Sobram provas da exploração escravagista: salário confiscado pela ditadura, familiares retidos na ilha, proibições ditatoriais de movimentação e relacionamento estendidas aqui para o Brasil, retenção de passaportes, vigilância pelos policiais cubanos

É importante, é útil, diríamos mesmo imprescindível, para resumir num adjetivo, a atuação do Ministério Público perante a sociedade. Como sempre, a virtude está no meio. O procurador, o promotor, seja em que esfera for, contamina a importância de sua função se se deixa encantar pelos holofotes, pelos elogios fáceis, pelo noticiário de uma imprensa interesseira, e extrapola suas atribuições. É algo incômodo, embora não raro de se ver.

Mas o pior é o inverso: a omissão diante de fatos que exigem, urgentemente, desassombradamente, a atuação dos procuradores. Vai caindo no esquecimento, dos muitos abusos promovidos pela ala mais radical do petismo, um dos mais abjetos: a exploração, em regime de servidão, dos médicos cubanos. Se buscarmos no site do Ministério Público do Trabalho, encontraremos dezenas de páginas referidas ao combate ao trabalho “em regime análogo ao da escravidão”. Existe, no órgão, uma Coordenadoria de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho. Apesar da pompa do nome, não se tem notícia, a não ser uma única — e já falaremos dela — de um movimento, uma ação dessa coordenadoria no sentido de coibir a clara, patente, inegável discriminação no trabalho que esses médicos vêm suportando. Nem falemos da chantagem e opressão que sofrem em Cuba quando enviados, sem direito a discussão, e apartados de suas famílias, para um posto médico brasileiro, a milhares de quilômetros de distância.

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Sebastião Vieira Caixeta: o procurador do Ministério Público do Trabalho teve coragem de investigar a escravidão dos médicos cubanos

Alertemos o Ministério Público do Trabalho apenas para uma questão tão comezinha quanto matemática: senhores procuradores, estes médicos estão percebendo apenas uma fração irrisória do que ganham todos os outros médicos, de todas as nacionalidades, inclusos no programa Mais Médicos. O grosso do que os cubanos suam, dia a dia, em longínquos e desequipados postos de saúde, vai para as mãos dos irmãos Fidel e Raúl Castro. É um dinheiro tomado tão à força, como se o fosse com o uso de uma arma, numa esquina escura de uma cidade qualquer. Se isso não é uma discriminação no trabalho a eliminar urgentemente, nada o será.

Uma covarde omissão está em curso, pois existem espalhadas pelo Brasil 24 Procuradorias Regionais do Trabalho, e como os médicos cubanos estão também escravizados pelo país afora, nas vizinhanças de cada uma dessas Procuradorias Regionais há um ou mais desses tiranizados trabalhando em regime de escravidão.

Nos sites do Ministério Público do Trabalho estão bem claros alguns de seus objetivos: “Mapear os focos onde as desigualdades ocorrem” e “Garantir a verdadeira libertação dos obreiros”. Os procuradores do Trabalho não veem, não mapeiam, não garantem porque temem, e tremem diante de um governo truculento? Mas seria mais digno, nesse caso, procurar outra profissão.

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Raúl e Fidel Castro: a dinastia que ganha com escravidão de médicos cubanos

A Constituição já no seu artigo 1º fala dos Fundamentos da República, e explicita a dignidade da pessoa humana (Item III) e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (Item IV). É inconstitucional, pois vai contra os fundamentos republicanos, aceitar em território nacional o tratamento indigno imposto aos cubanos e a desvaloração social de seu trabalho.

O próprio Código Penal Brasileiro capitula como crime reduzir alguém à condição análoga à de escravo (Art. 149). O que esperam os procuradores para agir? Notícias mil vezes menos retumbantes na imprensa, dizendo respeito a trabalho escravo numa propriedade rural, provocam uma corrida de procuradores, rápida ação sobre os responsáveis e às vezes até sobre pessoas completamente inocentes, apenas suspeitas. Dizem ainda os sites do Ministério Público do Trabalho, referindo-se às denúncias: “O MTP atua, nas relações trabalhistas, na defesa dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, em temas de relevante valor social…”. Foge a questão desse escopo? Claro que não.

Por que então ainda não atua o MPT? Será por que as investidas contra “latifundiários” são simpáticas ao governo, e defender os médicos cubanos desperta a ira dos poderosos? Temos o direito à indagação.

Outra indagação — e essas indagações vão se transformando em outras tantas indignações — é dirigida às oposições: qual a razão do silêncio que caiu sobre a questão? Por que apenas alguns poucos parlamentares do DEM questionam a exploração dos cubanos? É porque todos os partidos querem ser de esquerda ou centro-esquerda e nesse caso é proibido criticar a ditadura dos irmãos Castro? Há que se vê-la com olhos complacentes?

Falando, aliás, desse questionamento do DEM, mais precisamente do líder do partido na Câmara, o goiano Ronaldo Caiado, surgiu daí a única ação do Ministério Público do Trabalho de que se tem notícia. E ela veio após a grave, séria denúncia da médica Ramona Matos Rodriguez, que resolveu correr o risco da represália aos parentes mantidos reféns em Cuba e desnudar a questão, com o apoio de Ronaldo Caiado e alguns poucos deputados de oposição.

Sobram provas da exploração escravagista nas denúncias da médica: salário confiscado pela ditadura, familiares retidos na ilha, proibições ditatoriais de movimentação e relacionamento estendidas aqui para o Brasil (em cumplicidade com o governo petista), retenção de passaportes, vigilância até aqui no país pelos policiais cubanos e muita coisa mais.

Um único procurador do MPT teve a coragem de encampar as denúncias e passar à ação: o procurador brasiliense Sebastião Vieira Caixeta. O futuro dará a ele o merecido reconhecimento, estou certo. Quando muitos se encolhem, ele se agigantou e não teve medo. Cumpriu sua função. Esperemos que ele tenha êxito, por nosso bem e pelo bem dos cubanos.

Os médicos cubanos, afinal, em meio a tantas imposições aqui estão dando algum cuidado — o que a carência de instalações, equipamentos e medicamentos permitem — aos nossos desassistidos nos pontos mais distantes do Brasil ou nas periferias mais desconfortáveis das grandes cidades. Eles merecem nosso respeito, pois não cabe culpá-los se aqui vieram passando por cima de leis e regulamentos, mas à ditadura cubana e ao governo brasileiro.

Não cabe aos médicos cubanos igualmente culpa pela maneira desrespeitosa, grosseira e até mentirosa com que foi imposto à medicina brasileira o programa Mais Mé­dicos. E essa culpa cabe só ao governo petista, que além de tudo escamoteou do Congresso e da sociedade brasileira os detalhes do infame acordo feito com a ditadura ilhoa. Ele nasceu com a dupla finalidade de explorar econômica, política e eleitoralmente a mão de obra desses médicos e enviar nossos recursos para os ditadores cubanos usarem com melhor lhes aprouver.

A história é isenta, na perspectiva maior dos tempos. Aponta justos e injustos, mais dia menos dia. Estará listando os procuradores, se outros houver, além de Sebastião Vieira Caixeta, para lhes render a homenagem que merecem os corajosos e dignos. Homens e mulheres que não trepidam em cortar o caminho das injustiças e em falar pelos que não têm voz. Esses médicos estão hoje trabalhando em condições precárias, expatriados, arrancados (a palavra é essa) do convívio familiar, percebendo uma ninharia.

Comparem, senhores procuradores, seu salário com o desses explorados. Levem tudo isso em conta e talvez consigam afastar os receios que estão lhes tolhendo. Lembrem-se da lista de Schindler.