria de imprensa informou que “ele não tem resposta e não dará nenhuma declaração a respeito”. Contudo, a defesa de Iris Rezende apresentou posição ao Judiciário, elaborado pelos advogados Eduardo Siade, Márcio Roberto Jorge Filho e Leonardo Siade, do escritório Siade & Jorge. No documento, os advogados argumentam que não foi especificada pelos autores da ação popular a atuação de seu cliente na prática do ato supostamente lesivo ao patrimônio. “Ao não descrever a participação de Iris Rezende, a petição inicial é inepta, e cerceadora de sua defesa, por não especificar qual conduta lhe é imputada e, por isso, dificultar o conhecimento sobre qual fato deve se defender”, diz trecho da defesa. “O único pressuposto preenchido pelos peticionantes foram suas condições de eleitores. Falharam em demonstrar a ilegalidade do ato e falharam em demonstrar sua lesividade”, frisa. A reportagem entrou em contato com Eurípedes dos Santos, ex-presidente da AADCTS na época em que a permuta foi realizada. Mesmo em viagem para Salvador (BA) concedeu entrevista por telefone. Santos asssegurou que a venda da área, que hoje pertence ao Grupo Belcar, foi feita dentro da legalidade. Sobre o dinheiro da venda, afirma que uma parte, sem revelar a quantia, foi doada para instituições de caridade religiosas e que o restante estaria guardado em uma conta bancária — sendo que apenas será aplicado com o término do processo judicial. O diretor comercial e sócio proprietário do Grupo Belcar, Claudionor Rodrigues Fernandes, declarou que a negociação foi realizada dentro da lei e que todas as informações em sua defesa estão nos autos do processo. Questionado se sabia que a compra foi realizada de uma entidade filantrópica, Claudionor Fernandes afirma que estava ciente e que o negócio transcorreu na legalidade. “O Grupo Belcar não comprou nenhum imóvel ilegal e muito menos do patrimônio do município. Trata-se de uma área de frente à BR-153 que me interessou, tanto que hoje funciona lá a revenda da Mitsubishi.” A Prefeitura de Goiânia foi procurada, por meio do procurador geral, Carlos de Freitas, que declarou que não poderá falar sobre o caso, já que entrou na Procuradoria em 2013, e o processo foi aberto em 2011 quando outra pessoa exercia a função. Marconi Pimenteira, então procurador geral do Município em 2008, atualmente, advogado de Iris Rezende, foi procurado pela reportagem, porém não foi encontrado.Associação filantrópica não existe mais
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