Marqueteiros políticos explicam porquê estratégias utilizadas em 2018 e 2020 não poderão ser reutilizadas no próximo pleito

Com o fim de 2021 cada vez mais próximo, interessados em disputar as eleições do próximo ano se movimentam e se articulam em preparação constante aos desafios do pleito. Com a intenção de melhorarem sua posição nas pesquisas, pré-candidaturas são anunciadas com cada vez mais antecedência e estratégias já começam a ser colocadas em prática, com a intenção de captar cada vez mais seus respectivos públicos-alvo e melhorar suas posições nas pesquisas.

As preparações antecipadas se justificam, principalmente, devido às novidades a serem presenciadas no próximo pleito – desde as alterações causadas pela reforma eleitoral, promulgada no fim de setembro pelo Congresso Nacional, até a forma de fazer campanha, que não será igual nem à das eleições de 2018, nem de 2020. A manutenção do fim das coligações, para o cientista político Guilherme Carvalho, é um dos pontos cruciais que causam impacto nesse processo.

Isso porque a eleição que passou pela experiência de não contar com as coligações proporcionais foi a de 2020: processo municipal que elegeu prefeitos e vereadores de todo o país e que contou com o atípico contexto da pandemia. Ano passado, grande parte das campanhas precisaram se apoiar na internet e nos recursos que ela proporciona, como uma comunicação quase completamente restrita às redes sociais. 

“Essa vai ser uma eleição que as pessoas vão voltar pra rua e que vai permanecer o fim da coligação proporcional. Só que os candidatos não estão preparados ainda para lidar com a rua e nem com o fim da coligação proporcional”, avalia Guilherme, que também atua com marketing político. Ele explica que, ainda com a mente de um cenário de movimentações políticas regido pelas coligações proporcionais, as estratégias aplicadas estão sendo focadas com a intenção de combater seu adversário local. 

“O adversário dos pré-candidatos agora são os próprios colegas de partido”, pontua Guilherme. Ele explica que essa mudança de quem é ou é ou não o rival na disputa ocorre porque, na época em que as coligações estavam vigentes, o voto do eleitor ia para a coligação e posteriormente o quociente era dividido entre os partidos. A partir daí, o resto eleitoral era distribuído entre todos do partido e os mais votados ganhavam a cadeira. “Antes, não necessariamente você era adversário do seu colega de partido dentro da coligação. Você poderia ser adversário de qualquer outro candidato de outro partido que estivesse na coligação, e ao mesmo tempo você não podia jogar contra, porque o voto da coligação poderia te ajudar”, esclarece Guilherme. 

Antecipação das campanhas

A partir desse cenário, no entanto, as preparações antecipadas ao próximo pleito divide a opinião de especialistas em marketing político. Enquanto para Ademir Lima, que é publicitário, a antecipação é vista como um erro, porque obriga todos os demais candidatos a também se anteciparem se quiserem competir com o adversário, o estrategista eleitoral Maurício Coelho acredita que essa antecipação é natural, devido a grande aposta nas mídias sociais. 

“Nas mídias sociais você tem menos controle, já que ela não liga e desliga na hora que você quer, como a televisão. Isso faz com que a mídia social seja uma construção, uma construção demorada, e de tempo. Principalmente pela experiência do Bolsonaro que se anunciou pré-candidato a presidência quatro anos antes da disputa”, ressaltou. 

Em concordância, Paulo Faria, que é mestre em Comunicação, Mídia e Cultura e atua com marketing político, acrescenta que a naturalidade dessa antecipação se dá pela necessidade prévia de se “pavimentar” o caminho a ser percorrido pelo político. “Quando você pensa em uma estratégia, ela tem que te levar de um ponto para um ponto melhor. Na comunicação, isso se dá agregando valor no sentido de agregar conceito, de qualificar melhor”, explica. 

No entanto, para Paulo, quando essa antecipação ocorre, não é referente apenas ao processo político, mas também ao processo de comunicação. “Mas com o processo da comunicação não se pode pular etapas. Você tem que saber aonde quer chegar, tem que saber quais são os alicerces precisam ser colocados para pavimentar esse caminho”, opina. 

Para ilustrar, o mestre em Comunicação, Mídia e Cultura exemplifica que um gestor, ao estar em um cargo visando reeleição ou eleição a um novo posto, é necessário primeiramente prestar contas da gestão em que esteve. Depois, essa prestação de contas passa a não ser mais suficiente e a necessitar de qualificação. “É preciso olhar para o eleitor e entender suas demandas”, traduz. 

Ao ressaltar a importância de não se pular etapas no processo comunicacional de uma campanha, Paulo Faria fala sobre o caráter permanente que este adquire – ultrapassando a própria ideia de “antecipá-la”. “Do ponto de vista da comunicação o processo agora é permanente. E como ele é permanente, você tem que saber a todo momento aonde você quer chegar. A maioria [dos candidatos] só faz o “arroz com feijão”, e isso não é suficiente”. É preciso ler pesquisas e ter o próprio valor reconhecido”, complementa. 

Esse cenário de antecipação e mudanças se delineia de modo que as estratégias utilizadas nas últimas eleições – tanto 2018, quanto 2020, não poderão ser repetidas em 2022. Ainda que as redes sociais tenham chegado para ficar, cada eleição possui um caráter único – que irá moldar as estratégias aplicadas em cada uma delas. Esse caráter único de cada processo eleitoral é visto de forma consensual entre os especialistas. “Cada eleição é uma pós-graduação particular, não dá pra fazer uma igual”, brinca Paulo. 

Um dos aspectos que diferencia o pleito presidencial de 2018 com o de 2022, é o ressaltado pela pesquisa quantitativa realizada pela Genial Investimentos e pelo instituto Quaest Consultoria, e divulgada em outubro deste ano. No relatório, a corrupção não mais aparece à frente do que é considerado o “principal problema do país”. Dessa vez, quem lidera o ranking é a economia, seguida da saúde. 

“Principalmente com o aumento da fome, do desemprego e questões que batem no dia a dia, como a inflação e o preço de combustível, a pauta da corrupção e dos costumes estão fadadas ao fracasso, já que demandam um eleitorado muito nichado”, diz Guilherme. Isso se explica, para o estrategista eleitoral Maurício Coelho, pelo fato de que, em 2018, a tensão manifestada pelo eleitor foi “gasta naquele momento”. “A tensão que ele [o eleitor] vai para urna hoje é completamente diferente daquele que foi em 2018”, acrescenta Maurício. 

O que esperar de 2022?

A partir do avanço da imunização contra a Covid-19, o que tudo indica é que a campanha do próximo ano não terá as redes sociais como seu principal mote. Irá, na verdade, ser uma mistura do “corpo a corpo”, da televisão e rádio e da internet, com as redes sociais. Ademir, que é publicitário, vê o papel das redes com muita força, concorda com o  cientista político Guilherme Carvalho e o estrategista eleitoral Maurício Coelho quanto a importância da televisão em todo esse processo político. 

“Quando olhamos para uma eleição, é possível perceber que o canhão eleitoral ainda é a televisão. A televisão ainda é a grande mídia de massa e alcança todos os tipos de pessoas, não apenas um nicho, como o Facebook, WhatsApp e Instagram”, justifica Maurício. Com a necessidade de uma comunicação estratégica e didática para a pavimentação da campanha eleitoral, marqueteiros políticos ressaltam a importância de uma interlocução didática com o eleitor. Como exemplo a não ser seguido, Guilherme menciona a postura adotada por Geraldo Alckmin em 2018. 

“Nas eleições de 2018, Geraldo Alckmin tinha o maior palanque do Brasil, maior até que o do Fernando Haddad em termos de recurso e de partido e apoios, mas foi um dos últimos colocados, com 4% dos votos”, diz Guilherme. Apesar de na época Geraldo falar de economia, a pauta que deve dominar o cenário eleitoral de 2022, essa não era a estratégia daquele momento. Além disso, para Guilherme, as informações passadas por Alckmin ao eleitor não eram claras ou didáticas.

“Me lembro claramente que falava: “olha, lá em São Paulo cinco impostos é um IVA (Imposto sobre Valor Agregado)”. Mas o eleitor não sabia o que era isso. Não tinha sentido nenhum. É sem tradução, é sem “tecla SAP”, relembrou o cientista político. Assim, além da necessidade de se identificar claramente o público o qual se quer comunicar e adaptar a informação a ser fornecida, é preciso apostar em outros meios.“Ao que tudo indica, candidatos a nível nacional referentes à terceira via, que tem baixa capacidade de mobilização popular, já entenderam que nas redes sociais você não ganha do presidente Bolsonaro, isso é impossível”, complementa Guilherme.

Desse modo, o tom das próximas eleições, exatamente pela emergência das pautas econômicas, segundo o cientista político, será ditado pela centro-direita. Isso, no entanto, não significa que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tenha chance – na verdade, o petista se encontra na frente em todas as pesquisas mais recentes, inclusive no último levantamento da Genial/Quaest. 

“A principal estratégia a ser utilizada por Lula será exatamente essa: falar sobre retomada econômica e lembrar o eleitor sobre o grande a grande expansão do crescimento econômico do Brasil durante a gestão dele”, pontua Guilherme, que também acredita que essa estratégia será utilizada por Ronaldo Caiado (União Brasil), governador de Goiás que busca reeleição e que também antecipou sua campanha, ao anunciar Daniel Vilela (MDB) como seu futuro vice.